Los Angeles, EUA, 17 de julho de 1994. No estádio Rose Bowl, o capitão Dunga repete o gesto de Bellini, Mauro e Carlos Alberto e inaugura uma nova era no futebol brasileiro.
Treze anos depois, os tetracampeões Márcio Santos, Müller, Viola e Ronaldão se reencontraram na última segunda-feira, em Curitiba, numa noite de lembranças, histórias e revelações.
Para muitos, o título conquistado sobre a Itália, nos pênaltis, significou o triunfo do futebol de resultados, objetivo mas sem brilho. Quem estava lá contesta. Para os jogadores, o tetra foi uma vitória de uma nova mentalidade, que permitiu à seleção brasileira reencontrar o caminho dos títulos.
Müller, que também participou das Copas de 1986 e 1990, fala com a propriedade de quem esteve no time nacional, antes, durante e depois da Copa dos EUA. ?A base do time campeão vinha de 1990. O que aconteceu? Os ideais sempre foram certos. As estratégias que eram erradas?, avalia o atacante.
Mário Santos explica a diferença. ?Depois de 1970, o Brasil sempre teve grandes jogadores. Em copas, teve algumas participações boas. Mas sempre assistia à final em casa. Naquele ano, resolvemos fazer o que faltava. Unimos a aplicação e a força do futebol europeu com o talento brasileiro. Tudo com muita inteligência?, diz o zagueirão.
União
O projeto canarinho esteve ameaçado antes mesmo de a seleção chegar aos EUA. Além de enfrentar uma campanha complicada nas eliminatórias, o Brasil quase perdeu seu comandante um ano antes da copa. ?Depois da derrota para a Bolívia, em La Paz (2×0), o Parreira queria pedir demissão. Nós jogadores que não deixamos. Ali naquela dia começou a caminhada rumo ao tetra?, revela Müller.
As fortes críticas da imprensa brasileira não abalaram o grupo brasileiro. Ao contrário, serviram para deixar a seleção ainda mais focada na conquista do título. ?Hoje a gente percebe que esse descrédito e essa cobrança foram benéficos. Sem aquilo, a responsabilidade não seria a mesma?, acredita o zagueiro Ronaldão.
Depois de garantida a vaga no mundial, a confiança cresceu e o time teria ficado ainda mais unido. ?A gente ouvia dizer que em 1990 era um grupo horrível, que brigava por bichos e premiação. Em 1994, foi maravilhoso. Antes da copa, acertamos que a premiação seria dividida entre toda a delegação. O ropeiro era igual a mim. O cozinheiro, igual ao Romário?, garante Viola.
Legado
A trajetória do Brasil nos EUA todos conhecem. Jogando um futebol de muita força e aplicação, e contando sempre com os gols de Romário, o Brasil foi avançando até a decisão com a Itália. O título só veio nos pênaltis, mas o objetivo estava cumprido. ?Quebramos um grande jejum, que já parecia interminável. Tiramos o peso das costas da próxima geração e o Brasil teve mais tranqüilidade para voltar a ser campeão, em 2002?, afirma Ronaldão.
Depois de treze anos, a conquista é vista como um legado para todo o futebol brasileiro. ?A seleção passou a ser mais respeitada, pois provou que podia ser competitiva jogando um futebol moderno. O jogador brasileiro foi muito valorizado?, conclui Müller.
Viola ainda quer jogar. E no Coritiba
Um sonho vivido pela torcida coxa-branca em 1998 pode se tornar realidade em breve. Pelo menos, no que depender da vontade de Viola. O artilheiro diz estar pronto para tornar realidade uma especulação que mexeu com o Alto da Glória quase dez anos atrás.
?Já imaginou o Viola no Coxa?? No final da última década, parecia quase impossível. Recuperando-se de uma cirurgia facial, o atacante tinha seu retorno aguardado pela torcida do Palmeiras e despertava interesse do Santos, para onde acabou se transferindo. Porém, Viola diz que existiu um fundo de verdade nos boatos.
?Eu realmente fui informado do interesse do Coritiba e viria para cá com muito prazer. Mas foi tudo muito confuso. Eu não sei se eles conversaram com o Paulo Angioni (diretor da parceira Palmeiras-Parmalat) ou com o Sebastião Lapola (diretor de futebol). Mas comigo ninguém do Coxa veio falar. Só depois fiquei sabendo que o negócio tinha sido desfeito?, revela Viola.
Para o atacante, a possibilidade de vestir a camisa alviverde ainda não está descartada. ?Eu ainda estou jogando. Não parei, não! Tenho 38 anos, nunca operei perna ou joelho e estou ótimo. Pode avisar o pessoal do Coritiba que eu estou na área! Demorou!?
O último clube de Viola foi o Uberlândia, de onde foi dispensado no final do primeiro semestre. Ele é o único dos craques que participaram do encontro que ainda está em atividade. Müller é atualmente comentarista da TV Bandeirantes. Ronaldão tem uma escolinha de futebol em São Paulo. Márcio Santos é dono de um shopping em Balneário Camboriú (SC). (CM)
Um fenômeno na hora de dormir
Ronaldão não conseguiu pregar os olhos durante a Copa de 1994. Mas não foi a ansiedade ou a pressão pelo título que tiraram o sono do zagueiro. A culpa foi de um ?fenômeno? da apnéia noturna. ?Eu fiquei quase um mês sem dormir. Meu companheiro de quarto era o Ronaldo. O que ele ronca é um absurdo?, revela o antigo xerifão de São Paulo, Flamengo, Santos, Coritiba…
Último a chegar aos EUA, devido ao corte de Ricardo Gomes, Ronaldão acabou herdando a ?honra? de dividir o quarto com Ronaldo. ?Levei muita sorte, porque o companheiro de quarto dele era eu. Quando o Ricardo saiu, eu corri para o quarto do Taffarel e deixei a bomba com o Ronaldão?, diz o esperto Viola.
O atacante diz que antes da troca teve de apelar para a criatividade para fugir dos roncos ?fenomenais?. ?Era um absurdo! Não tinha jeito de dormir. Eu cheguei a colocar o colchão dentro do banheiro. Mesmo assim não adiantava?, brinca o veterano artilheiro.
Projeto
As histórias sobre os roncos de Ronaldo foram um dos momentos mais divertidos do encontro no Bar Santa Marta. O evento faz parte do projeto ?Palavra de Craque?, que visa a integração entre executivos e ídolos do futebol nacional. Curitiba foi escolhida, pela primeira vez, para o papo sobre a Copa de 1994. O projeto já passou por Rio, São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre. Em cada cidade, aborda um novo tema e convida diferentes jogadores. (CM)