Já faz quase um ano que Eu Sou Carlos Imperial estreou no É Tudo Verdade – Festival Internacional de Documentários de 2015. Passado todo esse tempo, o filme estreou nos cinemas – na quinta, 17. Embora não seja tão bom quanto Uma Noite em 67, mostra que os diretores Ricardo Calil e Renato Terra entendem do riscado. Conseguem transformar um personagem controverso, eventualmente antipático, numa figura fascinante, definidora de uma época. Uma Noite em 67 já tinha esse caráter amplo e, por meio da investigação sobre o Festival de MPB da Record, Calil e Terra conseguiam injetar até suspense num desfecho conhecido – a final do evento que marcou o embate entre música de raiz e guitarra elétrica.

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Ponteio, de Edu Lobo, versus Um Domingo no Parque, de Gilberto Gil.

Eu Sou Carlos Imperial talvez não tenha essa riqueza de investigação da linguagem, com a incorporação de gêneros – o suspense -, mas está longe de ser convencional. O próprio fato de ter impropriedade de 16 anos já o isola na enxurrada de documentários sobre figuras míticas do show biz brasileiro, não apenas da música, embora venham dela alguns dos melhores depoimentos do filme (de Erasmo Carlos e Tony Tornado). Carlos Imperial impulsionou as carreiras de Elis Regina, Roberto Carlos e Tim Maia (entre outros). Foi ator e até diretor de pornochanchadas. Num certo sentido, talvez tenha rivalizado com Jece Valadão pelo título de cafajeste. O imperial Carlos vestiu o modelo porque era pegador e dizia que as mulheres podiam até se casar com sujeitos certinhos, mas adoravam um cafajeste.

Virou modelo de ‘pilantragem’ e só isso já lhe valeria hoje a alcunha de machista, politicamente incorreto etc – que ele era, com orgulho. Por meio de cenas de filmes e entrevistas (a que deu pouco antes de morrer, aos 56 anos), o filme reproduz seu linguajar chulo e o mostra em situações vulgares, para se dizer o mínimo, daí a impropriedade. Tudo isso confere a Eu Sou Carlos Imperial seu valor como documento de época em que o Brasil era outro. A questão é – era mesmo outro? Porque basta ver cinco minutos do BBB para conferir que, mesmo nesse clima de fim de mundo que se vive hoje no Brasil, a cafajestada continua solta, e o ‘e aí, comeu?’ segue sendo o assunto preferido das respeitáveis pessoas da sala de jantar. O próprio Imperial, porém, seria hoje banido da TV, porque, como Chacrinha, embora num outro registro, ele era muito explícito e subvertia, de dentro, uma respeitabilidade que sabia ser falsa.

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Imperial não era cafajeste apenas no trato com as mulheres. Ajudou muita gente, mas também fez não poucas inimizades. Atribui-se a ele o boato, sobre uma certa cenoura, que acabou com a carreira de um galã da época, Mário Gomes. Em compensação, bolava estratégias para ajudar os amigos. O compositor João Roberto Kelly lembra que, antes de virar o estrondoso sucesso em que se transformou, A Praça não pegava de jeito nenhum. Imperial inventou um falso processo de plágio, a música começou a ser falada, ouvida e o resto é história. A outro amigo, o ator e cantor Tony Tornado, definiu assim por que preferia ser pilantra – “Cara, o mocinho é um chato. Tem de estar de barba feita, não pode falar palavrão. O mocinho é, antes de tudo, um babaca!”. São histórias divertidas, mas aí entra o próprio filho, num depoimento contundente, dando conta de seus atritos com o pai. O clima de festa é cortado abruptamente. É uma outra face do personagem. O filme não toma partido e expõe um sujeito com tantas máscaras que talvez nem ele soubesse quem era.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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