Clássico ‘Love Story’ está de volta aos cinemas

Para dimensionar o sucesso de Love Story, o filme – que volta neste sábado, 15 e domingo, 16, nos clássicos restaurados da Cinemark -, talvez seja bom fazermos antes uma viagem no tempo, até à época em que o filme foi concebido como um projeto do executivo da Paramount, Robert Evans, para sua então mulher, a atriz Ali MacGraw. E, para situar a gênese da obra, é bom reportar-se ao roteiro escrito por Erich Segal, e que está na origem do filme e do livro que virou um best seller internacional. Professor de literatura comparada em Oxford, Yale e Princeton, Segal discutia com seus alunos a estrutura clássica do romance. Dissecava com eles o melodrama. De um aluno ouviu a história que virou o plot de Love Story. Sobre como um garoto milionário se apaixonou por uma garota da classe trabalhadora. Seu pai o deserdou, ele seguiu em frente. Enfrentaram todo tipo de dificuldade de gente comum para concluir os estudos, casar-se, montar uma casa.

Boy meets girl, boy gets girl e, finalmente, a perde. Boy loses girl, mas não é para um outro nem para a vida, mas para a morte. Ela fica gravemente enferma – de uma doença incurável. Apaixonado, o jovem marido a vê definhar, e morrer. Seu pai, tendo descoberto a extensão do amor, e do sacrifício do filho, vem lhe pedir perdão. E Ryan O’Neal, que interpreta ‘Oliver’, repete a frase que virou o mote romântico no começo dos anos 1970. Depois de ‘faça amor, não faça guerra’, o refrão virou – ‘Amar é não ter que pedir perdão’.

Entra a trilha de Franmcis Lai, sobem os créditos e o público jovem, universitário, seduzido pelo melodrama que falava de sua geração, transformou Love Story num grande sucesso. Na verdade, no filme que salvou a Paramount.

Em 1970, na ressaca do pós-Maio de 68, Hollywood estava em crise. O sucesso de público e crítica de Sem Destino, de Dennis Hopper, captara o espírito da juventude da época e estabelecera um modelo de produção indie com o qual os grandes estúdios não conseguiam competir. Os jovens identificaram-se com os protagonistas que caíram na estrada, montados em motos, redescobrindo a América – e bebendo, e fumando (unzinho). A produção da Paramount naquele ano enumerava filmes caros como Lili, Minha Adorável Espiã, de Blake Edwartds, com Rock Hudson e Julie Andrews, e Os Aventureiros, de Lewis Gilbert, baseado no best seller de Harold Robbins. O estúdio teria quebrado com o fracasso desses filmes, e de outros, se a ‘operação Love Story’ não tivesse superado a expectativa.

Desde 1939, …E o Vento Levou estabelecera um recorde de público que Hollywood não conseguia superar – nem com o épico Ben-Hur, de William Wyler, 20 anos depois. Mas em 1965 ocorreu o fenômeno A Noviça Rebelde, de Robert Wise, com Julie Andrews, que se tornou o filme mais rentável de todos os tempos. Superar e pulverizar recordes era possível, mas como? Como fazer filmes que não apenas movessem o público, mas despertassem o boca a boca, fazendo o crosssover, isso é, atingindo todas as gerações? Na Paramount, Robert Evans fez Love Story como um balão de ensaio. Com o que aprendeu, produziu na sequência, em 1972, O Poderoso Chefão, de Francis Ford Coppola, baseado em outro livro (de Mario Puzo).

A margem de acerto tinha de ser a mais segura possível. O risco, mínimo. E, mesmo assim, havia o imponderável. O filme tinha de despertar o interesse das massas. O roteiro de Erich Segal pareceu-lhe perfeito. Dava uma nova roupagem ao melodrama e atingia o público jovem que começava a se retrair da liberalidade do ‘paz e amor’. Sem abordar diretamente o assunto, poderia aproveitar o sentimento de luto que a ‘América’ experimentava por seu isolamento no Vietnã. Mas, para convencer o comitê executivo da Paramount, Robert Evans teve de fazer um filme econômico, barato mesmo. Uma operação de guerra – que ele quase perdeu de antemão.

Ali seria sua estrela, mas ele teve a maior dificuldade para achar seu garoto. Michael York, Jon Voight, Beau Bridges, Michael Sarrazin e Michael Douglas recusaram o papel, convencidos de que não tinha nada a ver com o espírito da época. Ryan O’Neal, que tinha a estampa, topou, mas quis porcentagem. Larry Peerce, que já dirigira Ali em Paixão de Primavera, não quis dirigir nem Anthony Harvey. Arthur Hiller, relutantemente, aceitou, mas só porque Evans condicionou a produção de Plaza Suite, que ele queria fazer e fez, no ano seguinte -, com a aceitação de Love Story. Como operação de marketing, o roteiro foi transformado em livro e trabalhado para virar best seller. A partir daí, criou-se a aura do filme que viria, a seguir.

Evans estava certo. Love Story foi um megassucesso planetário e até hoje é possível se perguntar por quê. O filme é todo certo, mas anódino, se comparado aos suntuosos – e barrocos – melodramas de Douglas Sirk, 15 anos antes. Talvez tenha sido o que pegou os jovens, essa discrição, ausência de exagero. A relação pai/filho, o conflito entre a segurança da fortuna e o risco da impetuosidade, levou os velhos para as salas, e eles estavam tentando entender a revolução de seus filhos, dois anos antes, nas maiores universidades dos EUA. Tudo isso é história, e neste final de semana e, depois, na quarta-feira, você poderá (re)ver Love Story nos Clássicos Cinemark. Depois da sexualidade exacerbada de Bonnie & Clyde, de Arethur Penn, na semana passada, o pudor de Love Story.

Na vida real, Robert Evans também perdeu sua garota. Ali MacGraw separou-se dele para ficar com Steve McQueen, e contracenou com o novo marido em Os Implacáveis, um grande Sam Peckinpah. Até onde se sabe nem ela nem Stevie nunca pediram perdão a Evans por seu amor. Estavam seguindo o mandamento que o próprio Evans e Erich Segal estabeleceram em Love Story. E, para não fazer crer que operações de marketing com boa dose de cálculo, como as de Love Story e O Poderoso Chefão, sempre dão certo, a mesma Paramount, em 1974, tentou fazer de O Grande Gatsby, baseado no livro de Scott Fitzgerald, um grandioso retorno aos anos loucos, mas o público rejeitou e o fracasso foi monumental.

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