A música que ensina a viver

Com apenas treze anos de idade, o jovem Richard Young foi convidado para tocar para a rainha Elisabeth da Bélgica, no palácio real em Bruxelas. Desde então, tem sido solista em várias orquestras e se apresentado em recitais de música solo e de câmara por toda América (do Norte e do Sul), Europa, Leste Europeu, África e Austrália. Foi vencedor do prêmio especial de música erudita da Fundação Rockefeller, quando integrava o New Hungarian Quartet e Trio Rogeri, como violinista. Desde 1985 é um dos violistas mais renomados do Vermeer String Quartet.

Young já tocou nos mais importantes festivais de música de câmara do mundo, e tem diversos trabalhos gravados, inclusive com o oboísta brasileiro Alex Klein. Young era o produtor do Vermeer String Quartet quando o grupo recebeu uma indicação para o Grammy, pelo CD As sete últimas palavras de Cristo, de Haydn. Como professor de música atuou nas universidades de Illinois, Michigan, e presidiu o Conservatório de Oberlin e é membro honorário da Royal Northern College of Music, de Manchester (Inglaterra). Em 2005, Richard Young participou da Oficina de Música de Curitiba. Uma de suas principais atividades é ensinar música como trabalho voluntário para jovens de baixa renda, na cidade de Chicago, e em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil.

Por que o senhor não aceitou receber algum fundo por seus serviços no festival de Música de Santa Catarina?

Richard Young – Eu não estava ciente que eu não estou sendo pago para este festival. (disseram que eu estou sendo pago). Entretanto eu tenho dito sempre ao Alex (Klein) que o dinheiro não é importante para mim – que o dinheiro nunca governou minha vida.

Quando foi que o senhor decidiu fazer este tipo de trabalho e por quê?

Young – Quando me juntei ao Vermeer String Quartet de Chicago (Quarteto de Cordas) em 1985, eu senti que tinha finalmente conquistado um de meus objetivos mais importantes da carreira: tocar em um dos quartetos de cordas mais importantes do mundo. Antes, meu objetivo estava baseado unicamente no meu próprio desenvolvimento, que imaginava ser o necessário. Mas agora estava na hora de devolver minha parcela de contribuição a muitos daqueles que não puderam ter chances e possibilidades similares.

Mesmo hoje, com o mundo oferecendo muito mais oportunidades do que antes, para aqueles que são talentosos e que trabalham duro, o mundo ainda não é um lugar de oportunidades iguais. Minha família nunca foi tão rica, mas meus irmãos e eu tivemos muitas vantagens, como dois pais adoráveis que nos garantiram conforto e dinheiro suficiente para o alimento, a roupa, e as lições da música. A gente percebe hoje que, muitos estudantes de música dos grandes conservatórios não conseguem perceber que fora do mundo deles existe uma diferente e dura realidade. Tendem a não perceber que há muitos jovens que são tão merecedores quanto eles, mas que diante das dificuldades financeiras, tornam-se conseqüentemente incapazes de desenvolver seu talento. Assim, desde 1985 me dedico a tentar ajudar aqueles que merecem muito, mas são pouco ou quase nada afortunados.

Quantos talentos individuais o senhor já descobriu em sua experiência com crianças? Poderia mencionar alguns nomes, e onde elas estão tocando atualmente?

Young – Ao longo desses anos em que venho trabalhando com crianças, tenho certeza de que pude influenciá-los de alguma maneira positiva. Mas para mim, o objetivo nunca foi ?produzir? músicos de elevado calibre profissional. Pude utilizar a música para incentivar e desenvolver a disciplina nas crianças ? disciplina que poderia ser transferida a outras situações. Eu digo para as crianças que nós estudaremos música juntos, e que continuarei os ajudando a tocar sempre melhor. Mas meu objetivo principal é ensinar-lhes como ser ?EXCELENTES? em outras situações de suas vidas, não apenas no meio musical.

