O nome artístico de Sára Vondrá?ková, Never Sol, pode suscitar muitos paralelos. Poderia significar uma aproximação fonética com “never saw” (nunca vi), mas seria imodesto e não combinaria com ela. Poderia ser algo como “jamais o sol”, mas sua musica não é tao nebulosa, tão dark, para justificar tal bravata.
“Não tem um significado, para mim é abstrato”, diz a cantora, falando ao jornal O Estado de S.Paulo em um intervalo de diversas palestras com produtores, que assistia no evento Red Bull Music Academy, em Tóquio. “Para mim, esse nome tem mais a ver com a atmosfera da minha música. É por causa da energia. Eu escrevo canções melancólicas, então não é completamente estranho”, explica.
Sara parece reunir na voz uma miríade de vozes anteriores, como as de Ella Fitzgerald ou Sade ou Cat Power, de quem é admiradora. Mas tem um toque de modernidade indelével, um encanto que emoldura suas canções mais conhecidas, como Hands.
“Never Sol”
Uma garota tcheca de 23 anos que parece olhar o mundo de cima, tamanha a autoconfiança. Estuda Antropologia Cultural em Praga, e faz turnês já disputadas pela Europa – ainda este ano, deve percorrer a Alemanha e outros países. Mas não gosta da palavra “profissionalização” – ela é indie na alma, não parece perseguir o estrelato, pelo contrário.
Never Sol sempre compõe e canta ao piano, mas quer mudar essa contingência. Não quer mais apenas os acordes, por isso está tateando pelo mundo da música eletrônica. “Estou ouvindo muitos produtores que estão aqui em Tóquio e estou me sentindo influenciada, inspirada nessas últimas duas semanas. Quero mudar a direção da minha música, talvez começar com algum outro instrumento”.
“Para mim, a coisa mais importante é a canção, a harmonia, o sentimento e então a letra. Por isso, é mais difícil para mim compôr de um outro jeito porque minha mente tem fronteiras, estou tentando rompê-las todo o tempo. Há um longo caminho a percorrer”, afirma.
Never Sol, portanto, integra uma trupe de artistas que não tem necessidade de “lançar discos” (ela tem um único, Under Quiet), mas em perseguir algo mais profundo, como ela diz. “Nunca é bom dizer ‘não vou fazer isso’, mas fazer sempre a mesma coisa limita”, diz.
A anos-luz de distancia de cantoras de apelo cenográfico do R&B, como Rihanna ou Beyonce, ela contudo não rejeita o estilo. “Eu não sou performática, não é o meu tipo de vibe. Mas eu respeito todas as abordagens. Não existe música ruim e música boa, tudo se resume à forma como as pessoas sentem aquilo. Há sempre alguém que gosta de algo. É claro que há música comercial, música que pode ser artificial, mas não me sinto autorizada a julgar. Não preciso ir aos shows deles, mas tem gente que quer ir, isso as faz felizes, ou as faz sentir algo, então tudo bem. E, além do mais, há muitos tipos de cantores performáticos. Freddie Mercury era, e era excelente”, ela diz.
O problema principal do intérprete, segundo Never Sol, é se fazer crível. “Se você acredita em mim, é o que importa”, diz. Ela estudou jazz clássico, e Diana Krall era uma das cantores que mais ouvia. Em termos de harmonia e composição, Avishai Cohen foi uma referência. “Quando eu estudava jazz, eu via que muito poucos artistas faziam uma música para a frente. Era tudo em torno de standards, tocavam e cantavam como se estivessem nos anos 50. Eu penso que devemos trazer algo novo para a música. O jazz tem suas raízes, mas acho que é bacana quando a gente ouve algo que projeta adiante”, ela afirma.
Isso não significa que um artista iniciante deva usar necessariamente a eletrônica para se impor em sua época, explica. Never Sol em geral se apresenta com um grupo pequeno, com duas outras cantoras e um tecladista e guitarrista – ela também toca os teclados. Seu antiglamour e a procura tranquila pelo som de uma vida a torna quase uma balada zen pela tarde de Tóquio, na qual ela foi aluna e performer.