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As belezas do cancioneiro brasileiro

Aos 23 anos, Ayrton Montarroyos se tornou, em sua geração, um exemplo raro de intérprete. No contrafluxo dos jovens cantores que exageram nos agudos, Ayrton prefere a delicadeza do canto quase falado. Nitidamente, bebe na fonte ‘joão-gilbertiana’ – mesmo que isso não seja intencional. Parece sentir-se confortável em emoldurar cada verso de canções escolhidas a dedo com a devida emoção, mas sem perder a suavidade. É um estilo que o fez se destacar entre tantos concorrentes no The Voice Brasil, da Globo, em 2015, e que se consolidou em seu primeiro disco, lançado em 2017. Em seu novo disco solo, Um Mergulho no Nada, o segundo solo da carreira, ele reforça essas sutilezas no formato voz e violão, numa gravação ao vivo do show que ele apresentou no ano passado, no Teatro Itália, em São Paulo.

Quando a apresentação chegou à cidade – onde o cantor pernambucano mora -, ela já havia percorrido alguns locais no interior paulista. Antes da viagem, o produtor musical Thiago Marques Luiz propôs a ele um show de voz e violão, para colocarem “toda a equipe dentro de um carro e viajar o interior para ficar mais fácil, mais barato”, conta Ayrton, que aceitou a sugestão. O formato acabou o reconectando ao início de tudo, quando começou a cantar no Recife. “Quando a gente vai se profissionalizando, sem querer, fica pensando em coisas cada vez mais monumentais, em orquestras, em banda grande, e acaba se esquecendo um pouco dessas raízes. Montei o repertório e chamei o Edmilson (Capelupi, violão 7 cordas).” Foi a retomada de uma parceria que já havia cativado o público no programa Sr. Brasil, em 2017. “Peguei um fragmento de uma apresentação que fiz com ele no programa e coloquei na internet. Teve uns 30 mil compartilhamentos.

Era uma música de Zeca Pagodinho (Alto Lá), transformei quase num tango brasileiro. Acho que isso deu um impulsionamento natural. Vi que o povo gostou”, lembra. “Aí comecei a ter essa relação mais próxima com o Edmilson nos ensaios para fazer os dez shows no interior, e fui redescobrindo um prazer que tenho de cantar naturalmente.”

Repertório

Em sua participação no The Voice, do qual foi vice-campeão, Ayrton chamava atenção não só como intérprete, mas por ser tão jovem e escolher cantar autores clássicos da música brasileira. Nada novo para quem o conhecia de antes, dos tempos do Recife, quando já admirava cantores como Cauby Peixoto, Ângela Maria, Bethânia e Gal – e levou um disco de Dalva de Oliveira para um trabalho no colégio quando tinha apenas 11 anos.

Em Um Mergulho no Nada, Ayrton reúne canções de Dorival Caymmi, Lupicínio Rodrigues, Gilberto Gil, Chico Buarque, entre outros, e ainda compositores de gerações mais recentes, como Junio Barreto, Lirinha e Ylana Queiroga. O cantor, que costuma dar atenção privilegiada a pérolas menos conhecidas dos grandes autores, neste novo trabalho, abriu espaço aos clássicos, como Açaí, de Djavan, Doce de Coco, de Jacob do Bandolim e Hermínio Bello de Carvalho, Brigas Nunca Mais, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, e Cálice, de Chico Buarque e Gil.

Também de Chico, Mar & Lua foi sugestão de um fã que sempre vai a seus shows. “Eu já conhecia essa música. Quando ouvi de novo, com Maria Bethânia, daquele jeito dramático, que coisa magnífica. Fui ouvir outras interpretações, com Mônica Salmaso, com outros cantores, e fiz do meu jeito, mais introspectivo, num tom mais grave. E o violão de Edmilson até sonolento, um alegre meio triste.” De Caymmi, um de seus compositores favoritos, canta Sodade Matadera.

“Abracei (essa música) de uma forma muito brejeira. Então, tem essa descoberta, essa coisa gostosa. Ao mesmo tempo, sou um cantor que canto para ninguém, que canto para mim, para os meus, e por isso o mergulho no nada”, observa ele, que se apresenta nesta quinta, 25, no Theatro Net Rio, e segue para shows em cidades como Recife e Porto Alegre. “Temos que lembrar que a gente luta pela beleza, pela grandeza de um país de novo, esse país de Dorival Caymmi. Quero cantar esse Brasil.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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