Na ilustração de Helder Santos escolhida para ilustrar a capa do sétimo disco de inéditas da banda Eddie, de nome “Mundo Engano”, um barquinho a vela, tripulado por sete pessoas, se vê diante de uma onda gigante, no formato de uma mão enorme. Pode ser um afago, pode ser um estrondo, não se sabe ao certo. O fato é que a maré vai carregá-los até lá. “É algo que, de repente, muda tudo”, explica Fábio Trummer, vocalista do grupo de Olinda.
Talvez o músico falasse sobre o novo álbum, lançado na segunda-feira, 26, mas talvez falasse de Matias, o filho dele que está para chegar “a qualquer instante”. Mais possível que a frase se refira às duas opções. “Você me ligou em um hora muito especial”, explicou o músico, durante o papo na tarde desta terça-feira, 27.
“Estou emocionado. Meu filho pode nascer a qualquer momento. Estou aqui, à espera dele, então, se eu gritar e desligar, é porque vamos correr para a maternidade”, brincou. Trummer está em João Pessoa, na Paraíba, para ficar próximo da família no nascimento do seu primeiro filho.
A gravidez de Natassia Dinis, a companheira dele, foi delicada e com grandes períodos de repouso. Agora, com ela grávida de 40 semanas, o casal está pronto para a chegada do rebento. “Natassia merece os parabéns. É lindo o que acontece em uma gravidez.”
Com isso, é de se esperar que os últimos meses tenham sido um furacão de expectativa inimaginável para Trummer. No fim de 2017, “Mundo Engano” já estava pronto para ganhar o mundo. Para evitar colocá-lo na praça no fim de 2017 e, semanas depois, ver o álbum transformado em um “disco do ano passado”, e a fim de evitar a concorrência do carnaval, o sétimo trabalho da Eddie, essa expoente da nova música brasileira vinda de Pernambuco nos anos 1990, foi deixado em banho-maria até esta semana.
“Quando o disco saiu, foi como se eu tivesse tirado um peso enorme das costas”, conta Trummer. Resta o filho. “Pelas contas do médico, ele poderia nascer a partir da 34.ª semana.”
“Mundo Engano” foi produzido por Pupillo, o baterista da Nação Zumbi, banda contemporânea da Eddie e com a qual compartilhou o mesmo movimento do mangue, ao lado da Mundo Livre S/A, entre outras.
“Há tempos queremos trabalhar com ele”, conta o vocalista. “E ele dizia que gostava da banda, principalmente da nossa cozinha, baixo e bateria, formada por dois irmãos gêmeos”, ele diz, citando Rob (baixo) e Kiko (bateria).
A aproximação final entre Eddie e o produtor se deu quando Trummer e Pupillo se uniram para criar a trilha sonora do filme “A Serpente”, de Jura Capela, uma adaptação do texto de Nelson Rodrigues, lançado em 2016. Em novembro daquele ano, a Eddie já estava em estúdio, no caminho para erguer “Mundo Engano”.
Da Nação Zumbi também vem Jorge Du Peixe, com quem Trummer compôs “Brooklyn” – os músicos também dividem o microfone na canção que reverencia a chegada do hip-hop na vida de moleques como Trummer e Du Peixe, naquela virada das décadas de 1980 para 1990. “Foi importante para a gente perceber que era possível ter uma banda sem cantar certo”, conta Trummer.
O disco nasce a partir do seu antecessor, “Morte e Vida”, de 2015. “O trabalho de composição é contínuo”, explica Trummer, que compara a criação com o ofício de um atleta de alta performance, como um jogador de futebol ou nadador de 50 metros livres. “Quando se aproxima da competição, o esportista precisa estar bem treinado para ser capaz de dar conta da competição”, justifica.
Para ele, a criação é um processo longo, exaustivo, como se a música precisasse ser arrancada de dentro de si. De olho numa gravação futura, Trummer se senta a compor por vezes um ano antes da gravação de um disco.
Trummer e Pupillo descobriram que seriam pais com poucas semanas de distância, no mesmo mês de junho de 2017. Na época, Mundo Engano, que trata tanto dessas marés que levam as certezas embora, estava composto e só faltavam detalhes. O disco pode não ter sido inspirado pela descoberta da paternidade, mas trata justamente sobre as surpresas trazidas pela vida.
“Não adianta planejar a vida toda”, explica. “Às vezes, uma onda pode mudar tudo. Por mais violenta que ela pareça ser, pode trazer uma mudança para o bem.”