A Nossa Espera, de Guillaume Senez, é uma história simples, porém com pirueta dupla no meio do caminho. Fala do mundo áspero do trabalho contemporâneo e o acumula com uma questão pessoal. Quem está no centro da trama é o operário especializado Olivier (Romain Duris). Chefe de sua equipe em uma fábrica, ele enfrenta uma tremenda pressão quando sua superior procede a um “redesenho” de pessoal, eufemismo para demissões. Olivier tenta proteger seu pessoal.

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Já com essa frente de combate aberta, Olivier terá de se defrontar com outra, tanto ou mais perturbadora. Casado, pai de duas crianças, de súbito vê-se sozinho, pois sua mulher, Laura (Lucie Debay), um dia desaparece sem dar explicações.

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Com a ajuda de uma irmã, Betty (Laetitia Dosch), Olivier tenta cuidar dos filhos, seguir com seu trabalho e procurar pela mulher sumida. Duris tem carisma para conduzir esse personagem atormentado, sobre quem recaem tantos deveres e frustrações.

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Alguém pode objetar que, ao deixar o mundo do trabalho e passar para o drama pessoal, o filme se arrisca a perder seu foco. Não é bem assim. Ao passar de uma temática a outra, mesclá-las e torná-las única, Senez está apenas contemplando a complexidade da vida.

Aqui, essa dificuldade se enfrenta. Todos nós temos família, trabalho, amigos. Nossas redes de sociabilidade são múltiplas e, não raro, contraditórias. Muitas vezes a ficção (e não apenas o cinema) simplifica essa rede de relações um tanto caótica para tornar a narrativa mais simples. Resultado: conformam-se a uma realidade empobrecida. Enfrentar esse mundo não dual, construído pela junção de várias instâncias, é o maior mérito de A Nossa Espera. Em francês, o título é mais explícito – Nos Batailles, Nossas Batalhas. Aquelas que temos de enfrentar para continuar a existir. O peso dessa existência recai sobre os ombros do personagem de Duris. Como ator, ele tem condições de suportá-lo com dignidade – e este é o maior elogio que se pode fazer a um ator carismático.

A Nossa Espera mede o peso, às vezes insuportável, que a vida moderna impõe às pessoas. Sem alarde, temas contemporâneos passam pelas entrelinhas da trama, como a precarização progressiva do trabalho, a dificuldade de manter um lar com tantas exigências, as aspirações pessoais contrapostas aos deveres familiares.

O que terá acontecido com Laura? Conheceu outro homem, precisa de um tempo para si, cansou-se de tudo e nunca mais vai aparecer? São perguntas que Olivier faz a si mesmo. Tentando administrar uma casa e filhos sem a figura materna e, ao mesmo tempo, tendo de lamber a ferida narcísica que toda pessoa abandonada sente. Não é fácil, não é simples e toda a simpatia recai sobre essa figura problemática de marido e pai.

Ao mesmo tempo, o filme – e esse talvez seja seu grande trunfo – não cai na tentação do melodrama e, menos ainda, na armadilha da piedade pelo personagem. Se mostra alguns problemas em administrar as várias frentes que abre, tem muitos méritos a compensar. O primeiro deles, e talvez o mais valioso, respeitar o mistério que existe dentro de cada ser humano.