Ela não pára quieta. Saltita quando anda, ajeita os belos cachos enquanto fala. E ri. Como ela ri. Aos 23 anos, Lucy Ramos ganhou o papel da escrava Adelaide na novela Sinhá-moça, de Benedito Ruy Barbosa. Vítima do "surto de gratidão" que contagia nove entre dez atores novatos na televisão, a ex-modelo agradece a todo o momento por estar fazendo este papel. "Foi um presente que Deus me deu, de verdade", repete para, em seguida, sorrir novamente.
A pernambucana Lucy foi para São Paulo aos cinco anos de idade, levada pela mãe. Sempre alta e magra, iniciou cedo a carreira de modelo. "Era o sonho da minha mãe, mas eu não queria e acabei indo jogar futebol", conta. E foi para uma escolinha na capital paulista. Muito moleca, jogava na posição de zagueira central e acabava se machucando com certa freqüência. Mas, como afirma aquele velho ditado, há males que vêm para bem. E foi o técnico do time que deu o pontapé inicial em sua carreira de modelo. "Ele falava que eu era muito bonita e alta, que eu tinha que ser modelo. Não que eu não jogasse bem futebol, pelo contrário!", brinca a ex-zagueira.
O treinador a levou em uma agência pequena para algumas promoções e ela não parou mais. Acabou numa agência maior – onde está até hoje – e fez campanhas importantes. "E foi aí que as coisas começaram a acontecer na minha vida. Trabalho, dinheiro, fama, glamour…", ironiza. Aos 18 anos, depois que terminou o Ensino Médio, Lucy começou a estudar teatro no Senac, a fazer cursos livres e os testes foram surgindo. Em um deles, foi convidada a fazer elenco de apoio na novela Começar de novo, de 2004. "E aí eu finalmente cheguei ao Rio de Janeiro", conta.
Depois da "ponta" na novela, a atriz foi convidada a fazer um filme americano, ainda não lançado, chamado Turistas, do diretor John Stockwell, o mesmo do filme "teen" Mergulho radical. Dos sets, foi direto para a Oficina de Atores da Globo e de lá para o teste em que foi aprovada para a trama de Benedito Ruy Barbosa.
Jogada às feras
Cercada de feras da dramaturgia, como Osmar Prado, Reginaldo Faria, Patrícia Pillar e Zezé Motta, Lucy tenta aproveitar a convivência com tanta "gente boa". "Eles me dão dicas o tempo todo. Adoro quando me dizem o que fazer, quando me indicam o melhor caminho, quando falam que alguma coisa não está boa", derrama-se. Na trama, Adelaide é uma escrava que vive na senzala e é muito cobiçada não só pelos escravos, como também pelos capatazes e aristocratas. Para fugir das garras de um dos capangas do feitor, Adelaide é levada para a casa grande por Sinhá-moça, vivida por Débora Falabella. "Está sendo uma delícia fazer. É um sonho poder construir um personagem desses", deslumbra-se, sem temer cair no lugar-comum e sem interromper o sorriso.
Lucy só fica séria por alguns segundos quando se refere à época da escravidão e as dificuldades que os negros viveram – e ainda vivem – no País. Sua personagem, apesar de apaixonada pelo escravo Justino, interpretado por Alexandre Morenno, não se entrega a ele com medo de gerar um filho que também seja escravo. Ainda que saiba sobre a Lei do Ventre Livre, Adelaide não entende como ela liberta os filhos e mantém as mães cativas. "É um personagem importante, com carga dramática pesada, mas, ao mesmo tempo, ela tem uma ingenuidade muito grande", explica. Segundo ela, especialmente quando ela se torna dama de companhia de Sinhá- moça, fica parecendo uma criança deslumbrada. "Já soltou uma criança em um lugar que ela não conhece? Nossa, tudo pra ela é mágico", ressalta, com um riso maroto que deixa claro que ela e Adelaide têm muito em comum.
E são exatamente as crianças que a Adelaide mais tem agradado. Prova disso foi o assédio durante a entrevista, na piscina de seu prédio na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Um grupo de meninas cercou a atriz, que parou para dar autógrafos. "Ah, não sei o nome, mas você fica junto com a Sinhá-moça, tomando conta dela o tempo todo", dizia a mais agitada das meninas. E cada autógrafo saiu acompanhado de um indefectível sorrisão.
