Enquanto o levantador de peso olímpico Fernando Reis faz careta, tremendo de esforço com o peso nas mãos, um vendedor de balas encosta na janela da academia, uma que fica virada para a rua, e olha. Faz cara de admiração, levanta o polegar e vai embora, sem oferecer seu Freegels. “Aqui é uma vitrine. É difícil manter a concentração”, conforma-se o principal nome da modalidade nas Américas.

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Por falta de um centro de treinamento adequado, sete atletas da equipe brasileira de levantamento de peso que vai disputar os Jogos do Rio tiveram de treinar ao longo do mês de janeiro em uma academia aberta também para empresários, profissionais liberais e amantes do esporte em geral.

Neste sábado, após grande pressão e intervenção do Comitê Olímpico Brasileiro, eles viajaram para o Rio para – finalmente – treinar em um local adequado. “Os atletas precisam de confinamento”, explica o técnico cubano Luis Lopez.

Lopez diz que o treino no mês de janeiro rendeu cerca de 70% do que poderia por causa da dificuldade de concentração dos atletas. Mesmo aparelhada e especializada em levantamento de peso, a academia é privada, propriedade da própria família de Reis e, por isso, precisa de clientes. Ali, na rua movimentada da zona sul de São Paulo, o assédio não se resume aos vendedores. Os próprios alunos sempre param para pedir uma dica de alimentação ou treinamento. Volta e meia, alguém pedia uma selfie. O local se tornou um “Big Brother” dos pesistas – Fernando explica que halterofilista é um nome antigo e mais genérico.

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O problema começou quando o local onde o time treinou em 2015 fechou para reforma. É um CT localizado no Esporte Clube Pinheiros. Até aí, tudo bem. O clube havia informado que faria a reforma e a Confederação Brasileira de Levantamento de Peso prometeu um local para treinos a partir de dezembro no Rio de Janeiro. Dezembro passou, e o local não apareceu. Como plano B, o Pinheiros fez um acordo com a academia de Reis até que a situação se resolvesse. “Se não fosse o Fernando, não teríamos onde treinar”, afirma o atleta Mateus Gregório.

As versões para o atraso são distintas. Os atletas afirmam que a entidade adiou o prazo para depois do carnaval alegando “falta de recursos”. A confederação, por sua vez, diz que ofereceu dois lugares, mas eles não foram aceitos pela comissão técnica.

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O mês de improviso pode fazer tanta diferença na busca da medalha porque o levantamento de peso é diferente das outras modalidades. Os atletas precisam treinar agora, o mais forte que puderem, para descansar nas proximidades dos jogos. “Esse tempo perdido prejudica nossa preparação”, lamenta Fernando Reis.

CHANCES REAIS – Não é exagero falar em medalha. De acordo com a própria confederação, existe chance real de uma conquista inédita na modalidade. “Nossa vantagem é que não temos a pressão que o Cielo tem, por exemplo, a pressão de continuar no topo”, afirma Horácio Reis, pai de Fernando.

Bicampeão e recordista na categoria acima de 105 quilos nos Jogos Pan-Americanos, Fernando levantou 427 quilos em Toronto, no Canadá. Não, de uma vez, não. As competições são formadas por duas provas. Na primeira – o arremesso -, o competidor pode fazer o levantamento com dois movimentos até erguer o peso acima da cabeça. Na segunda, o peso tem de ser erguido de uma vez só. Esse é o arranco. Somando as duas provas, Fernando conseguiu os 427 quilos no Pan.

No Rio, ele acredita que a medalha será decidida em torno dos 440 quilos. Seus principais rivais são da Rússia, ameaçada por causa do escândalo do doping, Georgia e Estônia. “Nossa meta é uma medalha”, garante.

OUTRO LADO – A Confederação Brasileira de Levantamento de Peso (CBLP) nega ter sido a responsável pela falta de um Centro de Treinamento para os atletas da modalidade faltando menos de 200 dias para os Jogos do Rio 2016.

De acordo com a entidade, foram oferecidos aos atletas a Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal (APCEF), onde vários atletas da seleção treinam, e as instalações do Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes (CEFAN), que pertence à Marinha. Ambos são localizados no Rio de Janeiro. “Por decisão do técnico, acharam melhor não utilizar as instalações oferecidas”, explica Enrique Monteiro Dias, presidente da entidade.

Sobre a falta de recursos, motivo que teria causado o atraso, a entidade informa que recebe os recursos da Lei Agnelo Piva e do patrocínio da Petrobras, e que as atividades são planejadas de acordo com o orçamento disponível para o ano.

A equipe inicia a preparação final, que consistirá em três campings de treinamento e duas competições. O primeiro camping será realizado no Rio de Janeiro, entre 30 de janeiro a 4 de abril. O segundo será no Equador, no período de 1º a 31 de maio, e o terceiro (pré-games) de 1º de julho a 3 de agosto. As competições serão o Campeonato Sul-Americano (evento-teste), no período de 7 a 10 de abril, e o Campeonato Pan-Americano (Pré-Olímpico) na Colômbia, entre 2 e 10 de junho.

Mesmo com a polêmica na definição do CT, a entidade está otimista. “Nossas perspectivas são as melhores possíveis. Temos chance inédita de uma medalha olímpica com Fernando Reis, e os demais com uma melhora nas colocações e resultados pessoais”, afirma o presidente.