Senhor das ondas do rádio

Já imaginou ir a um estádio de futebol de olhos vendados? Ou comentar e repercutir profissionalmente uma partida sem tê-la assistido? Pois foi assim, superando as barreiras impostas pela deficiência visual, que o curitibano Henry Xavier ganhou espaço e respeito na profissão de radialista.

Trabalhar com o rádio esportivo era uma antiga meta do jovem de 26 anos, cego desde o nascimento e ouvinte da turma da ?latinha? desde a infância. Em 2001, Henry fez um curso de locução esportiva e bateu de porta em porta atrás de uma chance. Conseguiu o primeiro emprego na Rádio Educativa, através do experiente Cláudio Ribeiro, e depois passou pelas emissoras Colombo, Independência e Cultura. Em janeiro deste ano, concretizou o que considerava o ?maior sonho? da carreira ao ser convidado pelo coordenador de esportes Marcelo Ortiz para ingressar na Rádio Banda B.

Valquir Aureliano
Com o ?padrinho? Marcelo Ortiz. Tabelinha pra lá de eficiente.

Ortiz conta que o trabalho de Henry em outra emissora lhe havia chamado a atenção antes de saber da deficiência. ?Ele só foi contratado porque precisávamos de um bom plantão esportivo. Nenhum outro fator foi levado em conta?, falou.

Os meios de comunicação modernos facilitam a atual atividade de Henry. Plantonista de jornadas esportivas, ele é auxiliado por um programa de computador que transforma os textos da tela em voz. Assim, juntando as notícias capturadas pela internet ao que ouve no rádio e na TV, não deixa o ouvinte na mão. Quando precisa de um texto durante a apresentação de programas, utiliza o braile.

Mas nem sempre foi tão ?fácil?. Henry já exerceu funções muito mais exigentes, como reportagens especiais – fez a cobertura de alguns julgamentos do ?caso Bruxo?, por exemplo – e até matérias de campo. Nestes casos, ou quando vai ao estádio por conta própria – ele jura que não torce para nenhum time -, depende muito do desempenho do narrador. ?Quando a descrição do que ocorre em campo é detalhada, consigo imaginar o gramado e o posicionamento dos jogadores para fazer a imagem do jogo?, conta o radialista. Para entrevistar os jogadores ao final da partida, logicamente, conta com o auxílio do profissional do setor técnico.

A deficiência não serve de ?muleta? para o radialista, que se considera capacitado para exercer as mesmas tarefas dos colegas com visão normal. Uma postura que vem da infância – Henry preferiu concluir o 2.º grau no ensino regular em vez de ingressar em escolas especiais. ?Claro que meu trabalho fica mais difícil, mas é uma questão de adaptação. É bom para que todos os portadores de deficiência percebam que podem encarar o mundo?, ensina. O chefe confirma a força de vontade do novato. ?Ele não gosta quando tentam ajudá-lo só por pena. E é sempre bem-humorado. Quando foi descoberto que andavam navegando em sites pornográficos na rádio, logo avisou que não tinha sido ele?, diverte-se Ortiz.

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