“Sou como soca de cana, me cortem que eu renasço sempre”, bradava o diretor teatral César Vieira na cerimônia do Prêmio Shell, em março, ocasião em que foi homenageado. Vieira, que está à frente do Teatro Popular União e Olho Vivo desde 1970, referia-se à luta pelo teatro e seu espaço.
A frase também serve para o Núcleo Bartolomeu de Depoimentos. Despejado de sua sede na Pompeia, no ano passado, o grupo se tornou um ícone da batalha pela permanência dos espaços de rua em São Paulo. E, no ano em que completa 15 anos, o coletivo ganha o edital de ocupação do Teatro de Arena, importante palco paulistano onde o grupo começou suas atividades em 2000.
A conquista não se deu sem percalços. Inicialmente, o grupo trabalharia no Arena de abril a novembro deste ano, mas a entrada foi adiada. Único a atingir nota máxima, o projeto Arena Urbana Bartolomeu – De Onde Viemos, para Onde Voltamos foi contestado. Segundo a Funarte, a paulista Cia. Bará abriu um recurso – que resultou indeferido – para questionar parte da programação planejada pelo Bartolomeu. A instituição ainda aguarda a liberação de uma verba para publicar o resultado no Diário Oficial da União. O Núcleo Bartolomeu deve entrar no Arena na segunda quinzena de maio, permanecendo até a metade de janeiro de 2016.
“É estratégico voltar”, diz Claudia Schapira, uma das fundadoras do grupo, ao lado de Eugenio Lima, Luaa Gabanini e Roberta Estrela D’Alva. “Por isso, quisemos fazer um projeto que ganhasse o edital por si só, para que ninguém falasse que só ganhamos porque fomos despejados de nossa sede.”
Segundo o projeto, até o fim da ocupação o Bartolomeu deve apresentar quatro montagens adultas e receber outras seis executadas por convidados, como a Cia. São Jorge de Variedades e o ator e diretor Vinícius Piedade. Espetáculos infantis, juvenis e de dança também estão previstos. A programação abre com “Arena Canta Chico de Assis”, em homenagem ao dramaturgo paulistano.
Na última quarta-feira de cada mês, o grupo convida artistas para uma aula pública sobre sua obra e relação com a cena. O evento vai receber nomes como Mia Couto, Paulo Arantes e Alexandre Mate.
Após despejo
Depois de meses travando um imbróglio com a incorporadora Ink – que constrói um empreendimento no local onde ficava a sede do Bartolomeu -, o grupo foi despejado em novembro do ano passado. Desde então, espalharam seus pertences em teatros e sedes de outros grupos.
Agora, o Bartolomeu tenta responder à situação por meio de duas vias principais. Uma delas é um Projeto de Lei que tramita para dar caráter estadual ao registro de patrimônio imaterial cedido pelo município a 22 grupos teatrais de São Paulo. Outro caminho é um possível processo por parte Ministério Público contra a incorporadora, com a alegação de que a cidade foi lesada por perder um patrimônio e não ter ressarcimento.
Outros grupos de teatro têm suas sedes ameaçadas. Com alugueis atrasados, o Club Noir, na Rua Augusta, abriu um projeto na plataforma de Crowdfunding Catarse para conseguir fechar as contas. “Precisamos de R$ 55 mil para sair do vermelho”, diz o diretor Roberto Alvim. O valor pedido na plataforma, no entanto, é de R$ 30 mil, o que facilitaria com que a meta fosse atingida (requisito para a liberação do dinheiro). Até esta terça-feira, 14, o projeto atingiu pouco mais de R$ 29 mil em doações, faltando menos de mil reais para bater a meta.
A sede do Teatro do Incêndio, na Rua da Consolação, está em processo de desapropriação pela linha 6 do metrô e o grupo tenta um acordo para integrar o teatro ao transporte público. O Espaço dos Fofos, na Bela Vista, perdeu o apoio de uma construtora, mas foi salvo pela Lei do Fomento até fevereiro. Depois, a situação do grupo é uma incógnita. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.