A grade do Festival de Curitiba deste ano não prometia grandes surpresas. E é exatamente assim que termina essa 21ª edição do evento: com um saldo previsível, sem reviravoltas nem descobertas. A mostra oficial fez algumas boas escolhas, mas nada que fosse suficiente para mudar o seu caráter algo engessado e conservador. Por sua vez, o Fringe, espaço paralelo destinado a experimentações, demonstrou-se acanhado, na contramão daquilo que se viu no ano passado.
Incapaz de revelar ou sublinhar algum talento emergente, essa fatia do evento segurou-se nas obras de alguns poucos nomes já consagrados da cena local. É o caso da Cia. Brasileira de Teatro, responsável pela mais bela obra vista na edição: o espetáculo “Isso Te Interessa?”
Neste ano, a seleção oficial encontrou certo alento ao eleger alguns inventivos trabalhos da safra paulistana recente, entre eles “O Jardim”, de Leonardo Moreira, “O Idiota”, de Cibele Forjaz, e “Luis Antônio – Gabriela”, de Nelson Baskerville. Criações já laureadas em sua cidade de origem, mas não por isso menos potentes. Em um cenário que costuma ser tradicionalmente dominado por medalhões, também serviu como contraste interessante a vivacidade e o frescor do grupo Magiluth. Neste coletivo do Recife, merecem relevo as inquietações do ator no teatro contemporâneo, diluem-se os limites entre realidade e ficção dentro da cena.
Há ainda que se fazer justiça a uma montagem absolutamente notável apresentada nos últimos dias na capital paranaense: “Estamira – Beira do Mundo”, espetáculo carioca que ressaltou o talento incomum de Dani Barros. Em um trabalho perfeito de mimese, a atriz reproduz a dicção, o olhar, as palavras da catadora de lixo que serve de tema ao documentário homônimo de Marcos Prado. Seu valor maior, porém, está em não esbarrar no virtuosismo, em abrir fendas ao longo da encenação, para que a intérprete mostre-se para além de sua personagem.
Feitas essas observações, é bom que se ressalve que o evento perpetua-se como aquilo que se propõe ser: uma vitrine do teatro nacional, com especial ênfase em sucessos comerciais e nomes consagrados. Em 2012, ficou evidente a perpetuação de alguns grupos e diretores dentro do festival. Repetições de escolhas de edições anteriores. Uma opção que resulta, não raro, na seleção de obras irrelevantes.
Nesse cenário cristalizado, o Fringe – a mostra paralela do Festival – notabilizou-se nas últimas duas décadas como o lugar de novas experimentações, de transbordamentos para além do programado. Mas também não foi isso que se viu em 2012. Mesmo que a quantidade de espetáculos apresentados tenha se mantido estável, o resultado parece bastante aquém do ano anterior, quando se delineava a emergência de uma safra de novas vozes dentro da cena curitibana.
Entre as exceções, saltam aos olhos a presença de “Para o Vampiro – Variações nº 2”, peça consistente da Marcos Damaceno Cia. de Teatro, que escrutina o lugar do artista e seus dilemas atuais. Também se insere aí a Companhia Brasileira de Teatro, que reafirma seu lugar de destaque no panorama nacional. Pelo terceiro ano consecutivo, coube ao grupo do diretor Marcio Abreu apresentar a mais instigante criação do festival. O encenador voltou a surpreender. Agora, com a versão de “Isso Te Interessa?”, texto da francesa Noëlle Renaude. A exemplo do que alcançou em suas criações anteriores, Abreu conseguiu legar a seus atores um espaço raro e absolutamente essencial dentro daqueles que parecem ser os rumos das artes cênicas na contemporaneidade. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.