A região mais fresca do Brasil

Ainda é verão. Alto verão. Trinta e nove graus à sombra no litoral. Cinqüenta e um graus nas areias escaldantes dos desertos tumultuários.

Mas no verdejante Planalto Sul de Santa Catarina, nos Campos de Lages, nas serras de São Joaquim, Urupema e Urubici, a temperatura é sempre amena e agradável, com dias ensolarados e noites frescas. É que o fator altitude – cerca de mil metros acima do nível do mar – se une à latitude sul para dar uma média de vinte e dois graus Celsius.

Claro que no verão todo mundo quer ir à praia badalar: águas azul-regata, louras geladas, colírios para os olhos. Tem até quem prefira tomar chimarrão na praia, talvez para mostrar que é gaudério. Só falta ir de bombacha e alpargata-roda. Diz o ditado serrano: ?Quanto mais larga a bombacha, menor o fazendeiro… quanto maior a cuia, menos terra ele tem…?.

Enfim, quem estiver cansado de fila no chuveiro, supermercado, banco, posto de gasolina, bar, sorvete e falta d?água, pode subir a serra e vir respirar o arzinho leve e fino do planalto. A viagem é linda. Tanto para o turista que vier pela BR-470, dando uma passadinha em Blumenau para comprar uns panos, como pela esburacada BR-282. Ou melhor ainda: pela Serra do Rio do Rastro, a nossa Machu Picchu.

O planalto tem hoje um bom turismo rural, com fazendas que hospedam com dignidade e honestidade. Os campos de coxilhas que cercam Lages são de um capim-mimoso verde-abacate, onde afloram lajes de pedras brancas e emergem, como príncipes dos abismos, os pinheiros brasileiros, araucárias pré-históricas.

Se tiver sorte e máquina fotográfica com zoom, o turista pode flagrar a gralha azul, que é a ave que espalha o pinhão. De fato, ela não ?planta? a semente, pois não consegue cavoucar, fazer buraco. Ao voar, ela derruba os pinhões, semeando-os. Quem enterra o pinhão é o serelepe, o nosso esquilinho.

Está comprovado que o pinheiro brasileiro é uma das formas de vida vegetal mais antigas da face da Terra. Ele gosta de altitudes, de frio e se projeta nas alturas das serras, nas canhadas, nos itaimbés, nos vales. Magnífico. Altaneiro.

Seus enormes galhos desnudos balançam ao vento em circunvoluções verde-azuladas, que lembram a dança louca da mandala dos índios. Talvez ele seja marco de civilizações desaparecidas, rastros pontiagudos de gurus, xamãs e deuses bifrontes que no passado andaram pelas serras, transformando a região num ponto de chacra da humanidade.

Sua semente miraculosa – o pinhão – debulha sobre o chão, servindo de alimento no inverno gelado do planalto a homens e animais. E quem se dispuser a abraçar o pinheiro durante algum tempo, receberá energia cósmica que vem da terra. Como a araucária hoje não tem valor econômico e no futuro nada que não tenha valor econômico poderá sobreviver, só o manejo sustentável científico poderá salvá-la. A não ser que a humanidade desapareça em guerras, tsunamis, pandemias, como um desenho nas areias do deserto…

Paulo Ramos Derengoski é jornalista.

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