A moda brasileira retorna às raízes. Depois de uma cena dominada por tecidos tecnológicos e looks esportivos, os desfiles do segundo dia da São Paulo Fashion Week destacaram tramas naturais e inspirações étnicas vindas de tribos indígenas. O cru e o branco dominaram as passarelas.
A estilista Paula Raia, inclusive, só usou esse tom em seus 22 looks, que surgiram embalados por uma trilha sonora com o barulhinho dos pássaros e uma percussão que remetia aos sons da floresta. Já ponto de partida da Osklen foi o povo Ashaninka, uma tribo do estado do Acre, de origem peruana, enquanto os biquínis da Água de Coco traziam detalhes de rendas feitas por artesãs do Ceará. Além disso, o dia foi marcado pelo lançamento da parceria entre o Museu Afro Brasil e os organizadores da semana.
Nesta quarta-feira, 15, cinco estilistas de diversas regiões africanas apresentarão suas criações. “Em termos de estilo de vida e de estética, a gente tem muito o que aprender com os índios, muito o que aprender com os africanos e pouco o que aprender com o ‘deslumbramento-futebol-clube’ que tomou conta da moda nos últimos anos”, acredita a editora de moda Regina Guerreiro, que já liderou as maiores revistas femininas do país. “Não se esqueça de que as sinhazinhas brasileiras aprenderam a usar bijoux com as escravas africanas.
Faz todo o sentido apostar no algodão, na seda e no linho com o calor cada vez mais fervilhante do verão brasileiro. E isso não é grande novidade. Mas estilistas como Paula Raia foram além. Em um exercício de modelagem respeitável, Paula apresentou variações de longos sobre o mesmo tema: o alto artesanato em tecidos crus e neutros. Franjas, rendas, redes de pesca, telas e corais feltrados foram usados nos modelos que eram apresentados por modelos lânguidas, quase sem maquiagem, em uma espécie de ode à natureza. “O fato de ela usar apenas o tom claro destacou os materiais rústicos. Paula fez algo que não pode ser copiado. É uma coisa única e cada modelo parece ser especial”, diz Adriana Bechara, diretora de moda da revista Glamour.
A vibe boêmia, com saias esvoaçantes, brincões, batas e estampas gráficas, tem tudo a ver com o clima da estação. Quer coisa mais verão que as túnicas em diferentes comprimentos e a alfaiataria leve, com calças amplas de bocas largas, assinadas pelo estilista Oskar Metsavaht para a Osklen?
Ele mixou simbolismos indígenas na estampa gráfica, com penas gigantes estilizadas, à modelagem fluida e relaxada, característica da marca. “Busquei fazer uma síntese. Poucos looks, poucos tecidos e poucas cores”, afirma ele, que montou o desfile em uma galeria de arte na Vila Madalena para poucos convidados. Na coleção, privilegiou apenas três cores (branco, preto e vermelho) e focou em tecidos naturais ou reciclados, além da pele de pirarucu como matéria-prima para bolsas e acessórios.
“A esperança está pequena, a água está pouca, a gente está em busca de algo autenticamente brasileiro, da essência das coisas e de um jeito mais autêntico de ser”, avalia Regina Guerreiro. Foi esse o caminho escolhido por Liana Thomaz, estilista da marca de moda praia Água de Coco, que compôs biquínis e maiôs com detalhes de rendas bilro, rechilieu, labirinto, renascença e filé feitas por artesãs do interior do Ceará, estado natal da grife. “As rendeiras são mulheres velhinhas, de mais de 80 anos, que sentem dores e têm um tempo próprio”, diz Liana. “Levamos oito meses para fazer a coleção, mas é necessário resgatar a tradição regional e evitar que seja extinta.” (Colaboraram Giovana Romani e Jorge Grimberg)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.