Foi há dois anos que, interessada em fazer um filme sobre a potência das imagens – sobre o significado e o significante, sobre o que as imagens mostram mas não revelam – que a cineasta mineira Ana Moravi teve a ideia de fazer um filme sobre… o vento. Nada mais invisível que o vento, e ao mesmo tempo percebemos seus efeitos. Ana começou a pesquisar e imediatamente descobriu História do Vento, último filme de Joris Ivens, que o grande documentarista holandês fez em 1988. Filme ensaístico, Histoire Du Vent parece esgotar o assunto. É intimidador para um principiante – uma. Mas Ana não desanimou. Pegando carona em Lev Kulechov, a teoria de que duas imagens justapostas criam uma terceira no inconsciente do público, ela começou a construir a sua história do vento. E fez A Mulher que Amou o Vento.
Embora possua um pensamento sofisticado, fruto de racionalização (e experimentação), Ana apostou no básico. O abecê – do cinema, da arte e da vida – comporta muitas conexões e possibilidades. É só não se prender ao óbvio. Ousar. E surgiu essa joia do experimentalismo mineiro, que bebe na fonte da videoarte e da mitologia, mas busca uma via original. No palco do Cine-Tenda, Ana agradeceu ao pai, que a introduziu no universo de Aníbal Machado. O escritor, hoje um tanto esquecido, é autor de O Iniciado do Vento, que deu origem ao filme O Menino e o Vento, de Carlos Hugo Christensen. Há uma história em A Mulher que Amou o Vento. É a de Flora, de como ela invoca e se relaciona com o vento.
Muito antes de Jorins Ivens – 60 anos -, o sueco Victor Sjostrom, rebatizado como Victor Seastrom, em sua passagem por Hollywood, fez com Lilian Gish um filme chamado O Vento. Grande diretor, Sjostrom talvez seja mais lembrado hoje pelo papel do professor Isak Borg em Morangos Silvestres, mas o próprio Ingmar Bergman lhe rendeu homenagem, incorporando cenas de A Carroça Fantasma à sua obra-prima.
Em O Vento, Sjostrom conta a história de uma mulher, uma estrangeira no Velho Oeste. Ela se envolve com o homem errado, vive experiências fortes – brutais. Sjostrom filma o concreto – a paisagem, o sofrimento da protagonista -, mas o vento está ali presente e é o seu tema. Sjostrom usa o concreto para revelar o indizível, o invisível.
Ana Moravi, pegando carona no mito, dá uma forma humana ao vento. Transformado numa figura exótica – um albino -, ele é interpretado por seu marido, o ator e também diretor Dellani Lima, que esteve aqui, no ano passado, frente às câmera de Linz, de Alexandre Veras, que ganhou um prêmio do júri. O vento, Zéphyro, sopra no cangote de Flora, a protagonista. Numa cena, ela dança, e a dança adquire uma dimensão sensual. Nós a vemos sozinha em cena, mas também no dueto com o vento. Thais Dahas, que faz Flora, falou sobre a forma como construiu a personagem – femininas, delicada, mas obstinada, e forte. Uma fala de Flora – “Eu me jogo no perigo só para poder soprar minhas feridas”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.