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Viúvas de jogadores da Chapecoense se apoiam no amor aos filhos para retomar vida

Viagem para os Estados Unidos, caminhadas pela manhã e exercícios em academias, cultos em igrejas evangélicas com maior frequência, busca por justiça e dedicação total à criação dos filhos. É assim que três das mulheres que perderam seus maridos no trágico acidente com a delegação da Chapecoense, há pouco mais de três meses, lutam para se reerguer.

Uma pane seca fez o voo 2933 da companhia aérea boliviana LaMia bater no monte Cerro el Gordo, nos arredores de Medellín, na Colômbia, na madrugada de 29 de novembro (horário de Brasília). Das 77 pessoas a bordo, 71 morreram – entre elas os jogadores Ananias, Gil e Bruno Rangel.

Nesta semana, o Estado conversou com as três viúvas dos atletas – respectivamente Bárbara Calazans Monteiro, de 37 anos, Valdecia Borges de Moraes Paiva, de 25, e Girlene Domingues, de 30, em um hotel próximo ao Allianz Parque, estádio do Palmeiras, local do último jogo da Chapecoense antes da tragédia. Juntas, tentam fazer com que a dor das famílias seja atenuada.

Elas receberam da Chapecoense e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) indenizações de 26 vezes os salários de seus maridos – até agora, não passam por dificuldades financeiras, mas sabem que uma hora esse dinheiro vai acabar. Gil e Val ainda não se sentem preparadas para trabalhar e dão prioridade absoluta às crianças. No futuro, pretendem voltar a estudar e arrumar emprego.

Além delas, outras mulheres também travam suas lutas diárias. Amanda Machado, de 26, noiva de Dener, criou a empresa D6 para vender brigadeiros gourmet. A ideia surgiu justamente de uma conversa com o marido, fã do doce. Após a tragédia, ela manteve o projeto, como forma de homenagem ao companheiro, que jogava com a camisa 6. Os dois iriam se casar três dias depois do acidente.

Sirli Freitas também mudou de vida. Jornalista, acabou herdando a vaga que pertencia ao marido Cleberson Silva, uma das vítimas, assessor do clube.

No encontro com o Estado, Bárbara revelou que tem praticado atividades físicas para ocupar o tempo – suas preferidas são as caminhadas pela manhã, após deixar os filhos na escola, e depois vai à uma academia. Além disso, fez uma viagem junto com Val – elas passaram alguns dias em Miami ao lado das crianças. Por fim, a viúva do volante Gil diz ter aumentado a frequência nos cultos de uma igreja evangélica. “Dá muita paz”, justifica.

“Entender o que passou e secar as lágrimas são coisas que vão demorar para acontecer. Passei a fase do choque e da tristeza. Alguns dias me sinto melhor, outros nem tanto. Só me resta transformar essa dor em força”, diz Bárbara.

Ela e Valdecia são inseparáveis – além da viagem, passam muito tempo juntas e se comunicam com outras viúvas em um grupo fechado no WhatsApp, que já existia antes do acidente. “Tem dias que acho que é um pesadelo e que vou acordar e o Gil estará do meu lado. Me dói quando as filhas falam dele”, conta Val, viúva do volante.

Elas têm recebido apoio de atletas que atuavam com seus maridos e dos sobreviventes do voo. “O Neto e a família dele eram nossos amigos e têm nos ajudado”, comenta Val.

Coisas corriqueiras se tornaram um sofrimento. “Todo ano a gente ia junto ver o colégio para nossos filhos. O Bruno levava nossa filha para a escola quando estava em casa. Não desejo esse sofrimento para ninguém”, diz Girlene.

Falar sobre os filhos não é tarefa fácil. Elas choram ao lembrar de como as crianças reagiram à perda dos pais. Bárbara precisou da ajuda de uma terapeuta para contar a Enzo, de 5 anos, que seu pai nunca mais voltaria para casa. “Com o passar do tempo, ele falava que estava com saudade, perguntava do pai e chegou a dizer que queria morrer para ficar ao lado do Ananias”, diz.

As três viúvas decidiram não esconder nada e contaram às crianças o que estava acontecendo, sem fantasiar, pois temiam que isso pudesse causar problemas psicológicos no futuro. Val chamou Gabriela, de 5, e Lívia, de 3, e explicou a história.

A mais nova parecia não entender a gravidade. Enquanto ouvia, não parava de pular e brincar, até que saiu do quarto e foi para a cozinha. “Ela chegou para as pessoas que estavam na casa e falou que o pai tinha morrido, mesmo sem eu citar a palavra morte”, lembra a mãe.

Val, que deixou Chapecó para morar em Natal, decidiu visitar Bárbara, em Salvador, no último fim de semana, e percebeu um novo problema – o medo de avião de uma das filhas. “Falei para as meninas que a gente ia ver o Enzo, amiguinho delas, e a Livia me disse que não queria, pois estava com medo, já que o avião tirou a vida do pai. Ela entrou em desespero”, contou a viúva do meia Gil.

Elas ainda lutam para receber as indenizações da LaMia, mas um acordo com a empresa está longe de um desfecho. Além das indenizações já recebidas, na última quinta a Chapecoense repassou mais R$ 40 mil para os parentes das vítimas – o dinheiro veio de doações.

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