Cantora lírica Joyce Di Donato desembarca no Brasil

Joyce Di Donato não perdeu as contas de quantas vezes ouviu um “não”. Foram 13, vindos de agentes, maestros, diretores artísticos. “Até os 29, 30 anos, fui rejeitada das mais diversas maneiras. E sempre me garantiam que eu não tinha o necessário para ser uma estrela”, ela diz, com um riso que não deixa espaço para nenhum ressentimento. “Então, hoje, tudo aquilo que conquistei me surpreende muito. Mas posso garantir que, em algum lugar, deve haver gente muito mais surpresa do que eu, com certeza.”

Joyce Di Donato é uma das principais cantoras líricas da atualidade, dona de uma carreira que a colocou em todos os grandes palcos do mundo e permitiu que construísse uma extensa e premiada discografia. Desembarca esta semana no Brasil, parte de uma turnê sul-americana que a levou ao Chile, Uruguai e à argentina – nos dias 24 e 25, canta na Sala São Paulo, pela Sociedade de Cultura Artística, e, no dia 28, apresenta-se no Teatro Municipal do Rio, sempre acompanhada do pianista David Zobel. No programa, árias e canções de Haendel, Bellini, Rossini e Santoliquido.

“A ideia foi mostrar uma perspectiva mais profunda do que sou como artista. Esses compositores do barroco e do início do romantismo são muito especiais para mim, a paixão por eles de certa forma me define. Eu me identifico com esses papéis, com esses autores, com o período”, diz Joyce em entrevista ao Estado. Bellini e Donizetti também integram o novo disco da cantora, Stella di Napoli.

A relação com a ópera, porém, aconteceria tarde em sua trajetória. Nascida em fevereiro de 1969 em Prairie Village, cidade de menos de 20 mil habitantes no interior do Kansas, ela conta que se apaixonou pela música por meio do pop, um pouco de jazz, e muita Broadway. Na universidade, pretendia se especializar em pedagogia musical. A insistência de uma professora, no entanto, a fez se dedicar ao canto de modo profissional. E, na mesma época, assistiu, pela televisão, a uma montagem de Don Giovanni, de Mozart.

“Não saberia precisar um acontecimento específico que tenha me feito decidir ser cantora. Acontece que o contato com a ópera foi me revelando um mundo incrível: cantar uma ária exigia esforço intelectual, físico, musicalidade, atenção a aspectos psicológicos, conexão espiritual. Poder fazer algo que unisse tanta coisa me pareceu fascinante.”

Ela então resolveu se mudar para a Filadélfia e, de lá, passou a integrar o programa de formação de cantores da Ópera de Santa Fé, no Texas. Não foi um caminho fácil. “Eu me lembro de uma professora que, a certa altura, me disse: se há alguma outra coisa no mundo que lhe interesse, faça; esta é uma carreira difícil, que exige sacrifícios, então só insista no canto se for a única coisa que você consegue se imaginar fazendo.” A perseverança traria eventualmente recompensa – e a grande chance apareceria em 2000, quando Joyce participou de Così Fan Tutte, de Mozart, no Teatro Alla Scala de Milão.

Joyce, no entanto, mantém um olhar bastante objetivo com relação à sua profissão. No começo do ano, falando a alunos da Juilliard School of Music, de Nova York, pediu a eles que não se colocassem metas. “Vocês precisam decidir, agora, se vão se comprometer com a jornada e não com o resultado final. Pois esse resultado sempre estará aquém das expectativas e se você está buscando essa meta elusiva, a estrada será decepcionante e não valerá a pena.”

O que quis dizer com isso? “Talvez que o risco de se perder de vista o que de fato importa, ou seja, o prazer de fazer música, é muito grande e é preciso estar atento a isso”, ela explica. “O mundo passa por intensas transformações e a arte faz parte desse processo, não há como evitar. Jovens cantores têm uma enorme responsabilidade: encontrar modos de reinventar nossa arte, fazê-la sobreviver. E a primeira coisa a ter em mente é que o mundo precisa de nós, do que fazemos. E seja como for, precisamos acreditar na profundidade do que fazemos. Sim, esse tipo de música exige muito do ouvinte. Mas isso não é um defeito. É algo bom.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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