O jagunço usa o photoshop para se encaixar ao lado da mocinha na foto. O coronel planta uvas irrigadas e exporta vinho. A mocinha sertaneja pratica bungee jump e estudou na Itália. O herói é sommelier. Os cavalos agora são mototáxis. A quenga fuma e cospe como um Josey Wales da Boca do Lixo.
O sertão mudou. Em vez do engenho de cana de açúcar, os novos empreendedores e seus negócios científicos tomaram conta. Mas a moral arcaica e o apego das elites ao poder permanecem os mesmos – o novo empreendedor continua decidindo a sorte do “súditos” como um Rei Salomão de iPad. Marido bateu na mulher? “Descubra qual dos dois está mentindo e demita”, diz Jaime (Murilo Benício) ao capanga.
Talvez a minissérie Amores Roubados (que estreou na segunda-feira, 6, na TV Globo) seja a primeira a atualizar o cenário das antigas tragédias coronelistas da literatura regional brasileira. O novo coronel conhece normas administrativas da FGV, mas continua cuidando para que nunca haja igualdade social, racial ou de gênero no seu terreiro. O arcaico transcende o moderno.
Parece um western caboclo, mas, se o espectador já viajou entre Jacobina e Juazeiro (BA), região das filmagens, reconhecerá aqueles cânions fabulosos, as cachoeiras, a terra desértica, os lagos, a poeira e o verde. Tudo existe e coexiste magnificamente, extremos geminados.
No ritmo, em vez de embarcar no já clichê do vácuo tarantiniano, de ação vertiginosa, o diretor José Luiz Villamarin opta por um olhar mais retrô, mais cinemanovista.
Vindo logo após a capenguíssima novela de Walcyr Carrasco, Amores Roubados, aparece na tela como um bálsamo. Cauã Reymond faz Leandro, um Don Juan com noção zero de autopreservação. Transa com Celeste (Dira Paes), casada com Deodoro (Osmar Prado), seja na vastidão de um certo Posto Divisa ou na adega do marido. Envolve-se ainda com mãe, Isabel (Patricia Pillar), e filha, Antonia (Isis Valverde). Como mãe de Leandro e cafetina, Cássia Kis dá um banho de secura e constrição. Os sotaques fingidos não fingem demais, não chegam ao grau Viúva Porcina de dicção. Não ofendem nem maltratam os ouvidos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.