Airto Moreira começou a rir e desligou. Não havia a mínima possibilidade de Miles Davis no início de sua fase conhecida como “período elétrico” mandar ligarem para “the brazilian guy” a fim de convidá-lo para uma gravação. “Mr Moreira, sou o empresário e Miles Davis. Ele pede que o senhor venha ao estúdio na próxima segunda-feira para gravarem juntos.”A resposta de Airto foi curta: “Quem está falando? Ok, passe bem.”

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Mas o telefone tocou de novo e a história do menino nascido em Santa Catarina, crescido em Curitiba e descoberto no começo dos anos 1960 ao lado de César Camargo Mariano e Humberto Cláiber quebrando tudo no Sambalanço Trio ganhou seu Novo Testamento. Quem atendeu desta vez foi Lee Morgan, o trompetista que caminhava por sua residência. “Não precisa atender, deve ser brincadeira”, avisou Airto. Morgan trocou algumas palavras em inglês e retornou. “Eles querem você em Bitches Brew.” Uma das obras legendárias de Miles teria Airto na percussão.

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Foi uma trajetória que se impôs às próprias decisões do brasileiro. De gig em gig, ele passou Herbie Hancock, Wayne Shorter, Jaco Pastorius, Dizzy Gillespie, Cannonball Adderley, Lee Morgan, Dave Holland, Keith Jarrett, Jack DeJohnette, Ron Carter, John McLaughlin, Quincy Jones, George Duke, Mickey Hart, Paul Simon, Carlos Santana, Michael Brecker, Zakir Hussain, Stanley Clarke, Chick Corea e Joe Zawinul. A revista Down Beat o elegeu o melhor percussionista do mundo por oito anos seguidos e o Brasil ficou pequeno. Não havia convite que o estimulasse mais do que o que o mundo lhe oferecia.

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Cinquenta anos depois de sua partida para o exterior, em 1967, Airto Moreira vai lançar seu primeiro álbum brasileiro com shows de 7 a 9 de dezembro, no Sesc 24 de Maio. O Blue Note do Rio o recebe em 15 de dezembro. É seu primeiro trabalho tocando só com músicos de seu país e gravado no Brasil. Aluê, com algumas revisões de discos importantes e as inéditas Rosa Negra, Não Sei Pra Onde, Mas Vai e Guarany, tem os músicos José Neto (guitarra), a filha Diana Purim (voz), Sizão Machado (contrabaixo), Fabio Leandro (piano), Vitor Alcântara (saxofones) e Carlos Ezequiel (bateria e produção).

O álbum traz temas de discos espalhados por vários períodos de sua carreira. Do álbum The Sun Is Out, de 1989, ressurgem I’m Fine, How Are You e Lua Flora. A faixa Aluê foi extraída de Natural Feelings, de 1970. Alguns anos à frente e Misturada lembra a fase do álbum Three-Way Mirror, de 1987.

“Esse disco é algo que eu queria fazer havia anos”, diz Airto Moreira, por telefone, dos Estados Unidos, onde vive. “Os convites sempre vieram, mas não havíamos virado ainda.” Os arranjos do baterista Carlos Ezequiel e José Neto de certa forma atualizam os temas com uma mão de obra de outra carga cultural. Há calor em Aluê, com um intenso solo de sax de Vitor Alcântara e o belo piano de Fábio Leandro. Misturada tem mais suingue de jazz brasileiro saindo das mãos de Carlos Ezequiel e do próprio Moreira.

Quarteto Novo

Airto conta que recebeu algumas ligações de produtores querendo a volta de um dos maiores grupos instrumentais de toda a história da música brasileira. O Quarteto Novo, que foi antes Trio Novo, tinha Airto Moreira na percussão e bateria, Theo de Barros no baixo e violão; e Heraldo do Monte tocando viola e guitarra. Hermeto Pascoal chegou com seu piano e reforçou o “dream team” que o País nunca mais veria de novo. Como todos estão ativos, são muitas as tentações para vê-los de volta aos palcos executando o repertório do único disco lançado pelo grupo, uma peça de colecionador gravada em 1967, mesmo ano em que Edu Lobo e Marília Medalha venceriam o Terceiro Festival da MPB com Ponteio, acompanhada pelo Quarteto. “Depois de tantos anos, estamos diferentes. Creio que Hermeto, por exemplo, nunca aceitou ao convite porque sua música mudou demais nesses anos todos. Imagina que seria preciso reunir essas pessoas para voltarmos naquele tempo…”

Airto Moreira

Sesc 24 de Maio. 7, 8 e 9/12, às 21h, e 10/12, às 18h;

Ingressos: R$ 20 a R$ 40.

R. 24 de Maio, 10

9 Tel.

3350-6300

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.