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Chegada de Pinzón ao Brasil

O ponto de chegada no litoral brasileiro, Pinzón batizou de Cabo da Santa Maria de La Consolación. "Cabo este que, por muitas razões, julgamos hoje ser a Ponta do Mucuripe, vizinho à província do Ceará, e não o de Santo Agostinho, em Pernambuco, como chegou a acreditar", como escreveu o historiador Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878), um dos mais importantes historiadores brasileiros, em uma das mais fundamentais obras da historiografia brasileira A história geral do Brasil (1854), primeira referência a Ponta do Mucuripe.

Após navegar cerca de mais de 100 quilômetros, a frota chegou a um rio tão belo que Pinzón chamou de rio Hermoso (rio Formoso), seguramente o atual rio Curu, situado a 120 quilômetros ao norte de Fortaleza.

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Como as margens deste rio encontravam-se cerca de 40 índios, provavelmente índios da tribo potiguar comedores de camarão, – Pinzón resolveu enviar 40 espanhóis ao encontro daquele grupo de índios. Com auxílio de quatro escalares, eles desembarcaram tentando estabelecer contato com os nativos. Procuraram atraí-los, com colares de contas e espelhos, mas eles se mantiveram a distância. Um dos índios lançou uma vara, segundo o relato de Anghiera, ou uma barra de dois palmos, segundo a versão de Ângelo Trevisan, secretário da embaixada de Veneza, a serviço na Espanha, a quem Anghiera confiou os originais do seu relato sobre a viagem de Pinzón. Quando um dos marinheiros tentou apanhá-la, os nativos se jogaram sobre o marujo que, armado de espada e escudo, procurou se defender. Mas, infelizmente, foi morto por um golpe de tacape pelas costas.

Um violento conflito eclodiu entre os 20 espanhóis e 40 nativos. Após esse conflito, Pinzón decidiu seguir costeando o litoral cearense na direção nordeste. No dia seguinte ao combate, Pinzón vislumbrou uma formação arenosa muito bem feita que se assemelhava a "um bico de cisne mergulhando no Oceano" como descreveu Francisco Varnhagen, em 1861, ao visitar a ponta Jericoacoara e se encantou com a beleza do lugar e identificando-o como Rostro Hermoso (Rosto Formoso) usado por Pinzón para descrever a sua indizível beleza que constitui uma das maiores atrações turísticas brasileiras muito apreciada por todos os que visitam a região. Conta-se que Pinzón mandou fincar uma cruz com os brasões da coroa de Castela, e continuou em frente acompanhando o contorno do litoral. Algumas semanas mais tarde, Diego de Lepe, outro capitão espanhol encontrou essa cruz. No entanto, parece que Lepe cruzou a frota de Pinzón sem encontrá-la.

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A descoberta do rio Amazonas

Continuando a sua viagem costeira, a cerca de 40 léguas, ou seja, 240 quilômetros a noroeste da ponta de Jericoacoara, a tripulação da fontilha de Pinzón viveu uma das mais surpreendentes experiências da sua viagem, quando escutaram um estrondo contínuo e terrificante. Logo em seguida seus navios foram agitados por correntes fortíssimas. Foi então, que os marinheiros descobriram que as águas nas quais navegavam já não eram salgadas, pois o balde lançado do convés voltava cheio de água doce. Os estrondos que escutaram era o encontro das águas do rio Amazonas com as águas do Oceano Atlântico. Fenômeno pela primeira vez registrado pelos europeus e que os indígenas denominavam de pororoca (estrondo, em tupi guarani). Seguindo em frente, logo atingiram a foz do rio "uma boca de 15 léguas que saía no mar com grande impacto", como descreveu Anghiera. Os espanhóis deduziram que um curso de água tão monumental só poderia nascer em grandes montanhas e que seria necessário percorrer numa grande distância antes de adoçar e alcançar o mar, e concluíam que a terra que esse rio banhava deveria ser um enorme continente, sem dúvida a Ásia que eles julgavam ter encontrado. Na realidade, Pinzón estava na baía de Marajó. Como os nativos denominavam a região de Mariatambal, Pinzón batizou aquele curso d?água de Santa Maria de La Mar Dulce. Pinzón acabava de descobrir o maior rio em volume de água do planeta, que 40 anos mais tarde seria batizado de Amazonas, pelo primeiro explorador que o navegou do Peru até a foz, o espanhol Francisco Orellana.

Costeando o litoral sul-americano, a armada chegou à Ilha de Trinidad, da qual Colombo como descobridor tinha o monopólio comercial. Em seguida, dirigiu-se para Porto Rico, descoberto pelo seu irmão, Martín Alonso Pinzón, em 1493. Depois de fazerem uma parada em La Española (hoje Bahamas), perderam duas das suas quatro caravelas em um banco areia. Com essa perda, Pinzón decidiu retornar a Palos, aonde chegou em setembro do mesmo ano.

