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Como nas canções que canta, Tony Bennett não quer que a música termine.

É duro ter o status de maior cantor vivo. E quem o carrega hoje é Tony Bennett, com sua voz singular e seu estilo inconfundível, mistura do bardo italiano com o suave jazzista. Essa mistura reaparece em seu álbum mais recente, The Art Of Romance, lançado há pouco aqui no Brasil. Mas Anthony Dominick Bennedetto não aceita apenas ser o retrato do passado cravado nas nossas retinas. Ele se esforça constantemente para mudar (e ampliar) seus horizontes. E quase sempre consegue.

Foi dessa maneira que ele conseguiu transformar-se em artista popular nos Estados Unidos, 35 anos depois de atingir seu ápice com I Left My Heart In San Francisco, que ficou tão caracterizada em sua voz que poucos se atreveram a fazer regravações da canção. Alguns arriscaram em shows, como Dean Martin. Sob a batuta do produtor (e filho) Danny Bennett, Tony partiu para a "criação" de songbooks, unindo canções sob óticas particulares.

O primeiro homenageado foi Fred Astaire, que pode ser considerado um dos "criadores" do canto standard norte-americano (o outro é Louis Armstrong), com o álbum Steppin? Out. Na seqüência, o "estouro" com o convite da MTV gringa para a gravação de um disco acústico. Depois, vieram as homenagens a Frank Sinatra (Perfectly Frank), às cantoras (Here To The Ladies), a Billie Holiday (On Holiday), à música infantil (The Playground), a Duke Ellington (Hot & Cool), ao blues (Playin? With My Friends) e a Louis (A Wonderful World, com K. D. Lang).

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Imaginava-se que, com tantos anos de carreira e com tantos "álbuns-homenagens" gravados, Tony Bennett não teria mais o que fazer da vida, ainda mais com quase oitenta anos (ele tem 78). Não sobrara mais nada para ele cantar, pensávamos. Aí vem ele com este The Art Of Romance, que homenageia a música romântica por essência e com onze faixas inéditas em sua voz. Isso mesmo, o disco traz somente novidades, o que é uma coisa praticamente inexistente na chamada "música adulta" americana. A capa é um primor: mostra o cantor (com um sorriso tímido) em primeiro plano, ao pôr do sol de San Francisco. Com uma fotografia, relembra a carreira, explica o momento e saúda a "boa nova".

É claro que as canções não são novas. Duas delas, pelo menos, são clássicos perenes: I Remember You e Gone With The Wind, o que é surpreendente, em tese. Só não é uma surpresa total quando se vê a carreira de Bennett. Ele iniciou, no final dos anos 50, como uma resposta popular a Frank Sinatra. O mitológico produtor Mitch Miller o envolveu pelos arranjos cheios de fru-frus de Percy Faith e Ray Conniff, palatáveis ao gosto do americano médio. Foi assim que ele estourou, e acabou preso pela receita do sucesso. Mesmo tentando, em meados da década de 60, aproximar-se do jazz e da bossa nova, Tony ficou pelo caminho.

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Ficou pior nos anos 70, quando acabou esquecido pelo público e enjeitado por músicos. A apoiá-lo estavam sempre Duke Ellington e Sinatra, que o considerava o "maior cantor da história". Com a ajuda deles, e o empurrão de Bill Evans (que gravou dois álbuns com o crooner), Bennett transformou-se em cantor "difícil?, mas dentro do mundo do jazz. Somente na década de 90 é que ele retomou a popularidade, mesmo sem ter o nível de outrora, até porque o mundo mudou. E bastante.

Só que a respeitabilidade que adquiriu nessa trajetória faz com que ele possa trabalhar sossegado, fazendo o que quer e ousando na medida. Em The Art Of Romance, Tony Bennett une canções "difíceis", como Being Alive, de Stephen Sondheim, com os famosos e "palatáveis" Johnny Mercer, Jerome Kern e Oscar Hammerstein, e Don?t Like Goodbyes, uma improvável parceria de Harold Arlen com o jornalista e escritor (de A Sangue Frio) Truman Capote. O favorito do álbum é Johnny Mandel, que também é arranjador do disco. Ele foi agraciado com três interpretações, a melhor delas é Where Do You Start, com letra da dupla Alan e Marilyn Bergman, parceiros americanos de Michel Legrand, e colaboradores costumeiros de Bennett.

Mas ele não pára de mudar: agora, ele se arvora a compor. All For You, que escreveu em cima de um tema de Django Reinhardt, é a canção mais singela do álbum e, por isso, a mais tocante. É a prova de que Tony Bennett, mesmo aos 78 anos, não deixa de buscar novos caminhos para a carreira (e para a vida). Um exemplo e tanto para todos nós, às vésperas de um ano novo.

Faixa Bônus

* O produtor de The Art Of Romance é Phil Ramone, que foi o criador dos Duets de Sinatra e, por causa disso, acabou sendo o principal responsável pela onda de duetos que assolou o mundo da música desde 1994. Claro que muitos destes álbuns têm qualidades por sinal, a maioria dos bons discos de duetos têm a assinatura de Phil Ramone.

* Um "Casseta" vai colocar o dedo na ferida. Em junho completam-se cinco anos da morte do cantor Wilson Simonal. Ídolo máximo do show biz brasileiro na década de 60, morreu no ostracismo e carregando o peso da pior fama do mundo: a de delator. Cláudio Manoel vai aproveitar a data para contar essa história. O humorista está há dois anos produzindo um documentário sobre Simonal, um polêmico personagem da MPB. Mais do que imagens clássicas do cantor, o documentário – que tem roteiro assinado por Nelson Motta – reunirá depoimentos de gente famosa que participou da vida de Simonal, e uma parte investigativa que tenta esclarecer pontos nebulosos dessa biografia.

* A soprano italiana Renata Tebaldi, considerada uma das mais importantes vozes do século 20, morreu domingo passado, aos 82 anos. Tebaldi faleceu em sua casa, na República de San Marino (ao norte da Itália), após longo período de doença, afirmou o seu médico particular, Niksa Simetovic. Mesmo se retirando dos palcos em 1976, após 32 de anos de carreira, Tebaldi continuou sendo idolatrada pelos fãs.