Matthew Barney tornou-se uma referência entre os artistas de sua geração com o ciclo de Cremaster, nos anos 1990. Misturou a cultura dos mórmons com ritos celtas e maçônicos. A crítica foi mais respeitosa que entusiástica. Barney seguiu produzindo, mas, depois, durante um certo tempo, não se ouviu mais falar dele. Estaria gestando uma obra extraordinária. No ano passado, estreou River of Fundament, que chega agora ao Centro Cultural Banco do Brasil, de São Paulo, com apresentações no sábado e domingo, das 14h30 às 20 h. Trata-se de um filme, ou será mais certo dizer ‘uma extravagância’?
Não se assemelha a nada que você tenha visto. Barney baseou-se num livro de Norman Mailer, de 1983. Ancient Evenings esteve longe de ser uma unanimidade na obra do escritor já dado a polêmicas. Muita gente se escandalizou pela forma como ele viajou ao Egito Antigo, inspirando-se no Livro dos Mortos para tecer sua metáfora sobre os rumos do mundo moderno. Barney radicalizou a proposta num longa de 311 minutos exibido em duas partes, com intervalo. Como em Cremaster, no qual Mailer foi ator, construiu cenários – esculturas enormes – que viraram parte do projeto. River of Fundament inclui uma Barca de Ra, mas no Brasil veio só o filme.
Mailer sempre foi um autor conhecido por sua abordagem do sexo. Em Ancient Evenings, ele associou a cosmologia do século 13 a.C. ao que muitos críticos consideraram uma excessiva jornada através da escatologia e da violência do submundo. Barney construiu sua obra em torno de apresentações ao vivo filmadas em Los Angeles, Detroit e Nova York. Os mortos em busca de reencarnação atravessam um rio de excrementos e o imaginário do cineasta força o público a encarar cenas de sexo anal, defecação, urina. A questão não é de bom nem de mau gosto. Barney olha a humanidade no que ela tem de mais primitivo e visceral.
E como no livro Mailer aborda o desenvolvimento dos antigos egípcios no domínio dos metais, Barney sentiu que, mais do que em qualquer trabalho prévio, as esculturas poderiam ser integradas à cinedramaturgia. O resultado desconcerta, fascina, pode até provocar repulsa, mas não deixa ninguém indiferente. Barney foi parceiro de Björk, na arte e na vida. O rompimento foi traumático e virou o conceito de um álbum considerado mítico da artista, Vulnicura, de 2015.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.