O jornalista Gerson Camarotti, autor da primeira entrevista exclusiva com o papa Francisco para a TV brasileira, retoma agora um de seus temas preferidos ao escrever Para onde Vai a Igreja?, fruto de cinco entrevistas com cardeais brasileiros. Comentarista político e estudioso dos rumos do catolicismo, ele poderia responder à questão com base na análise de repórter atento, na linha da apresentação do livro. Preferiu, no entanto, ouvir a opinião e registrar as expectativas de amigos próximos de Jorge Mario Bergoglio, o jesuíta argentino, até então arcebispo de Buenos Aires, eleito sucessor de Pedro no conclave de 2013.

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Os entrevistados são os cardeais Cláudio Hummes, Odilo Scherer, Raymundo Damasceno, Orani Tempesta e Sérgio da Rocha. Dois deles, d. Cláudio e d. Damasceno, não são mais eleitores, por terem mais de 80 anos, mas os outros três, d. Odilo, d. Orani e d. Sérgio, votariam num eventual próximo conclave. Todos avaliam com esperança a orientação que Francisco vem dando à Igreja, mas também relembram os passos dos papas que desde o Concílio Vaticano II (1962 – 1965 ) contribuíram para a revitalização de uma instituição de dois mil anos. Aliás, todos mencionam Pio XII, antes de falar dos pontificados de João XXIII, Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI. O papa João Paulo I entra nas páginas de Camarotti como saudosa lembrança, porque morreu 33 dias após sua eleição em 1978 e só teve tempo de deixar a imagem de um inesquecível sorriso.

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D. Cláudio Hummes, prefeito emérito da Congregação do Clero e arcebispo emérito de São Paulo, aquele que, no conclave, pediu a Bergoglio que não se esquecesse dos pobres, está contente com o caminho traçado pelo amigo. “Está sendo muito mais do que eu esperava e, por isso, estou muito feliz com o papa Francisco. Espero que Deus lhe dê um longo pontificado, bem como forças para fazer tudo o que deve fazer”, disse o cardeal, depois de definir Francisco como “homem dos pobres, da paz e de nossa casa comum”.

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Constata-se uma unanimidade na avaliação de Francisco e não era de se esperar que os cardeais brasileiros se manifestassem de outra maneira. O tom varia, de acordo com a personalidade e o estilo de cada um, mas todos se confessam entusiasmados com o jesuíta sul-americano. Francisco “suscita grande simpatia e adesão até mesmo naqueles que não possuem ligação com a Igreja”, afirma d. Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, um dos cardeais apontados como papáveis antes do conclave para a sucessão de Bento XVI. O cardeal disse ter-se surpreendido com o noticiário da imprensa que destacava seu nome durante a reunião, embora as apostas de jornalistas já se focassem nele antes de os eleitores se fecharem na Capela Sistina.

D. Damasceno, que conviveu com Bergoglio em Aparecida (SP) durante a 5ª. Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, em maio de 2007, e depois hospedou o já então papa Francisco, em julho de 2013, em sua visita ao santuário da Padroeira do Brasil, observa que “ele está fazendo mudanças paulatinamente”. Não se fazem, sobretudo no caso de um papa, todas as mudanças desejadas num ano ou dois‘, advertiu o cardeal, mineiro de Capela Nova, na entrevista a Camarotti. No caso dos católicos casados em segunda união, por exemplo, a Igreja mantém firme a doutrina da indissolubilidade do matrimônio, embora já admita em circunstâncias especiais o acesso desses casais ao sacramento da Eucaristia. Francisco aconselha o discernimento na busca de uma solução intermediária, entre a doutrina e a situação concreta dos recasados.

O arcebispo do Rio de Janeiro, d. Orani Tempesta, nomeado cardeal por Francisco em janeiro de 2014, entusiasma-se com a imagem de uma “Igreja em saída”, expressão criada pelo papa para definir a urgência de os padres abandonarem as sacristias num grande esforço de evangelização. “Essa Igreja em saída … consiste em ir atrás daqueles filhos que estão por aí e muitas vezes são esquecidos”, comenta d. Orani, como se estivesse falando da realidade de sua arquidiocese tão marcada pela evasão de fiéis em trânsito para grupos evangélicos.

Para onde vai a Igreja, o papa Francisco fez de fato todas as reformas que pretendia fazer? D. Orani responde com cautela, otimista, sem dar a tarefa por acabada. “Acho que devemos usar o gerúndio: está fazendo. Na verdade, não existe um programa tão bem definido. No seu primeiro discurso, o Santo Padre não fala de um projeto, de fazer isso ou aquilo. Não se trata de seguir um querer avulso seu, mas de se ater ao que foi discutido antes do conclave – a Cúria Romana, a comunicação da Igreja, a questão social, a presença da Igreja junto ao povo…” D. Orani credita a iniciativa ao papa, mas adverte que ele não age sozinho.

Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e arcebispo de Brasília, o cardeal Sérgio da Rocha reflete sobre os efeitos previsíveis para o Brasil da orientação dada à Igreja em seus cinco primeiros anos de pontificado. Não apenas as diretrizes gerais, mas também referências diretas aos problemas do País. “Especialmente sobre a corrupção, o Santo Padre enviou uma mensagem para os jovens que estavam reunidos em Aparecida há pouco tempo, exortando a que não se deixassem levar pela corrupção”, lembra o cardeal. “Sem dúvida, a corrupção no Brasil é conhecida por toda parte, e chego a ficar constrangido: no mundo inteiro, onde quer que eu esteja, a primeira pergunta que me fazem diz respeito à corrupção”. Outros desafios que a Igreja brasileira enfrenta e que preocupam o papa são a violência, a pobreza e as desigualdades sociais.

D. Sérgio afirma que Francisco é um defensor dos mais pobres no Brasil e no mundo, é um dos críticos do mercado neoliberal, ” e de tal modo que alguns o criticam por essa posição”. Para o cardeal, o papel da Igreja no Brasil, unida ao papa, é também denunciar essas situações. “Observe que os grandes grupos que criticam a CNBB são os mesmos que criticam o Santo Padre.” D. Sérgio elogia a coerência de Francisco, ao colocar em prática as reformas que prega. A Igreja tem de seguir seu exemplo, ao ver a casa em que ele mora, os automóveis que usa.

Os passos de Francisco podem ser lentos para um observador distante, “mas, para os padrões da Santa Sé, a velocidade dessas transformações em tão pouco temo é algo sem precedentes”, conforme Camarotti avalia na apresentação do livro. Ele chegou à conclusão de que, cinco anos depois do conclave, já se pode afirmar que Francisco iniciou uma revolução na Igreja.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.