No boxe, é preciso saber apanhar. Quem diz é o protagonista de Punhos de Sangue, Chuck Wepner (Liev Schreiber), personagem real do boxe norte-americano. Wepner era farrista, beberrão, mulherengo e pouco dado à disciplina atlética. Quando subia ao ringue, era uma atração mediana, porém popular, pela forma como lutava, mostrando a cara, a coragem e sem medo de tomar porrada.
Tirou a sorte grande ao ser escalado para enfrentar o mitológico Muhammad Ali, para muita gente o maior peso pesado de todos os tempos. Ninguém dava nada pelo azarão. As apostas eram que cairia no primeiro round. Mas Chuck só veio a sucumbir no 15º assalto, ao sofrer um nocaute técnico. No 8º, provocou inesperada queda em Ali, embora diga-se que pisou de propósito no pé do campeão para derrubá-lo. De qualquer forma, esse combate fez sua fama.
O boxe tem se mostrado, ao longo de décadas, tema propício para a ficção cinematográfica. O fato de ser esporte individual, e versão moderna da antiga luta de gladiadores, dá-lhe dramaticidade específica para servir como metáfora da vida.
No princípio, o filme dirigido pelo canadense Philippe Falardeau parece seguir o caminho de um desses clássicos do gênero, Touro Indomável, de Martin Scorsese. A verdade é que toma caminhos diferentes logo depois, com uma subtrama. A história dialoga com o cinema, pois Chuck é devoto de um outro filme famoso, Réquiem de um Lutador, de Ralph Nelson, com Anthony Quinn no papel do veterano que perde a luta para um novato (Ali, no início de carreira, ainda como Cassius Clay, interpreta a si mesmo). Vejam, portanto, como Punhos de Sangue dá voltas em torno de si mesmo.
Esse diálogo continua, pois Chuck, em sua luta heroica com Ali, serve de inspiração para Sylvester Stallone na criação do personagem Rocky Balboa, de Rocky, o Lutador. Inspirando-se no cinema, Chuck transforma-se ele próprio em personagem, ainda que astro gauche, cuja maior nobreza é a derrota com a cabeça erguida. Algo como a famosa “dignidade dos vencidos”, um dos pilares do cinema de John Ford.