Apesar desta viagem ter sido um desastre econômico, ela constituiu uma das mais importantes realizadas pelos espanhóis na época, em razão dos seus resultados geográficos, dos quais tirariam proveito, entre outros, o navegador e cartógrafo espanhol Juan de La Cosa (1460-1510) autor do primeiro planisfério no qual aparece representado o Novo Mundo – e o navegador italiano Américo Vespúcio (1451-1512). Só trouxeram um carregamento médio de madeira usada para extrair tinta, pedras semipreciosas, como por exemplo, o topázio, canela e alguns animais raros etc. No entanto, toda esta carga penhorada pelos credores não foi suficiente para pagá-los; em conseqüência, eles tiveram que recorrer a ajuda financeira da Coroa.

Segunda viagem ao Brasil

Em 5 de setembro de 1501, os reis da Espanha nomearam Vicente Pinzón capitão general e governador do território que havia descoberto, ou seja, parte norte da costa brasileira, desde a ponta de Mucuripe até o Amazonas. Pelo mesmo ato, concederam-lhe o direito de usufruir todo o lucro que obtivesse, com a condição que a colonização fosse realizada às suas custas num prazo de um ano. Como não tivesse recurso para fazê-lo, acabou perdendo esse direito.

Em 1505, Pinzón retornou às costas do Brasil, ligeiramente mais ao sul do Cabo de São Roque, segundo tudo parece indicar o Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco. Após uma missão de dois anos, retornou a Hispaniola, quando salvou um explorador italiano cujo navio tinha naufragado na Jamaica.

Terceira viagem ao Brasil

Em 1507, o rei Fernando, o Católico, encarregou-o de novo da missão de procurar uma passagem para a Malásia, agora em companhia do piloto português a serviço da Espanha, João Dias de Solis (1470-1516). Nesta ocasião, partiram com duas caravelas do Porto de Sanlúcar de Barrameda, em 29 de junho de 1508. Esta seria a terceira e última viagem de Vicente Pinzón à América. Os dois exploradores navegaram pelas costas da Venezuela (na época Darien, Veragua e Pária), Colômbia, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Honduras (na época Trujillo) e Guatemala. Como não encontrassem a passagem para as Ilhas Molucas, decidiram explorar a Península de Yucatán e aproveitaram para penetrar no Golfo do México até 23,5º latitude norte. Alguns historiadores atribuíram a descoberta de Honduras a Pinzón, que foi apontado Governador destas terras. No entanto, ele nunca tomou posse delas. No final da viagem, iniciada em 1508, como Pinzón havia sido comissionado pela Espanha para encontrar uma passagem para o Oceano Pacífico, ele fez mais uma tentativa para encontrá-la. Foi quando, mais uma vez Pinzón navegou pelas costas do Brasil acompanhado por Solis. Ele decidiu abortar a missão no ano seguinte, tendo em vista dos desentendimentos com Solis, retornando ambos ao porto de Cadiz, em outubro de 1509. Logo que chegaram, foi aberto um inquérito para investigar as queixas de Pinzón. A comissão encarregada do inquérito ratificou a designação de Pinzón como Capitão general e corregedor da Ilha de Porto Rico, enquanto Solis foi conduzido à prisão.

Os últimos anos de Vicente Yañez Pinzón

Depois desta expedição, Vicente Yañez Pinzón estabeleceu-se no bairro de Triana, em Sevilha, onde passou os últimos anos de sua vida, ao lado da sua segunda esposa, Ana Nuñez Turillo e as filhas Ana e Juana, do seu primeiro casamento com Tereza Rodriguez. Em 1513 testemunhou contra o navegador genovês, com a sua habitual moderação, nas Probanzas (Averiguações), célebre processo movido, durante 29 anos, contra a Coroa espanhola por D. Diego Colón, filho primogênito de Cristóvão Colombo, em defesa dos seus direitos como herdeiro do pai.

Em 14 de março de 1514, com 65 anos de idade, recebeu a ordem de acompanhar as pedrarias D?Ávila e Darien, mas infelizmente enfermo pediu dispensa. Este documento foi o último pelo qual é possível deduzir que até aquela data se encontrava vivo. Tudo parece indicar que Vicente Yañez Pinzón morreu neste mesmo ano. A data exata e o local onde foi enterrado permanecem ignorados; acredita-se que nas condições financeiras dos seus últimos dias deve ter sido enterrado em uma cova comum no cemitério da cidade.

A grande questão: Cabo de Santo Agostinho ou Ponta do Mucuripe?

