Aproveitem, fãs do Ira!. Depois de 23 anos e 15 discos, ainda entre os mais tocados nas rádios, shows concorridos, o riff marcante dos dedos e da guitarra do Edgard Scandurra, do Nasi cantando rock como um milongueiro argentino, parece que eles vão parar. Ou tirar umas férias. Ou dar um tempo nesse caso de anos e anos, amor e música, público e músicos do Ira!, uma banda diferente, que acompanhou a ascensão e queda do rock nacional.
A turnê em clima de despedida começa hoje, embora virtualmente, na MTV (21h) com o Acústico MTV Ira! e seus convidados, Paralamas do Sucesso, Samuel Rosa e a Pitty.
Os clássicos da banda e mais 5 músicas inéditas poderão ser ouvidas sem a guitarra elétrica. Scandurra aproveita para mostrar sua cirtuose dedilhando o violão na linha mais pura do violonista brasileiro.
O Ira! é um produto dos anos 70, do final da ditadura militar. Edgard Scandurra, fascinado pelo punk rock e, em busca desse som, ia a shows na periferia da cidade, para trocar informações com o pessoal. Foi então que Edgard e seu amigo Dino resolveram montar uma banda que tocasse punk, sem esquecer de Led Zeppelin e Jimi Hendrix. Nascia aí o Subúrbio. Mais tarde, Edgard chamou o Nasi para participar do Subúrbio, no festival interno do colégio Objetivo. Nessa época, o grande hit do Subúrbio era Pobre Paulista, que mais tarde viraria um dos grandes hits do Ira!. Em 1980, Edgard foi convocado para servir o exército, e foi lá onde Edgard iria compor N.B. (Núcleo Base), que por sua vez também viraria um grande hit do Ira!. Um ano depois (em 1981), Nasi chamaria o amigo Edgard para tocar num show na PUC e ali surgiria o Ira, ainda sem exclamação, e com nome inspirado no Exército Republicano Irlandês. Completavam a formação o baterista Fabio Scatone, e o baixista Adilson.
De lá para cá a banda passou por todas as fases que um grupo que lida com arte enfrenta. Sucesso, queda, sucesso, fãs clubes, shows e mais shows, gravadoras, e uma geração depois, eles estão no ocaso de suas atividades, mas lançando suas músicas acústicas. O Ira! vai tocar no Guaíra na quarta-feira,mas antes, O Estado ouviu Scandurra por telefone.
P – Por que acústico, se não combina com vocês?
Edgard Scandurra – Nós tínhamos um repertório novo, mas preferimos escolher as 5 melhores músicas e fazer uma coletânea das antigas. Acho que é um reconhecimento ao nosso trabalho de 23 anos por parte da Sony e da MTV. Além disso, adoro desafios.
P – No show, você parece desconfortável ao tocar violão.
Scandurra – Nâo era isso. Eu me senti bem dedilhando. Talvez tenha sido a tensão que eu sinto ao ser filmado. A câmera incomoda. Gravamos o show em dois dias, no segundo dia eu me sentia melhor.
P – O fato de vocês produzirem um álbum acústico não cai no lugar comum, comercial, que todas as outras bandas fazem e não vai contra seus princípios?
Scandurra – Olha, a gente tem muitos anos de estrada para recusar essa história de fazer o disco comercial. Neste caso, para mim foi um desafio. Principalmente porque no acústico a gente trabalha com o improviso. Além disso, mantive o prazer de tocar para a banda e para mim.
P – Vocês não estão preocupados com o preconceito em relação ao acústico, digamos, que o público venha desdenhar?
Scandurra – Nunca pensei em fazer esse disco apenas para cumprir tabela ou contrato. Acho que a hora era boa, existem 5 músicas inéditas e existe uma série de canções lado B que passaram despercebidas. É tempo para revelá-las, pois também deram trabalho.
P – As letras do Ira! sempre pareceram simples e ingênuas. É isso mesmo?
Scandurra – Olha, nesse disco as pessoas poderão prestar mais atenção às melodias e às letras. No show normal, muita gente fica presa ao refrão ou a frases mais fortes. É possível notar que não somos tão ingênuos assim no que se refere às letras.
P – O rock brasileiro estagnou?
Scandurra – Depende do ponto de vista. Mas acho que está numa encruzilhada mesmo. Falta alguma coisa. Novidades, por exemplo.
P – Este trabalho – show na MTV, turnê e disco acústico – é a despedida do Ira!?
Scandurra – Digamos que vamos tirar umas férias, dar um tempo. Quero viajar muito, conhecer outras culturas, outras músicas. Durante todos esses anos não tivemos tempo para nada, só trabalho, shows, gravações. Está na hora também de um trabalho solo. Tanto para mim como para os outros membros da banda. Foram 23 anos juntos.