A Festa Literária Internacional de Paraty abre nesta quarta, 26, sua 15.ª edição, dessa vez celebrando a vida e a obra de Lima Barreto. A mesa inaugural, Lima Barreto: Triste Visionário, leva o mesmo título da cuidadosa biografia que Lilia Moritz Schwarcz lançou recentemente – a historiadora faz a conferência de abertura acompanhada por Lázaro Ramos, que lerá trechos da obra do homenageado, com direção de cena de Felipe Hirsch. A mesa começa às 19h15, com transmissão ao vivo pelo site oficial da Flip. Em seguida, o pianista e compositor André Mehmari apresenta um trabalho inédito, a Suíte Policarpo, inspirado no mais famoso personagem criado por Barreto.

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Na quinta-feira, às 12h, um painel debate o lugar do escritor no cânone da literatura brasileira. Na sexta, 28, também ao meio-dia, o caráter “moderno antes dos modernistas” de Lima está em debate na programação principal, e, às 15h, será discutida sua relação íntima com os subúrbios – tanto das cidades quanto da Academia e dos espaços oficiais.

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O que se antevê para essa Flip é um homenageado muito mais presente, nos debates e no espírito da Festa, do que em outras edições recentes – isso porque, também, muitos dos temas de Lima Barreto seguem atuais e urgentes para a sociedade. A pedido do Estado, convidados brasileiros da programação oficial da Flip – um misto de especialidades, idades e origens – responderam às seguintes perguntas: “Por que é importante ler Lima Barreto hoje?” e “Quem é Lima Barreto para você?”. Nesta página, estão alguns trechos das respostas.

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“Lima Barreto sempre nos surpreende pelo que parece ser a sua extrema atualidade. Claro que, se tomarmos o termo ‘atual’ literalmente, seria preciso lembrar que esse foi um escritor imerso no contexto em que conviveu: o momento da pós-abolição, que prometia tanta liberdade mas apresentou os mesmos clientelismos e hierarquias já antes conhecidos; o período da Primeira República, que advogou a inclusão, mas entregou a exclusão social.”

Lilia Moritz Schwarcz

HISTORIADORA

“O resgate de um autor hoje desconhecido é fruto desse tempo em que a gente vive. Um tempo de difícil diálogo, mas, ao mesmo tempo, várias vozes apareceram.”

Lázaro Ramos

ATOR

“Lima Barreto é o oposto do ufanismo insultuoso, é hilariante, integralmente vigente, e foi negado por todos em sua vida. Pela Academia de Letras, pelos modernistas, por brancos e pela própria história. Ainda causaria escarcéu com suas crônicas. Na minha opinião, ele sempre foi o maior porque nele não vejo traços de Laurence Sterne, do provincianismo da vanguarda Klaxon, nem de regionalismos novelescos.”

Felipe Hirsch,

DIRETOR E DRAMATURGO

“De compras de voto a partidos políticos de fachada, muito pouco mudou nesse século que nos separa do contexto de Lima Barreto. Seus romances, contos e crônicas nos ajudam a ler, de forma sagaz e crítica, as instituições e os costumes que vêm nos formando como sociedade desde o começo da República.”

Felipe Botelho Corrêa,

PROFESSOR

“Eu me lembro de ter ficado chocada com a ousadia do homem que sabia javanês quando uma professora apresentou o conto na escola. Foi um dos primeiros espantos com a literatura ‘adulta’, e não por acaso uma das primeiras lições de malícia.”

Carol Rodrigues,

ESCRITORA

“É importante ler. E é muito bom ler grandes escritores. Lima Barreto deve ser lido, sempre, por ser um grande escritor. E por ser um dos maiores contistas da tradição ocidental. Essa é, me parece, uma razão bastante. E ele certamente gostaria de saber que é lido ainda hoje por seus méritos de artista e intelectual, sem interferência de nenhuma outra circunstância, como a de ser negro, por exemplo, ou a de escrever sobre o subúrbio. Essas são outras questões. Relevantes, sim, mas não suficientes.”

Alberto Mussa,

ESCRITOR

“Talvez Lima fosse o homem que falava javanês de verdade. Nós é que não compreendíamos. Talvez, enquanto desdenhávamos sua crítica, ele é que ria da nossa cara. Talvez ele tenha esperado esse dia da homenagem chegar. E talvez agora esteja rindo da nossa tentativa. Não podemos mais perder oportunidades de compreender pontos de vistas não valorizados na história oficial do Brasil.”

Natalia Borges Polesso,

ESCRITORA

“É um escritor satírico e irônico, um forte crítico da sociedade e porta-voz da loucura que viveu e que usou como mote literário. A história pessoal do autor, as suas dificuldades, a dura realidade que enfrentou e o seu ímpeto pela escrita são lições importantes.”

Jacques Fux,

ESCRITOR

“Porque a sua obra atravessa as contradições do seu presente (o início do século passado) num enfrentamento constate, que nos dá a chance de ver o nosso presente em ecos que não se alteram: o racismo, a hipocrisia, um certo populismo, etc.”

Guilherme Gontijo Flores,

PROFESSOR E TRADUTOR

“Lima Barreto é, como seu principal personagem, também uma outra espécie de Dom Quixote. E o Brasil de hoje está, mais do que nunca, carente de ousadia e, mais ainda, de memória.”

Noemi Jaffe,

ESCRITORA

“É importante ler Lima Barreto hoje e até quando o Brasil continuar sendo esse país em mãos de uma classe dominante solapadora, voltada contra a maioria da população carente e desinteressada do bem-estar nacional. Lima Barreto é, para mim, um exemplo de intelectual brasileiro que viveu a literatura não como um instrumento de realização artística, mas como arma cotidiana de combate e de solidariedade social e humana.”

Antonio Arnoni Prado,

PESQUISADOR

“Lima Barreto forçou todos os limites do que se podia dizer e escrever no Brasil da sua época. Lima viveu e escreveu de urgência em urgência. Acreditou na literatura como meio de transformação e a usou para desmistificar os modelos sociais, políticos e intelectuais da belle époque. Por isso, tornou-se o antiexemplo, o incômodo. E infelizmente vários de suas denúncias, nossos equívocos como nação, continuam os mesmos.”

Luciana Hidalgo,

ESCRITORA E PESQUISADORA

“Ler Lima Barreto hoje é entender como a grande literatura pode ser, ao mesmo tempo, testemunha de seu tempo e transcendente a este. Lima Barreto é, para mim, a voz mais potente, incômoda e visceral sobre certa cidade do Rio silenciada pelo mito da ‘Cidade Maravilhosa’. Distante dos cartões postais, embalada pelo apito do trem, calejada pela dor de sua gente; silenciosa, generosa, violenta, amarga e acolhedora em igual intensidade.”

Luiz Antonio Simas,

HISTORIADOR

“Lima Barreto amplia o entendimento de questões no Brasil e, na prática, acaba nos levando a uma comparação inevitável com a vida e a obra de Machado de Assis, que será muito bem vinda na medida em que ampliar a complexidade da discussão, sobretudo nestes tempos de pobres polaridades.”

Carlos Nader,

CINEASTA

“Observador, inteligente e crítico social, bastante consciente dos problemas que norteavam a sociedade brasileira e que o afetavam diretamente.”

Ana M. Gonçalves,

ESCRITORA

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.