Treze anos depois da sua primeira viagem ao Brasil, em 1513, Vicente Pinzón, em seu depoimento nas Probanzas, afirmou que o primeiro contato com o território brasileiro deu-se em "Santa María de Consolación" que é parte de Portugal e agora se chama "Santo Agostín".

Se por um lado, esta declaração de Pinzón de que o ponto de chegada no litoral brasileiro foi no Cabo de Santo Agostinho, nas costas pernambucanas, estar em contradição com a de quatro dos seus companheiros de viagem que indicaram o de Rostro Hermoso, no litoral cearense. Por outro lado, no que se refere ao rumo adotado logo após a chegada noroeste e rumo da costa oeste – declarado são totalmente incompatíveis com o rumo e o litoral acima do acidente pernambucano.

Se fosse Santo Agostinho o ponto de chegada ao Brasil, o rumo deveria ser o norte até Cabo Calcanhar, quando então deveria tomar a direção noroeste. Ora, quem primeiro percebeu estes equívocos foi o almirante Max Justo Guedes, que analisou minuciosamente os depoimentos tomados durante as Probanzas, junto aos tripulantes que acompanhavam Pinzón, como se pode ver pela Tabela: Testemunhos dos membros da tripulação de Pinzón nas Averiguações, através da qual é possível verificar que a maior parte dos membros da tripulação indicou como local de chegada Rostro Hermoso e para quase todos a navegação ao longo da costa coincidiu com o rumo noroeste. Ao se confrontar os testemunhos a respeito de alguns pontos específicos da viagem de Pinzón, durante as Probanzas, podemos recorrer às considerações de Capistrano de Abreu: "primeiro, porque a discordância que patenteiam enfraquece a ambas; segundo, porque foram exprimidas de 1513 a1515, muitos anos depois do acontecimento a que se referem (ocorridos em 1500), quando já não devia estar fresca a lembrança que dele guardavam". Este argumento de Abreu defensor da tese do Cabo de Santo Agostinho – aplica-se também ao próprio Pinzón que também teria se equivocado. Convém lembrar que o principal argumento dos defensores da tese do Cabo de Santo Agostinho é este testemunho de Vicente Pinzón.

Estudando o mapa-múndi de Juan de La Cosa, Max Justo Guedes concluiu que o ponto alcançado foi a costa do Ceará, próximo à ponta do Mucuripe. Esta conclusão foi confirmada também pelo estudo náutico de travessia, considerando: a navegação com ventos alísios de nordeste, a partir de Santiago até as regiões das calmarias equatoriais; a travessia na região de calmaria e, finalmente, a navegação com ventos alísios de sudeste até a chegada.

Um trabalho mais convincente foi os estudos referente ao tempo recorde gasto na travessia; aos ventos que não deixam dúvida que realmente o local de encontro de Pinzón com a costa brasileira foi realmente na Ponta do Mucuripe.

Recentemente, o professor Juan Manzano Manzano, o maior especialista na vida e navegações dos irmãos Pinzón, fez uma distinção entre a primeira e a segunda viagem de Pinzón ao Brasil. Para Manzano, o local de contato com o litoral brasileiro da primeira viagem, em 1500, foi a Ponta do Mucuripe, no Ceará, sendo que na segunda viagem, em 1504, o ponto de chegada foi o Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco.

Ao aceitar a hipótese Adolfo Varnhagen, confirmada pelas pesquisas do almirante brasileiro Max Justo Guedes, em 1975, Manzano veio juntar-se a outros historiadores, dentre eles, Samuel E. Morisón, Flávio Pestana Ramos e Rodolfo Espínola, que também sugeriram que o Cabo de Santa María la Consolación é realmente a Ponta do Mucuripe. Se por um lado, não há mais duvida, portanto que o Cabo de Santa María de la Consolación, como o navegante palense denominou a Ponta do Mucuripe, por outro lado o Cabo de Santo Agostinho é o ponto de chegada da segunda viagem.

A dificuldade na determinação ponto de desembarque foi a falta de um astrolábio náutico, pois graças às observações astronômicas feitas pelos físico e astrônomo Mestre João, hoje se sabe com precisão a posição da chegada de Cabral, como está relatado na famosa Carta de Mestre João, indiscutivelmente o documento mais importante que não deixou nenhuma dúvida a com relação a latitude do local de desembarque da missão cabralina.

Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é pesquisador-titutar do Museu de Astronomia e Ciências Afins, no qual foi fundador e primeiro diretor, e professor visitante da Universidade Vale do Acaraú, autor de mais de 70 livros, entre outros livros, do "Astronomia na época dos descobrimentos" Lacerda Editores.

Consulte a homepage: http://www.ronaldomourao.com.