Hollywood sempre produziu filmes sobre catástrofes, mas o filme-catástrofe, como gênero, surge só nos anos 1970. O destino do Poseidon, de Ronald Neame, foi sua vanguarda, em 1972, bem depois de No velho Chicago, de Henry King, de 1938, sobre o grande incêndio de 1871; e o Titanic de Jean Negulesco, de 1953. Mesmo dentro da tendência, O destino do Poseidon possui características especiais.

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São Paulo (AE) – Nos disaster movies feitos a seguir, os EUA, acuados pela crise moral do atoleiro no Vietnã e no escândalo de Watergate, buscaram metáforas para seus problemas. Em geral, são soluções paramilitares. A sociedade precisa de lei e de ordem e há sempre um policial ou um militar para punir arruaceiros e terroristas.

No Poseidon de Neame, a situação é outra. A grande onda que emborca o transatlântico, forçando um grupo de passageiros sobreviventes a subir pelo seu interior, ganha um significado teológico. Eles são guiados por um padre (Gene Hackman) e a subida pode ser comparada à assunção no cristianismo – o ato pelo qual a divindade encarna, em si, a natureza humana.

Tal é o propósito e todas as etapas que são vencidas pelo grupo cada vez mais reduzido, por força da morte (muitas delas por sacrifício) de seus integrantes, reforça sempre o sentido da discussão teológica. Só que Neame é ateu – quando chegam ao topo, que na verdade é o fundo do transatlântico invertido, o que se encontra é o aço. A solução vem de fora, da mão do homem, mas esse Deus ex-machina não será, ele próprio, uma manifestação do divino?

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Críticos como Jean Tulard, em seu Dicionário de cinema queixam-se da negligência (talvez proposital) do diretor Neame, considerando-a frustrante para o espectador. Mas, do pintor alcoólatra de Maluco Genial à cantora drogada de Na glória a amargura e à professora que flerta com o fascismo em O destino de miss Jean Brodie, o cinema de Neame favorece sempre o personagem e a imperfeição da natureza humana.

Os efeitos de O destino do Poseidon podem ser tecnicamente menos perfeitos do que os de Poseidon, mas impressionam mais pelo simples fato de que o filme antigo toma mais tempo para exibi-los, permitindo uma aproximação muito maior com o sofrimento das pessoas à bordo.

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O DVD duplo traz comentários do diretor e do elenco e compara o storyboard com o que foi filmado e editado. O destino do Poseidon ganhou dois Oscars – melhores efeitos e melhor canção (The morning after). Na nova versão o diretor Wolfgang Petersen não deixa de fazer uma ponte com o filme de Neame – o crucifixo de Elena, usado para mover o parafuso, está ali para nos lembrar a teologia cristã de O destino do Poseidon.