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Sem passar por categorias de base, Keno vai da várzea ao estrelato no Palmeiras

Quando vai entrar em campo pelo Palmeiras, Keno se concentra no passado. O começo da carreira traz memórias dos tempos difíceis e o ajuda a ter tranquilidade. Agora, o atacante não precisa mais se preocupar com tiros, ameaças ou agressões, pois realizou o sonho de jogar em um grande clube, livre dos obstáculos da várzea, onde jogava até somente seis anos atrás.

Keno precisa de pouco tempo para se resolver. O jogador de 28 anos fala depressa, termina frases em poucos segundos e mudou de vida graças a 10 minutos. A carreira é meteórica. Até os 23 anos idade ele não era profissional e jogava apenas na várzea, na periferia da cidade natal, Salvador.

Categorias de base e escolinhas de futebol não fizeram parte da vida de Marcos da Silva França. Em entrevista ao Estado, Keno riu ao lembrar do começo complicado. “Comecei na várzea aos 17 anos. Jogava uns quatro ou cinco jogos todo fim de semana. Eu cobrava barato, né? Ainda não era jogador do Palmeiras. Por R$ 50 ou R$ 70 eu ia”, contou.

Entre a vida na várzea e o status de xodó da torcida do Palmeiras, o intervalo foi só de seis anos. Pouco tempo no calendário, mas bastante para quem mudou quase 10 vezes de clube e morou até no México depois de 10 minutos que transformaram a sua vida.

Keno jogava a segunda divisão do Campeonato Baiano de 2012 pelo Botafogo, de Salvador. Era a primeira sequência regular dele em time profissional. Famoso pelo futebol na várzea, o atacante se destacava na modesta equipe e levou um amigo, Marcos, a lhe indicar a um empresário: Edson Neto.

No primeiro momento, o agente duvidou ser vantajoso procurar um jogador da segunda divisão baiana para fechar contrato. Foram três meses de insistência de Marcos para o empresário um dia resolver, entre um compromisso e outro, entrar no estádio de Pituaçu, em Salvador, e ver em ação o tal Keno. Como estava com pressa, o plano era ficar só 10 minutos no local.

Por uma coincidência, Keno fez um gol e deu passe para outro. O empresário ficou impressionado e decidiu naquela noite ir à casa do atacante para propor parceria. Desconfiado, o egresso da várzea recusou. “Logo depois eu fui jogar em Marabá, no Pará. E não é que o empresário foi atrás de mim? Ele é muito persistente. Por isso, conversamos e acertamos”, contou o jogador.

A vida do atacante não ficou resolvida ainda. Por não ter jogado na base, sofreu preconceito de técnicos que não confiavam no seu potencial e penou com as dívidas. “Muitos desacreditaram de mim porque não fiz categorias de base. Um monte de clube não me pagou. Uma vez cheguei até a entrar no SPC. Estava com o aluguel atrasado da casa e me ameaçaram de despejo. Não tinha como fazer porque eu não recebia”, disse.

O sufoco foi superado de vez em 2016, novamente em um acontecimento rápido, ao estilo de Keno. O atacante se destacava pelo Santa Cruz e, ao final de um jogo contra o Palmeiras, no Recife, foi procurado por dirigentes do time alviverde. Com pouco tempo de conversa e R$ 3 milhões pagos, o atacante se mudou para São Paulo.

A conquista de espaço no Palmeiras não demorou. Semanas atrás Keno renovou contrato e ganhou aumento salarial. A camisa não lhe trouxe pressão. “Jogar na várzea me ajudou a não ter medo. Lá tinha soco, cuspiam na cara. Já aconteceu de eu ir em algum lugar e ter uns caras armados”, contou.

O atacante de jogadas e fintas velozes agora só visita os campos da várzea em Salvador nas férias. Com os salários em dia e sem mais problemas de aluguel, Keno tirou os pais da periferia e comprou um apartamento para os dois na capital baiana. Nas horas de folga em São Paulo, o palmeirense aproveita o filho Lucas, de um ano e meio, e se diverte com a torcida, que lhe chama de Kenaldinho. Apelido nobre para quem até pouco tempo jogava em troca de R$ 50.

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