Uma montanha de caixas de pizza vazias, consumidas durante as 18 horas do julgamento do ?Caso Bruxo? e largadas nos fundos da Federação Paranaense de Futebol, ilustra bem o resultado do fato jurídico mais importante do futebol paranaense nos últimos anos. A seqüência quase interminável – e ainda em andamento -de denúncias de corrupção envolvendo árbitros, dirigentes de clubes e membros da entidade que administra a modalidade no Estado resultou em apenas quatro condenações, de um total de 13 denunciados. Entre os eliminados do futebol, um fato em comum: todos revelaram falcatruas no esporte local. Acabaram pagando o pato sozinhos.
O julgamento, que começou às 13h30 de segunda-feira, foi encerrado somente às 7h30 de ontem, na sede do Tribunal de Justiça Desportiva da FPF. Havia perspectiva real de que o anúncio dos votos fosse adiado para quinta-feira, mas o Tribunal decidiu levar o caso até o fim.
A quantidade de denunciados fez o rito tornar-se cansativo. O depoimentos de 11 réus – já que José Francisco de Oliveira, (Cidão) não compareceu e o dirigente Genézio de Camargos, do Foz do Iguaçu, foi dispensado da palavra ao confirmar a confissão por escrito feita ao TJD – só terminou por volta das 21h. Houve momentos de tensão, como a tentativa de agressão do acusado Amoreti Carlos da Cruz contra Evandro Rogério Roman.
Os depoimentos das testemunhas de acusação também foram quentes. O ex-diretor de arbitragem José Carlos Marcondes confirmou denúncias contra o sucessor Fernando Luiz Homann e o árbitro Antônio Salazar Moreno. Depois veio Evandro, autor das principais acusações, mas que decepcionou em parte por não trazer provas nem citar casos concretos de envolvimento de colegas de apito em maracutaias. Ele apenas acrescentou uma suposta tentativa de acerto feita em 2003 pelo Coritiba -caso que pode gerar novo inquérito no TJD.
Os diretores Nelson Boreico e João Alberto Ituarte, do Prudentópolis botaram lenha grossa na fogueira. Eles acusaram o diretor da FPF Johelson Pissaia de pedir pessoalmente o pagamento de R$ 60 mil, a ser dividido em três partes, para o clube subir à Série Ouro em 2005. Revelaram que o intermediário de Pissaia era o árbitro Marcos Tadeu Mafra, que encontrou-se com Boreico no Shopping Curitiba. E apresentaram uma agenda com vários telefones de árbitros e assistentes, que o próprio Mafra confirmou ter anotado de próprio punho.
Entre acusação e defesa, foram ouvidas 30 pessoas. Depois se pronunciaram os advogados de defesa e por último a procuradoria. Ao final, quando o sol já raiava, os oito auditores se posicionaram e condenaram apenas os três dirigentes de clubes do interior que admitiram o pagamento de suborno -Camargos, Gílson Pacheco, do Marechal Cândido Rondon, e Sílvio Gubert, do Operário, além de Cidão, que também admitiu o envolvimento no esquema. Todos foram eliminados do futebol.
Já os árbitros Amoreti Carlos da Cruz (aposentado), Antônio Salazar Moreno, Carlos Jack Rodrigues Magno, Marcos Tadeu Mafra e Sandro César da Rocha, os ex-diretores de arbitragem Valdir de Souza, Antônio Carvalho e Fernando Luiz Homann, e Johelson Pissaia, todos acusados de envolvimento com o que se convencionou chamar de ?máfia do apito?, foram absolvidos. Contra alguns deles havia mais de um testemunho incriminatório.
Nos casos de Salazar, Magno, Mafra, Sandro e Pissaia, aconteceu empate em quatro a quatro – resultado que beneficiava os réus. Livres, os nove acusados comemoram a chance de seguir prestando serviços à federação de Onaireves Moura.
Recurso
O procurador do TJD, Davis Bruel, falou logo após o julgamento que vai recorrer da decisão. Ele tem três dias para interpor recurso no Superior Tribunal de Justiça Desportiva da CBF (STJD). Em relação aos condenados, o presidente Bôrtolo Escorssin informou que o TJD terá que entrar com recurso obrigatório no tribunal nacional.
Julgamento está em xeque
Um erro de direito pode colocar em xeque o julgamento dos acusados no escândalo de corrupção na arbitragem. Segundo o procurador geral do STJD, Paulo Marcos Schmitt, o TJD do Paraná errou ao absolver os indiciados.
Dos 13 acusados, quatro foram condenados. Dos nove restantes, Antônio Salazar Moreno, Carlos Jack Rodrigues Magno, Johelsson Pissaia, Marcos Tadeu Mafra e Sandro da Rocha foram absolvidos com empate de 4 a 4 nos votos dos auditores. É justamente nestes casos que estaria o problema. ?Nesses casos vale o voto mais qualificado, que é o do presidente?, disse Schmitt à Tribuna. Bôrtolo Escorsin, presidente do TJD, votou pela condenação.
Schmitt se baseia no artigo 131 do CBJD: ?Nos casos de empate na votação, ao presidente é atribuído o voto de qualidade, salvo quando se tratar de imposição de pena disciplinar, casos em que prevalecerão os votos mais favoráveis ao denunciado, considerando-se a pena de multa mais branda do que a de suspensão?.
O dilema está em definir se o caso se enquadra ou não como pena disciplinar. Este foi o entendimento do TJD, contestado por Schmitt. ?Existe jurisprudência consolidada no STJD sobre o assunto. A decisão deveria ser pela condenação e não pela absolvição?, afirmou.