Na Sanga dos ?Carnavai$?, lá por onde é tangida a Grande Multidão. Para que se possa ter uma visão mais abrangente do que foi um carnaval que chega ao fim, deve se esperar. Não apenas passar a quarta-feira de cinzas, mas alguns dias mais. Até para dar tempo para que baixem a última serpentina e o último confete.

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Também para que aquelas brigas patriótico-cívicas tele-catch se possam transformar de novo em fraternos abraços e acordos de cavalheiros. Esse espaço de tempo é necessário para separar e distinguir um ?carnaval? que finda do outro que já-já vai começar. E assim que funciona a gangorra nacional, o perpetum mobile do: Caótico? Ótimo!

Não no palco, mas no meio do picadeiro, do picadeiro do imenso circo Terra de Santa Cruz Credo! Lá estava ele, o velho Hamlet. Numa mão, a clássica caveira. Na outra, um revolver. Parado ante uma urna eletrônica. E perguntava e exclamava o velho Hamlet.

?Atirar ou não acertar? Eis a enganação!?

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Desarmamentosamente, veio aí mais uma democrática votação, ou ?referendo?, ou, ainda plebe-scito, nessa nossa Terra de Santa Cruz Credo! Tão democraticamente livre! Sim, vivemos aqui num país obrigatoriamente demo-crático. Por isso votar é obrigatório por lei. Grotesco-direito, grotesca-obrigatoriedade. Da qual você não pode se furtar. Sob pena de ser penalizado. Sem dó nem pena nenhuma.

Ainda dentro desse fe$tival de safadeza$ planaltinas, entrou em cena e no facho dos holofotes circenses a escolha entre arma sim, arma não. Uma, mais uma, fantasia no teatro das camuflagens nacionais.

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Pelo menos desta vez só havia dois candidatos. Ao menos isso! Era para escolher entre a vida ou a morte. Ou era o contrário? Em caso de empate, haveria um segundo tiro? E no pé de quem? Ou então um duelo coletivo? Eu estava curioso para ver se para votar apertava-se teclas ou se puxava um gatilho. Garantias sustentáveis e dignas de fé? Fosse qual fosse o resultado dessa nova e esquisita eleição ou ?referendo?, o número de criminosos ou psicopatas não iria diminuir. Nem o caos armado. Um simples ?sim? digitado não iria garantir que você ficaria livre de levar um tiro. E o ?não? também não. Eram duas opções para você escolher de qual lado você teria a chance de atirar no seu próprio pé.

 Entretanto… discursos, estatísticas, apelos melodramáticos. Era mais uma cortina? Desta vez uma cortina de fumaça de pólvora de festim, que baixou sobre o palco desse inesgotável teatro nacional de inverdades, quero dizer, de variedades. A cada volta e meia está-se, altruística, espalhafatosamente, salvando algo ou alguém, ou até mesmo a Nação inteira. Pilatos, coitado, aqui bem logo ficaria rouco de tanto em vão repetir: ?O que é verdade??.

Cantos de sereias, mas cantados por víboras.

Afinal, tramóias nessa nossa Terra de Santa Cruz Credo!, sempre foram e continuam sendo armadas. Seculum seculorum. Há quinhentos e cinco anos. Tem-se até a impressão que isto já começou antes… E as tramóias se revelam cada vez mais sofisticadas, imensas e sinistras. Pelo menos nisso, um ideal de dedicação aqui existe. Embora ainda hoje camuflado sob aquele notório manto-imagem, de bonachona displicência, que na verdade não existe. É bem outra e apavorante a real realidade.

Safadezas planaltinas.

Fazem meses já. Interminavelmente somos obrigados a assistir e agüentar das arquibancadas o que acontece nos camarotes. Assistir as imagens do imenso e mal cheiroso lodaçal político de egoísta$ intere$$es (há anos passados havia nas escolas o ensino da moral e cívica… ainda existe?).

Expira para todos os lados o esterco que não está onde deveria estar, em fossas sépticas. Mas que está nas catacumbas do poder. Falando em sépticas, atentos, para que não viceje qualquer ceticismo, os mestres do teatro de variedades nathional apontaram os fachos dos seus ho-holofotes à uma nova atração: A escolha entre arma sim, arma não.

Hoje, nestes dias que assustados assustados como nós? ?, correm e fogem, o ?ainda acreditar?, tornou-se aqui, nesta terra de tantas crenças e nenhuma, algo hipotético, uma insustentável utopia. Está bem mais fácil acreditar no Papai Noel, no Coelhinho da Páscoa, na velha Cegonha (que também já há tempos deveria estar na menopausa); figuras apenas lendas. Ou então nas Coelhinhas da Playboy. Mas também estas, quando chegam aqui já são apenas coloridas figurinhas de papel.

