O diretor Fernando Meirelles não entendia nada de funk até decidir ambientar em um baile seu episódio deste ano do seriado Cidade dos Homens, que vai ao ar em outubro na Globo. Mas o cenário que ele e sua equipe criaram na quadra da comunidade do Morro Santa Marta, em Botafogo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, agradou em cheio a Douglas Silva e Darlan Cunha, intérpretes de Acerola e Laranjinha no programa, bem mais inteirados do assunto. Os dois, aliás, têm sua porção “autoral” em O Baile. Foi de uma conversa cuidadosamente “monitorada” com os próprios atores que o diretor tirou as expressões, as “manhas” e até o tom do episódio. “Estamos fazendo uma espécie de crônica de um baile funk, visto pelo olhar dos meninos”, justifica Fernando, que assina o roteiro do episódio em parceria com Jorge Moura.
Mesmo assim, o diretor não dispensou a “consultoria” de alguém ainda mais especializado no assunto. As músicas tocadas durante as filmagens e os “bondes” que animam o fictício baile foram “dicas” do DJ Marlboro, que tratou de ambientar Fernando no universo do funk. Para Darlan, o resultado não poderia ser melhor. Mas por uma razão bem particular. “Sempre curti baile, mas nunca fiquei com três meninas numa noite”, destaca o inquieto ator. A empolgação é fruto do sucesso que Laranjinha faz com as garotas no episódio, mas também gera uma pontinha de preocupação. “O chato é que vou aparecer como canalha na tevê. No próximo baile, vou estar com o filme queimado”, imagina.
Adolescência
Para os episódios deste ano, a intenção de Fernando é justamente acompanhar o crescimento dos meninos, conduzindo a história a partir de um ponto de vista mais adolescente. Como Darlan, Douglas também demonstra grande satisfação por abordar temas como o namoro, a azaração e o costumeiro “ficar” da garotada. E chega a contrariar um pouco a idéia de que a mudança de enfoque acompanha o surgimento de novos interesses em suas próprias vidas. “Não mudou muita coisa do ano passado para cá. Sempre fui interessado em mulher”, dispara, com naturalidade.
Na hora do “gravando!”, no entanto, a descontração dá lugar a um ligeiro constrangimento. Numa cena de beijo, o diretor pede que Douglas olhe para a atriz com quem contracena. Ele se desconcentra, ri, repete uma, duas, três vezes. Bem-humorado, Fernando não perdoa. “Não é possível! Ele está gostando do beijo e erra de propósito”, detona, arrancando risos da equipe e dos cerca de 60 figurantes que compõem a platéia do baile.
“Orquestrar” a figuração, aliás, é um dos principais trabalhos durante as filmagens. A tarefa cabe a Lamartine Ferreira, assistente de direção de Fernando, que acaba atuando como uma espécie de “animador”. “Vou tirar a música, mas vocês continuam na empolgação”, pede, dando uma “palhinha” do funk para colocar a turma no clima para os “takes”. “Trato as pessoas como gostaria de ter sido tratado quando fui ator”, ensina.
Inquietude
O mais difícil, no entanto, não é conseguir as expressões de animação e a ritmada coreografia sem a batida do funk, mas colocar a turma em silêncio. “Nós estamos acostumados a trabalhar com isso 12 horas seguidas, eles não”, justifica Lamartine, que chegou a coordenar 300 figurantes, recrutados na própria comunidade Dona Marta, no primeiro dia de filmagens na quadra.
De fato, as jornadas costumam começar por volta das 17 h e se estendem madrugada adentro. Mas o bom andamento do trabalho já chegou a surpreender o diretor. Logo no segundo dia das filmagens, a previsão era seguir até as 5 h da manhã, mas, por volta das 22 h, Fernando já considerava a missão cumprida e aproveitou para “inventar” uns planos. “Estamos com a mesma equipe desde Cidade de Deus. As coisas vão ficando mais fáceis, os garotos estão muito profissionais. Acho que estamos aprendendo”, conclui, com um sorriso de satisfação.
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