Eu treinei muitos jovens que tiveram sucesso em suas carreiras e já estão tocando em alguns dos melhores grupos e orquestras de música de câmara do mundo. Mas eu me sinto orgulhoso de verdade por esses jovens terem confiado em mim e neles mesmos. Estão aqui dois exemplos: havia um adolescente cujos pais haviam fugido do Vietnam. Um menino inacreditavelmente brilhante, mas que não teve nenhum tipo de motivação na sua escola. Não teve também, virtualmente, nenhum talento musical. Mesmo assim, eu disse que eu daria o melhor de mim, mas somente se ele desse o melhor de si. Se eu percebesse que desperdiçaria meu tempo, sairia fora. Hoje, com 28 anos de idade, ele está trabalhando em pesquisas de microships para computador e ganhando muito mais dinheiro do que eu.

Na Colômbia, conheci Lina, uma garota de 17 anos, muito inteligente, mas muito tímida e insegura. Após um ano de lições de violino comigo, nós dois constatamos que ela não seria uma profissional em música. Mas nesse tempo aprendeu como se aplicar melhor na vida, adquirir confiança em si mesmo e descobriu como ser excelente no que ela sabia fazer melhor. Hoje ela se tornou numa médica ortopedista muito bem-sucedida e muito respeitada na Colômbia. Por todo o trabalho que eu fiz com ela, ela dedica um dia cada semana para atender gratuitamente quem não tem recursos para pagar. Além disso, ela se casou com um outro médico e também o convenceu a fazer o mesmo. Por coisas assim que me sinto, hoje, um homem incrivelmente rico.

Como é que o senhor consegue convencer a família desses jovens para levá-los para estudar no exterior?

Young – Talvez o melhor exemplo seja o da violinista brasileira Deborah Wanderley, uma menina de 20 anos de idade, para quem consegui uma vaga para estudar violino em Vancover (Canadá) com um renomado pedagogo. A situação financeira dela é muito difícil. Seu pai morreu quando ela tinha quatro anos e seu relacionamento com a mãe sempre foi muito conturbado. Ela sempre teve um amor intenso pela música e perseguia a carreira musical.

Quando tinha 17 anos, decidiu correr atrás de seu sonho. Pagou por suas lições ocasionais do violino tocando em troca de moedas pelas ruas de Porto Alegre. Estava sempre exposta a situações perigosas e chegou a deixar de comer por dois dias. Mas ela tem uma determinação feroz que salta aos olhos. Fui apresentado a ela por Alex Klein, em janeiro de 2005, durante a Oficina de Música de Curitiba, onde fui convidado para dar aulas de viola barroca. Ele disse a ela que estaria ali, uma grande oportunidade de demonstrar toda sua sensibilidade musical. E foi exatamente isso que aconteceu e ela foi surpreendente. E é exatamente o que tem acontecido desde que ela começou a estudar em Vancover, em março de 2005.

O senhor já teve problemas com algum desses jovens para os quais ofereceu ajuda para estudar no exterior, por exemplo, de adaptação, disciplina ou de comportamento?

Young – Eles passam pelos problemas normais da idade. Embora eu tente ajudá-los da melhor maneira possível, eles sempre acabam se resolvendo, encontrando soluções próprias. Mesmo porque isso faz parte do crescimento.

O senhor poderia citar algum dos seus ?protegidos? que tenha se tornado conhecido no meio erudito?

Young – Há muitos que conseguiram o sucesso profissional em grupos superiores de orquestras sinfônicas e de orquestras de música de câmara. Mas eu preferia ficar somente com os que já citei anteriormente porque mesmo fora do meio musical, são sem dúvidas, pessoas vitoriosas.

Quem são os brasileiros que o senhor já ajudou?

Young – Camilla Meirelles, Davi Rissa Caverni, Elisa Monteiro, dos Santos de Deborah Wanderley. Mas não gosto muito de ficar citando nomes. 

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