Para colecionadores, é um item imperdível – já está nas locadoras e lojas especializadas o segundo volume da Coleção Charles Chaplin, da Warner, trazendo os DVDs com as cópias restauradas de três filmes – O Circo, de 1928; Luzes da Cidade, de 1931; e Monsieur Verdoux, de 1947 -, mais o documentário Charlie, a Vida e a Obra de Charles Chaplin, do crítico Richard Schickel, contando tudo o que você sempre quis saber sobre o criador de Carlitos (e o próprio personagem). O primeiro volume da coleção trouxe clássicos como Em Busca do Ouro, de 1925; Tempos Modernos, de 1936; O Grande Ditador, de 1940; e Luzes da Ribalta, de 1952. O segundo (R$ 180) continua o mapeamento da obra de um dos grandes do cinema.
Chaplin ainda é fascinante para o público do século 21? Você pode até achar um absurdo que a pergunta tenha de ser feita mas vale lembrar que o cinema passou por grandes transformações desde que Chaplin criou Carlitos, no começo do século passado. Quando ele fez isso, o cinema ainda engatinhava e Chaplin merece ser colocado entre os pioneiros que ajudaram a construir a linguagem cinematográfica.
Os filmes, na época do cinema mudo, eram projetados à razão de 16 quadros por segundo, o que criava uma ligeira aceleração da imagem que Chaplin, espertamente, incorporou para criar a pantomima de Carlitos. Ele tinha consciência disso e resistiu o quanto pôde à revolução tecnológica que dotou o cinema de som, no fim dos anos 1920.
Numa entrevista, Geraldine Chaplin disse que a coisa mais acertada que a família fez foi confiar o espólio cinematográfico de seu pai ao produtor, diretor e distribuidor francês Marin Karmitz, da empresa MK2. Karmitz é um homem de cinema integral. Um cinéfilo, não um comerciante do audiovisual. Ele fez um primoroso trabalho de restauração dos filmes de Chaplin. O Grande Ditador, relançado nos cinemas, estava espetacular. Estão igualmente admiráveis os três filmes do novo pacote.
O Circo vai na contracorrente do Cecil B. De Mille de O Maior Espetáculo da Terra, mostrando o circo como o menor espetáculo. Sob a lona singela, Carlitos apaixona-se pela trapezista. Luzes da Cidade conta uma triste história de amor, mostrando como Carlitos devolve a visão a uma florista cega, pagando-lhe uma cirurgia. A abertura e o encerramento são geniais e confirmam a importância de Chaplin como arquiteto da imagem (e do som). Uma confusão sonora faz com que, no início, a cega pense que o vagabundo Carlitos seja um milionário. Quando o vê e descobre quem ou o que ele é, a decepção é grande – ela vê o exterior, não o interior. Monsieur Verdoux, inspirado no caso Landru, enterra o personagem Carlitos e faz um ataque às guerras, por meio do homem que acha natural matar mulheres, posto que as nações matam muito mais como forma de resolver seus conflitos. Chaplin foi um artista excepcional. Será lastimável se, em nome do novo, o público jovem renegar o legado de sua grande arte.
Genialidade ofuscou talento musical
A genialidade do cineasta Charles Chaplin ofuscou seu talento para a música, que ele considerava complemento da cena, seja no teatro, onde estreou aos 5 anos, cantando e fazendo graça no cinema, cuja linguagem ajudou a inventar. Mesmo assim, algumas composições suas, como Smile, Secret in Your Eyes e Fox Trot são clássicos com milhares de versões. Para mostrar que o criador de Carlitos era também um grande músico, três pianistas e arranjadores brasileiros, Gilson Peranzetta, João Carlos Assis Brasil e Leandro Braga, gravaram o disco A Música de Chaplin, que será lançado amanhã (29), na Sala Cecília Meireles.
O disco nasceu de um show realizado no Sesc do Rio, no fim do ano passado, quando o produtor Marcos Souza quis lembrar Chaplin nos 25 anos de sua morte. “Foi difícil conseguir material, pois a autobiografia dele, “Minha Vida”, estava esgotada (deve ser relançada neste semestre, pela José Olympio) e na internet, há pouca informação”, conta Souza.
“Tocar Chaplin é um desafio porque suas músicas são muito ricas e bonitas”, explica Assis Brasil, que fecha o CD com a “Suite Chaplin”. Leandro Braga abre o disco com a trilha dos filmes O Balé dos Pãezinhos, de Em Busca do Ouro; Segredos nos Seus olhos, de Vida de Cachorro, e Non Sense Song, de Tempos Modernos. Já Peranzetta foi por outro caminho. “O jeito foi recriar, esquecendo a cena em que cada música foi tocada”, diz ele, que fez versões personalíssimas de outras seis músicas.
A intimidade de Chaplin com a música vinha do berço e em Minha Vida ele conta que sonhou ser concertista e estudou violino. Desistiu aos 20 anos, mas chegou a receber elogios de Claude Debussy, ao qual não deu atenção porque não sabia de quem se tratava.