Se por durante gerações, por frouxidão, incapacidade ou conveniências, vem aqui se permitindo uma anti-cultura suicida, agora está vindo o resultado. Porque, paralelamente, impinge-se à sociedade, de todas as maneiras e modos, um embrutecimento licencioso. Aos maus, que assim ficam ainda piores, e aos ainda razoavelmente bons, que em grande parte acabarão também ficando maus. Olhe e escute em torno de você. Inúmeros e, muitas vezes imperceptíveis ao menos observador, são os métodos, iscas, chantagens e agrados ao ego, que se usam para se obter uma total derrocada moral da Família, da Nação. Uma sinistra lavagem cerebral. Aliás, nunca entendi porque se diz ?lavagem cerebral? . Uma, porque em alguns-muitos casos nem sequer mais existe cérebro em cima de certos ombros. Outra, que na realidade pretende-se não lavar as mentes. Mas suja-las. Um diabólico sistema rege no mundo. Que aberta ou imperceptivelmente age. Ele vem camuflado das mais variadas maneiras e metido nos mais inimagináveis chamarizes. Dia e noite, incansável, lá avança ele, rumo aos seus objetivos malignos. E é nas sombras do lado obscuro da alma humana que ele age. Trabalhando as fraquezas. Tanto as individuais como as da Grande Multidão generalizada. Cada vez mais pontos vulneráveis tem hoje a desesperada e combalida alma humana… E nos espíritos predispostos, onde já estão presentes, geneticamente, a malícia e a maldade, em suas infindas facetas, é rápido e fácil conseguir-se a débâcle total. A ausência de personalidade-individualidade arrasta outros tantos junto, mas que, sem essa monstruosa pressão premeditada, seguramente nem decairiam tanto e tão baixo. Quanto a acreditar num futuro menos sombrio… Aqueles que têm as suas crenças religiosas, ou que são por natureza um tanto filósofos, fatalistas ou pessimistas, estes todos ainda podem sentir-se pelo menos conformados com o horizonte cruel da realidade que se aproxima… Os demais logo não acreditarão em mais nada. Nem no Bem nem no Mal.

A arma de fogo, que agora se quis vedar ao cidadão é, sem dúvida, sempre algo de assustador e de grande risco. Prelúdios de um caos unilateralmente armado. Era para se esperar desarmado, pacífico e de braços abertos o tiro da mísera-corja? Porém existem muitas outras ameaças mortais. A própria vida já é uma ameaça mortal contra ela própria. É a alma de todas as armas. Além das fatalidades ?naturais?, é vasta a gama das possibilidades criadas pelo próprio ser-humano (?!). Ele próprio é o primeiro e ativo carrasco.

Há muitos anos atrás houve nos jornais e revistas uma propaganda oficial, que alertava contra os perigos representados pelo automóvel na sociedade. ?Não faça de seu automóvel uma arma?, rezava ela. E adiantou alguma coisa essa boa vontade, esse sábio alerta? Anos passados, hoje a resposta você sabe onde encontrá-la: Nas nossas ruas e estradas… Aqui mesmo, em nossa Curitiba, capital-modelo de 1º Mundo! Mas como tem aqui, em multidão, aquele espírito de 1º-i-mundo!…

É proibido, por exemplo, dirigir automóvel e ao mesmo tempo usar aquele famigerado celular. E lá vem um, o clássico mau exemplo: O motorista, celular na mão e grudado à cara (por sinal cara de almofadinha prepotente), em mortal velocidade atravessa a faixa para pedestre, e no sinal vermelho, fechado para ele, motorista… E os pedestres salvam-se mais uma vez, saltando como cavacos. O carro velozmente se vai, levado pelo seu potente motor. Não é nenhum Fiat Uno, que passou a vida toda ao relento e que pelos seus caminhos vai perdendo pedaços de ferrugem… Não! É uma Mercedes, que anteontem ainda estava saindo da linha de montagem.

