Profeta pernambucano de São Bento do Una, o “bicho maluco beleza” Alceu Valença está de volta, com um CD fresquinho na manga e um DVD prestes a sair do forno, ambos pela Indie Records: Alceu Valença – Ao Vivo em Todos os Sentidos, seu 27.º disco, é o registro de um show do cantor e compositor na Fundição Progresso, Rio de Janeiro, em setembro do ano passado.
De fácil digestão, com vinte faixas pinçadas do show – incluindo os clássicos Tropicana, Como Dois Animais, Pelas Ruas Que Andei, Solidão, Anunciação e Tomara – o disco num primeiro momento pode passar a impressão de uma aposta segura e oportunista da nova gravadora, capitaneada pelo ex-músico Liber Gadelha, que se ofereceu para gravar o espetáculo do artista depois de vê-lo em um programa de TV. O dono da Indie deu carta branca ao músico, assumindo todo o ônus caso o projeto não vingasse.
Já Alceu afirma que foi uma oportunidade de montar uma coletânea cuidadosa, sob sua batuta e fiel à sua obra, ao contrário das que de tempos em tempos costumam pipocar no mercado. “Como passei por muitas gravadoras, cada uma tem um pouco do repertório. E, como pagam metade dos royalties, lançam muitas coletâneas sem sentido e sem critério, horrorosas, com músicas que não se relacionam e não refletem a diversidade da minha carreira. Misturam alhos com bugalhos”, avalia. “Sou um artista múltiplo, há tempos promovo a fusão da música nordestina com o rock, o blues, faço música folclórica, urbana, carnavalesca, além dos ritmos tradicionais, forró, frevo, coco, maracatu.”
Aprovado
Ao Vivo em Todos os Sentidos parece ter agradado ao músico. “Tem músicas que não tocam no rádio, tem frevo, que eu nunca cantei na TV, e também tem os maiores sucessos. Os mais batidos, como Tropicana e Como Dois Animais, nem iam entrar, porque o CD tinha sido planejado para ter só doze músicas. Mas eu pedi para completar o espaço, e acabaram entrando 20 – quase o show inteiro. Só faltou Vai Chover, do último disco [De Janeiro a Janeiro, lançado em bancas de jornais no ano passado].”
De fato, o disco traça um perfil uniforme dos 30 anos de carreira do pernambucano. Tem frevo rasgado – Bicho Maluco Beleza, Diabo Louro e De Janeiro a Janeiro -, baladas – Amor Covarde, Cavalo de Pau – maracatu, xote – Tropicana, Dolly, Dolly, Pelas Ruas Que Andei, Anunciação e incursões por praias exóticas, como o rock oitentista Perdeu o Cio, o híbrido de samba com baião e ornamentos mouriscos FM Rebeldia e os blues Andar Andar e a nova Júlia, Julho -com direito a slide guitar e solo de harmônica.
Ouvir o CD é como presenciar um show inteiro de Alceu Valença confortavelmente instalado no sofá de casa. A única ressalva, em se tratando de uma coletânea, vai para os arranjos. Em vários momentos, o uso excessivo de teclados e metais lembra a performance de uma banda de baile. Mas Alceu – que afirma não ouvir música nenhuma, “para não ser influenciado por ninguém” – continua na ponta dos cascos.