O território da gravura é intranqüilo e não se ocupa com facilidade; cobra conseqüências. A gravura resiste e exige preparo físico, pois a luta é corporal. A placa de metal difere do papel em branco, a mão que burila tem de ter a precisão de um cirurgião, ao mesmo tempo que exige a delicadeza do traço que permite aflorar a sensibilidade do poeta da mão. Há desafios: da mão que segura o buril e penetra o metal, da luta do ácido no encontro com o metal, dos elementos que resistem ao domínio artesanal, da matéria em sua magnitude impondo resistência, das regiões indomadas oriundas da vontade do artista. O controle da criação é tênue, mas não custa lembrar que a exatidão não é a verdade. Na gravura, o traço é único e não há retorno: as incisões não podem ser apagadas ou refeitas. Lidar com ela é sempre um encontro definitivo porque essencialmente temporal.
Sandrini encontrou na gravura a expressão que precisava em certo momento de sua trajetória (1980 a 92). Acurada e enérgica nas incisões sobre o metal, de forma admirável essa artista faz o rigor da construção conversar com a delicadeza do traço. Enroscando-se nas malhas do cotidiano, na anarquia dos objetos, a artista cruza pedaços de sua vida com pedaços da vida de sua tataravó Emília Erichsen, inovadora da pedagogia ao introduzir, em Castro, no século XIX, o ensino sem castigo e de tantas outras mulheres. São objetos anárquicos – cadeiras, camas, bichos, gravatas, talheres, panelas, gavetas, pequenos segredos guardados do mundo da mulher. A turbulência desses objetos encontra sua expressão nessa linguagem, expondo uma inocente promiscuidade familiar.
Sandrini é uma artista que entende as paixões da alma feminina. Verdadeira narradora, o extraordinário nas suas gravuras é que ela narra com exatidão um cotidiano experimentado, vivido, sem impor estereótipos, generosamente deixando ao espectador a interpretação, o gosto pelo prazer do olhar e da descoberta de seu mundo, compartilhado com o de tantas outras mulheres.
Para o gravador, que se empenha mais do que qualquer outro artista, a matéria existe. E a matéria existe imediatamente sob sua mão obrante. Ela é pedra, ardósia, madeira, cobre, zinco à O próprio papel, com seu grão e sua fibra, provoca a mão sonhadora para uma rivalidade da delicadeza. É isso o que diz do bom artista, na obra Direito de sonhar, o filósofo Gaston Bachelard; é isso o que, em suas obras, a artista sonhadora Estela Sandrini traduz em conseqüências poéticas.
Serviço: Estela Sandrini, Gravuras em Metal – Casa de Cultura Emília Erichsen – Prefeitura Municipal de Castro.
Fera
E nesta segunda-feira, 7, Arapongas recebe a etapa final do Fera. O Quarteto de Violões da Embap foi o escolhido para o show de abertura desta etapa do programa da Secretaria de Educação do Paraná. O virtuosismo do quarteto se junta à cantora Cida Airam num divertido e surpreendente repertório, com arranjos especialmente feitos para a ocasião. Abram suas asas…
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