Para comemorar os 20 anos de carreira em 2011, a cantora Carmen Queiroz lançou o disco “Enquanto eu fizer canção”, com shows no Sesc Pompeia, em São Paulo, entre abril e maio. Como sempre faz uma vez por mês, ela se apresenta hoje no Ó do Borogodó, também em São Paulo, a partir das 22h30, que é uma de suas principais alegrias. Especialmente quando ouve gente nova na plateia pedindo música das antigas. “Não consigo cantar letra vazia, que não diz nada. E como eu me acho muito romântica, o repertório é todo assim. É minha maneira de contribuir para formar a cabeça de meninada”, diz a interprete, em entrevista quarta-feira, por telefone, à Agência Estado. A artista também aproveita o espaço do site (www.carmenqueiroz.com.br) para criar pontes com a juventude.

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“Enquanto eu fizer canção”, que tem distribuição nacional feita pela Tratore (www.tratore.com.br), é o quarto disco de Carmen, que estava sem gravar desde 2004. Viúva há quatro anos, sem filhos, ela já superou a fase mais difícil da ausência do seu marido, com quem viveu 21 anos. “Agora tem a música. E já passei a parte mais difícil. Acho que meu disco veio nessa fase, de retomada”, explica ela, que nasceu em Cornélio Procópio (PR) e transpirava música desde pequena, com a participação da sua família em serestas. Neste disco, a cantora faz uma homenagem às grandes interpretes que influenciaram a sua carreira, de Carmen Miranda, com a música “Alô… Alô…?” (André Filho) a Nana Caymmi, com “Nenhuma Lágrima” (Sueli Costa), que também inspirou o título do disco.

“Nem uma lágrima / Nem uma lástima / Só este chorinho meio antigo / Pra dizer que eu não chorei de amor / Nem uma lágrima / Quem me olha, não me vê / Aprendi amor vou repetir / Enquanto eu fizer canção / E tocar violão / E atravessar a dor / Com os olhos na poesia / E os passos no meu dia / Mas amor não choro não / Nem mais uma lágrima de amor.” Além da sua voz, o lirismo fica completo na companhia de seus músicos: Edmilson Capelupi (arranjos, direção musical, violão e violão sete cordas), Edson Alves (violão), Edson Alves (baixo), Cléber Almeida (bateria), Daniel Ferruge (Cavaquinho), João Poleto (flauta), Mário Marques (clarone), Milton Mori (bandolim), Alexandre Ribeiro e João Francisco (Clarinete), Roberta Valente (pandeiro), Gerson da Banda e Jorge Neguinho (percussão).

Você acredita que a mesma tecnologia que acabou deixando fora do ar muita coisa boa pode hoje fazer o inverso?

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Carmen Queiroz – Eu acredito. É um trabalho de formiguinha. A tecnologia está na mão de qualquer um hoje e, quem acredita na pureza da música popular, sabendo usar a ferramenta, também pode fazer a sua parte nesse resgate. Porque a moçada é plugada e a web pode ser um canal para mostrar essa coisa boa da vivência, do que a gente acha o que é realmente bonito mesmo, para que a gente poder repassar.

Interessante que a música “Alô… Alô…”, que abre seu disco, usa a metáfora dos problemas da telefonia na década de 30 para falar sobre a dificuldade em chegar ao coração do seu amor. Será que muito do que a música retratava não se perdeu hoje? Por exemplo, antes, pegar na mão ou um simples olhar era o máximo de ousadia. De repente, tudo o que se gostaria de se realizar, ou expressar, corria para a melodia e a harmonia. E hoje o mundo anda meio complicado…

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Carmen Queiroz – É verdade que a música retrata o momento presente. Tem muito a ver. Eu falo em termos dos compositores. Os mais jovens retratam a vivência que têm hoje. Antigamente havia muito mais aquele sentimento mais puro, do homem em relação a mulher, do carinho. A música retrata isso…

Mas e a história de só poder pegar na mão, e deixar a imaginação toda ir para a melodia?

Carmen Queiroz – (risos) tinha essa coisa do romantismo, o que falta hoje. Eu vejo na moçada de hoje… estão perdidos, porque não foi passado que isso é possível. A gente vê a meninada começando tão cedo no sexo, falta amor e romantismo. Antes tinha romantismo, amor, sexo. Hoje começa pelo sexo e não encontra o caminho, porque está tudo invertido. Procura-se um romantismo que não se sabe onde está. E veja como estão perdidos. Talvez a música possa ajudar. O amor era descrito assim, a relação homem e mulher era bonita, e, na verdade, eu olho para esse disco, que tem o sexo, tem o sexo do “O Meu Amor” (Chico Buarque), lógico! Mas é música do Chico, que também bebeu na fonte antiga. Mas ele conseguiu passar isso para a época dele.

Você acredita que, assim como fez o Chico, outros estão fazendo hoje? É possível transmitir para outras gerações essas sensações?

Carmen Queiroz – Eu acredito. Se não acreditasse, não cantaria essa poesia. Se você pegar o repertório dos meus outros disco, de alguma forma, quando estou buscando repertório, a música fala de amor, não tem jeito. Porque é assim cara. Porque a gente, como interprete, tem que acreditar no que se canta. Cara! Não consigo cantar letra vazia, que não diz nada. E como eu me acho muito romântica, o repertório é todo assim. É minha maneira de contribuir para formar a cabeça de meninada. Porque eu acredito nisso. Eu já parei de me surpreender quando vejo a meninada pedindo em show meu música do Nelson Cavaquinho, do Cartola. Uma vez por mês canto no Ó do Borogodó, com repertório que venho trazendo, da década de 30 até agora. E tem uma moçada que canta com a gente, que para e escuta. E há muitos cantores que tem feito isso, como a Adriana Godoy, que canta muito, a própria Fabiana Cozza, Ione Papas, Nair Rosa… Tem muita gente boa procurando espaço.