Quando, no início dos anos 90 em Recife, surgiu o mangue bit (movimento que fundia cultura popular e pop, com toques de psicodelia e fome de tecnologia), seus fundadores se auto-intitularam "caranguejos com cérebro". Alguns deles se entocam na lama do Rio neste fim de semana. Comemorando os dez anos de lançamento de seu primeiro disco, o grupo pernambucano Mundo Livre S/A apresenta a caixa Bit (Deck Disc).
Trata-se de um pacote com programação visual caprichadíssima que reúne os quatro primeiros discos do grupo, com capas e encartes originais, além de um DVD com dez clipes. Mais que documentar a trajetória de uma das melhores bandas do Brasil dos últimos anos, a caixa nos permite acompanhar a última década pelo olhar dos mangueboys, que em suas letras montam crônicas sobre o noticiário nacional e internacional – é perfeita a imagem ícone do mangue bit, uma antena cravada na lama do mangue, captando freqüências, oficiais e clandestinas.
E qual é o olhar dos mangueboys? No manifesto de fundação do manguebit, eles dão pistas: "Os mangueboys e manguegirls são indivíduos interessados em hip-hop, colapso da modernidade, Caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência".
Freqüentemente apontado como o movimento mais importante da cultura brasileira desde a Tropicália, o mangue bit teve em Chico Science & Nação Zumbi e mundo livre s/a os maiores representantes na música. Mas gerou reflexos também em outras áreas, como o cinema: Baile perfumado, de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, é fruto direto do movimento que, por tabela, influenciou também Amarelo Manga, de Cláudio Assis.
Com base das canções da caixa Bit, o mangueboy de primeira hora Fred Zero Quatro – voz, cavaquinho e principal compositor do mundo livre s/a – é o guia na retrospectiva política-comportamental da última década. Uma viagem que passa por temas como a revolução zapatista, o crescimento do terrorismo, o escândalo Ricupero e a Guerra da Sérvia.
