São Paulo – A expulsão de Zinedine Zidane aos quatro minutos do segundo tempo da prorrogação, depois de uma cabeçada no zagueiro Materazzi, não só atrapalhou a França na decisão, que terminou com vitória italiana por 5 a 3 nos pênaltis, após empate por 1 a 1 no tempo normal e prorrogação, como manchou uma carreira brilhante e vitoriosa que, se o jogador não mudar de idéia, se encerrou ontem, no Estádio Olímpico de Berlim. Com o lance intempestivo, Zidane lembrou mais o garoto briguento que demorou a se estabilizar na carreira, e que foi expulso por um pisão num jogador da Arábia Saudita no segundo jogo da França na Copa de 1998, do que o craque de camisa 10 que acabou com o Brasil na decisão daquele mesmo mundial, com dois gols de cabeça na final, vencida pelos franceses por 3 a 0.

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Retorno

Zidane já não vestia a camisa 10 quando a França iniciou sua caminhada na Copa do Mundo de 2006. Depois do fiasco na Eurocopa de 2004, quando a equipe defendia o título e caiu diante da Grécia, 1 a 0, nas quartas-de-final, ele anunciou sua despedida da seleção francesa. Depois de um começo confuso, com empates por 0 a 0 em casa com Israel, Irlanda e Suíça, Zidane resolveu voltar à equipe, que já havia defendido em 93 ocasiões – a estréia foi em 17 de agosto de 1994, num empate por 2 a 2 em Bordeaux. Era o início da campanha que levaria a França a seu único título mundial, em 1998, depois de ficar de fora das Copas de 1990 e 1994.

Filho de imigrantes argelinos, Zidane nasceu em 23 de junho de 1972, em Marselha, e jogava por um time amador da cidade, o La Castellane, quando foi descoberto por um olheiro e levado para o modesto Cannes. Fez sua estréia no Campeonato Francês em 1989, aos 17 anos. Em 1992, transferiu-se para o Bordeaux, e em 1996 levou a equipe à final da Copa da Uefa, contra o Bayern de Munique.

Glória

O Bordeaux perdeu os dois jogos, mas Zidane impressionou os dirigentes da Juventus, da Itália. Na primeira das cinco temporadas que ficou por lá, ajudou a equipe a conquistar o Mundial Interclubes, numa vitória por 1 a 0 sobre o River Plate. Enquanto brilhava na Itália, viveu a fase mais gloriosa de sua carreira na seleção.

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Em 1998, fazia uma Copa do Mundo de altos e baixos quando resolveu brilhar justamente na final contra o Brasil, com os gols de cabeça, fato raro em sua carreira. Em 2000, comandou a equipe na vitória por 2 a 1 sobre a Itália, de virada e na morte súbita, que deu à França sua segunda Eurocopa. No ano seguinte, Zidane se tornaria o jogador mais caro do mundo com o Real Madrid pagando cerca de US$ 60 milhões ao Juventus por sua contratação.

Fiasco

Chegou à Copa de 2002 como líder e já capitão da seleção da França, favorita ao bi. Mas uma contusão num amistoso contra a Coréia, antes da Copa, o deixou de fora dos dois primeiros jogos. Sua presença em campo no jogo derradeiro, contra a Dinamarca, serviu apenas para simbolizar o fiasco da França, eliminada na primeira fase, sem vencer e nem sequer marcar gols.

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Depois do novo fracasso, Zidane resolveu se afastar da seleção, festa. Mas não suportou ver a equipe capengar nas eliminatórias, e voltou a vestir a camisa dos ?Bleus? no dia 3 de setembro do ano passado, na vitória por 3 a 0 sobre Ilhas Faroe.

Aposentadoria

Antes da Copa, anunciou sua aposentadoria definitiva, desta vez do futebol. Começou devagar a Copa, assim como a seleção: dois cartões amarelos, nos empates contra Suíça e Coréia do Sul, o deixaram de fora do jogo contra Togo, o que tornaria sua despedida melancólica com uma eliminação naquela partida. Mas a França venceu, embalou depois de eliminar a Espanha, e Zidane teve uma atuação de gala contra o Brasil nas quartas-de-final, com um chapéu sobre Ronaldo e o passe para o gol de Henry, entre outras jogadas.

De pênalti, fez o gol da vitória na semifinal e abriu o placar na decisão contra a Itália. Um dos melhores jogadores da Copa, fortíssimo candidato à Bola de Ouro da Fifa, acabou deixando uma última imagem melancólica – e injusta para tão brilhante e vitoriosa carreira.

Kaiser defende o craque

Berlim – O ex-jogador e presidente do comitê organizador da Copa 2006, o alemão Franz Beckenbauer, defendeu ontem o meia Zidane.

?Algo ele (Materazzi) deve ter dito ao Zidane, que é uma pessoa muito tranqüila, até inofensiva?, explicou Beckenbauer. ?Evidente que a expulsão enfraqueceu os franceses, que formam uma seleção sensível, ainda mais quando o seu capitão está envolvido em alguma confusão?, completou o ?Kaiser?.

Chirac

O presidente da França, Jacques Chirac, absolveu Zidane de uma eventual culpa pela derrota da seleção nacional para a Itália.

?Expresso toda a estima que tenho a um homem que encarnou os melhores valores do esporte e as melhores qualidades humanas que se podem imaginar. Ele foi uma honra para o esporte francês e para o país?, disse Chirac à emissora de TV TF-1.