Isto não foi uma covarde tentativa de assassinato? Pode até ser que aquele detestável almofadinha tivesse um revólver no porta-luvas. Mas preferiu usar o seu reluzente carrão na tentativa de assassinato…

E as tantas outras formas de matar que se usam? Dessas ninguém fala em proibir. Nem tão pouco se arma um referendo a respeito… Excetuando-se o automobilista que atravessa o sinal fechado, os pisoteamentos por pânico nos grandes shows e as brigas de phutebol, as outras modalidades não causam a morte diretamente. Mas vão minando, confundindo e pervertendo os indivíduos. E deste modo solapando a saúde espiritual e por último até a física. As derradeiras resistências acabam sendo derrubadas… E aflora então uma predisposição para a brutalidade. Dali para frente, ferir e matar deve ficar muito mais fácil. Fica apenas a um só golpe. E isto aqui não é nenhum exagero alarmista. Basta olharmos o comportamento das mais novas gerações, crianças ainda. Assusta o seu distanciamento, a sua como que raivosa aversão a tudo que esteja ligado a hábitos e costumes comprovadamente bons e sadios, mas que ?são de ontem?… Heranças normais das gerações passadas. Mas que elas também poderiam herdar e perpetuar. E o que é pior: Assim procura-se solapar, por meio desse modismo estúpido, vazio e barulhento, as derradeiras resistências espirituais e depois até as do próprio corpo, daqueles ainda normais, bons. Porque tudo e todo aquele que é melhor, o é porque possui um espírito sensível que nada tem a ver com fraqueza de quem já vem predestinado a ser mais culto. Aqui uma comparação bem clara: Basta olhar no reino vegetal. As plantas que foram aperfeiçoadas, refinadas, pela capacidade da ciência humana, no correr dos séculos, quando ficam sem cuidados contínuos, facilmente decaem e são asfixiadas pelas ervas-daninhas; essas que, insensíveis, rudes, sempre estão em maciça e crescente maioria…

Sim, não só com arma de fogo que se mata, se aleija. Também pela tortura sutil, que um estado de anarquia generalizada e instalada traz consigo e consente. E aí os que apenas almejam pela bonança da normalidade levam a pior. Sempre e de novo.

?Armas?, verdadeiras bombas, que também podem ferir e matar, são muitas vezes esses eventos, shows pseudo-artísticos culturais para grandes multidões. Basta um estouro na boiada humana (nobre cultura!). Enfrentamentos entre torcidas de futebol também resultam em mortes e feridos. Explosões de ódio. E pensar que já houve até quem chamou o futebol de ?salutar válvula de escape para a agressividade popular reprimida?… (nobre esporte!).

Ainda o celular. Como se permite esse novo modelo que é também ao mesmo tempo um aparelho fotográfico? Imagine-se as baixezas e as chantagens que propicia. E as conseqüentes mortes morais e físicas que ele pode desencadear. Com arma de fogo ou sem ela, mas isto está bem de acordo com essa suína mentalidade ?Pig Brother? atual.

As exceções, os equilibrados corretos, ainda existem. Independentes de escala sociais. Mas a sua permanência neste mundo não interessa. Porque não convém à grande parte das sociedades e dos governos. Minorias condenadas ao desaparecimento em breve. E só bem mais tarde se chorará a sua extinção. Tarde demais, como sempre. Todavia, enquanto aqui ainda estiverem, precisam eles se proteger, resguardar. Resguardar-se lá no alto. A um Himalaia de altura acima da Grande Multidão generalizada. Jamais podem, jamais devem, descer ao pote das maiorias.

E aqueles sinistros videogames e fliperamas? Aqueles jogos artificiais e violentos, onde cabeças explodem e sangue jorra generoso no vídeo. Ruídos anormais, alienantes, fazem o compasso às cenas idem.

Os decidébeis. Quase ainda piores e maléficos são os ?aparelhos de som?, espalhados em toda parte. Oh, trombetas da loucura do Inferno! Despejando ?músicas? que não são músicas. Agredindo com lancinantes golpes sonoros, em decibéis que só débeis mentais, talvez, agüentam. Se você leitora, leitor, conseguiu manter a sua sensibilidade viva até aqui, então já deve ter sentido aquela indizível sensação de mal-estar, de náusea física e de espírito, ao ter que suportar uma dessas seções de tortura acústica. E elas acontecem, são aturadas e permitidas tanto em clubes ?finos? bem como em locais populares. Também em festividades, restaurantes e até mesmo em aniversários de criancinhas ainda de peito quase. O antigo e tradicional costume da conversação à mesa, claro, ali está morto.

Armas e agressões sonoras. Toleradas e permitidas.

