Tolstoi estava distante da literatura havia alguns anos quando criou A Morte de Ivan Ilitch. Saudoso do amigo, Turguêniev escrevera-lhe uma carta, na qual clamava por seu retorno ao ofício. A resposta foi essa breve e impressionante novela que conta a agonia e a morte de um juiz de São Petersburgo.
O que a atriz Cácia Goulart apresenta no Espaço Redimunho é uma versão teatral do livro. Quinze anos depois de sua primeira leitura do título, ela concebeu, em parceria com Edmilson Cordeiro, uma adaptação que contempla o mesmo mote e as mesmas personagens delineadas pelo escritor russo.
O procedimento lembra o caminho que empreendera em Bartleby. Na montagem de 2008, ela também vertia um título literário para o palco – o conto de Herman Melville – e vivia o protagonista. Em A Morte de Ivan Ilitch, contudo, a intérprete fez opções mais radicais. Encarrega-se da direção. Sozinha, encarna todos os papéis. “É um projeto muito autoral, daí esse acúmulo de funções e a solidão terrível com que as encaro”, diz a intérprete, que conseguiu matizar, com cores muito pessoais, a fábula publicada em 1886.
Ter passado dois meses velando a mãe em seu leito de morte é uma dos dados que aproximaram Cácia do enredo de Tolstoi. Ali, viu-se defrontada com a finitude, com o luto, com a própria impossibilidade de experimentar o que é morrer. O espetáculo contamina-se disso e também daquilo que a intérprete chama de “paisagens internas”.
Ao longo da encenação, ela convoca reminiscências de sua infância em Minas Gerais. Ouvem-se ao fundo as carpideiras e os cantos fúnebres. As palavras de escritores mineiros – Carlos Drummond de Andrade e Guimarães Rosa – imiscuem-se entre suas falas. “Essa se transformou também na minha história, na minha narrativa”, comenta Cácia.
A MORTE DE IVAN ILITCH – Espaço Redimunho de Teatro. Rua Álvaro de Carvalho, 75, 3101-9645. 4ª a sáb., 20 h. R$ 20. Até 7/12.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.