Álbum póstumo de Ray Charles é comovente

Os americanos receberam ontem, nas “principais casas do ramo”, o álbum póstumo de Ray Charles, falecido há dois meses. O pianista e cantor mais representativo do blues nos últimos trinta anos terminara de gravar Genius Loves Company em março, quando já tinha problemas clínicos acentuados. E, por mais comovente que tenha sido o esforço de Ray, é inevitável que essa situação acabe ficando exposta no álbum. Mesmo assim, é um registro importante, que se torna histórico pelas circunstâncias.

A voz de Ray Charles é a maior afetada pela doença. Em algumas canções (as mais longas), fica claro o cansaço e a dificuldade em atingir notas que ele facilmente chegava quando mais jovem. Até aí, natural, mas há cinco ou seis anos o cantor conseguiria emitir tais notas com facilidade. Suas últimas apresentações no Brasil provam isso. A faixa em que a dificuldade de Ray é mais evidente é Sweet Potato Pie, dividida com James Taylor.

A entrega dele à gravação de um álbum de duetos é mais uma prova de amor pela música. Algumas faixas foram realizadas em clima de profunda emoção, e até de consternação. O cantor que mais ficou abalado foi Elton John, que foi aos Estados Unidos gravar com Ray Charles. Depois de cantarem Sorry Seems To Be The Hardest Word (um dos pontos altos do disco), Elton foi à sala de controle para ouvir a música, e teve uma crise de choro.

Todos os “parceiros” de Ray devem ter tido emoção semelhante. Alguns tiveram a honra de cantar sucessos eternos do bluesman, como Diana Krall (que gravou You Don’t Know Me), Norah Jones (Here We Go Again), Bonnie Raitt (Do I Ever Cross Your Mind) e Natalie Cole (Fever). A escolha da filha de Nat King Cole representa uma homenagem a um dos grandes crooners da América.

As faixas mais ligadas ao blues também são destaque. Entre elas, o encontro de Ray Charles com B. B. King em Sinner’s Prayer, talvez a grande gravação do álbum. Além desta, tem Van Morrison em Crazy Love, Michael McDonald em Hey Girl e Gladys Knight em Heaven Help Us All.

Completando os convidados, dois veteranos em duas faixas tão antigas quanto. Johnny Mathis cantou Somewhere Over The Rainbow (de O Mágico de Oz), um dos temas mais queridos dos músicos americanos e da nação como um todo. E Willie Nelson é o companheiro de Ray Charles em It Was a Very Good Year, canção country que foi transformada em standard por Gordon Jenknins e Frank Sinatra.

E o Sinatra de Duets é a comparação mais plausível para Genius Loves Company. Se Ray Charles não esconde seus problemas, e se estes acabam afetando seu trabalho, mais importante é a leitura que ele fez de músicas que sempre “foram dele”, e outras que ele gravou pela primeira vez. Por causa disso, o álbum póstumo do bluesman é simplesmente imperdível.

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