Porém é mais um status para essa sociedade que, se não consegue elevar seu espírito à uma estratosfera mental, ao menos se esbalda numa ?statusfera?… Um valor ruidoso e ruinoso que berra ao mesmo tempo na faixa das elite$ bem como na tarja dos mal-afortunado$. Mas, eis aí algo social que não deixa de ser um igualitarismo democrático! Pelo menos nisso e assim, essas duas classes, sempre antagônicas, se igualam fraternalmente na in-cultura…

Decidebéis. Para que esses barulhos doentios e adoecedores alcancem e doam no maior número possível de ouvidos, são eles também embarcados em automóveis e levados pelas ruas da cidade. Sobretudo nas horas tardias das madrugadas, outrora civilizadas e silenciosas. E lá dominam, vaidosa livre e impunemente. Felizes aqueles que ainda tem a capacidade abençoada de ouvir o silencio. Por outro lado, coitados. Porque ninguém sofre mais com esse inferno acústico instalado do que eles. E é também por isso que eles estão em extinção.

E essas pornovelas e outros programas igualmente imundos, trazidos por determinados canais de tv, que a delivery à sua sala são trazidos, noite após noite? Você acredita que não deixam resíduos deletérios em sua família, na sua prole? Se surgisse uma peste suína, versão bípede-pornô, seguramente haveria grandes baixas em certos chiqueiros ?intelectuais?. Para tentar escapar desse risco da peste suína, as pornotvnovelas começam a se desenrolar também fora das camas. Foram para os rodeios bovinos. Nos nativos, ou até no far-west norte- americano. Claro, continua a mesma prostituta porcaria. Apenas camuflada sob uma pele de vaca. Todavia trocaram um risco por outro. Agora terão que se haver com a febre aftosa. Chegando à agenda também uma peste de galinhas. Na descida da rampa do chiqueiro todo santo ajuda.

Pornopublicidade cocomercial. Algumas empresas de publicidade comercial, traindo a sua verdadeira missão, prostituídas, se esmeram em pornôpropagandas. E assim se juntam elas àqueles que tudo estão fazendo para a total derrocada do que ainda resiste e resta dos valores morais da família e, por conseguinte da nação.

Também há os noticiários, espalhafatosos, que, a pretexto de contar e mostrar dos últimos atentados terroristas e outras desgraças da misera realidade humana, tornam-se eles próprios terroristas; rebentando nossas breves tréguas de descanso e sossego que a duras penas conseguimos no front dessa nossa confortável e segura vida moderna atual.

No circulo vicioso da guerrilha de nervos.

Terroristas podem também ser os próprios governos. Os do vasto mundo ou mesmo os pequenos provincianos locais. Terroristas psicológicos, quando armam suas patifarias e traem a confiança, o sincero acreditar daqueles que neles votaram. Terroristas também quando saqueiam nossos bolsos. Com suas infindáveis e sempre ?novas? medidas, ?novos? impostos, taxas e cortes jugulares. Interminavelmente nos ameaçando. Condenando-nos como se todos nós já viéssemos ao mundo como contraventores natos. Na verdade, já nascemos mesmo multados e multados morremos. Enquanto que muitos daqueles pais e tios da pátria, que com seus impostos nos penalizam e aplastam…$$$!

Votação, plebiscito, referendo. Tudo a mesma coisa. E também para que tudo continue igual. Semper idem. Uma fortuna foi gasta para se saber se gatilho sim ou gatilho não. Mais uma fortuna. Porém talvez eu esteja sendo apenas mesquinho. Talvez nem seja muito. Afinal aqui dinheiro não é problema. Ele se reproduz até nas roupas de baixo.

Não teria sido mais lógico se esta quantia tivesse sido destinada para o exército, a polícia, os responsáveis legais pela nossa segurança?

Se foi ou não mais uma cortina de fumaça, desta vez de fumaça de pólvora, não mais interessa. Vocês notaram que, poucos dias passados, e tudo isso também já é coisa passada? Ninguém mais fala do referido referendo… E o lugar já está livre para o próximo ilusionista.

Mas fomos votar assim mesmo. Além do mais já e fim de ano. E logo será o Carnaval.

Provavelmente até muitos adultos, maduros, hoje ainda na trincheira daqueles corretos, idealistas que crêem, ainda, num futuro mundo menos mau, também eles deixarão se arrastar para outro lado da paliçada, antes de cair o pano final sobre esse drama da auto-destrutiva maldade humana.

E nesse tropeçar, o derradeiro depositário do ideal de vida num mundo melhor e sadio, também estará destruído, morto e extinto. E provavelmente sem que contra ele fosse preciso disparar um tiro sequer.

E dali para baixo, todos os demônios ajudarão.

Ivahy Detlev Will é da Academia de Letras do Vale do Iguaçu, de União da Vitória PR