Às vésperas de completar 80 anos, Rubens Francisco Minelli não agüentou distância total dos gramados. Afastado da bola desde 2003, quando deixou o cargo de superintendente do Avaí, um dos técnicos mais importantes da história do futebol brasileiro voltou à ativa como comentarista de rádio.
Desde o começo do Brasileirão 2008, Minelli empresta todo seu conhecimento à Rádio Jovem Pan, de São Paulo. Mas com uma condição: prefere o sossego dos estúdios ao estresse de ir ao estádio e, eventualmente, topar com torcedores exaltados.
“Não vou mais ao campo nem quero seguir a carreira de comentarista. Mas é uma experiência agradável. Não há responsabilidade e dá pra trabalhar de sangue doce”, contou.
Minelli voltou na semana passada a Curitiba, cidade que conhece muito bem. Tricampeão brasileiro (com o Internacional em 1975 e 76 e o São Paulo em 77), ele treinou Paraná e Coritiba e foi gerente de futebol do Atlético, tudo nos anos 90s.
A passagem mais marcante foi no Tricolor, do qual foi o primeiro treinador da história e onde conquistou dois títulos estaduais (em 1994 e 97), além do acesso à Serie B em 1990.
Esbanjando saúde e com uma memória impressionante, Minelli foi entrevistado pelos radialistas Valmir Gomes e Marcelo Ortiz, da Rádio Banda B, na última segunda-feira.
Um pouco antes, contou à Tribuna algumas passagens marcantes de uma vida de 50 anos dedicados ao esporte, e comentou a situação atual do futebol paranaense e brasileiro.
Bola x Faculdade
“Comecei como jogador profissional no Ypiranga, de São Paulo (era ponta-esquerda). Depois passei por Nacional (SP), Palmeiras e Taubaté. Quando fui para o São Bento de Sorocaba, já fazia faculdade de economia. Então quebrei a perna durante um jogo, aos 27 anos, não me recuperei e decidi abandonar a carreira. Fiz os exames finais da faculdade com a perna engessada.”
Técnico por acaso
“Depois de largar o futebol, passei num concurso dos Correios. Já era chefe de sessão quando o (ex-jogador) Canhotinho me convidou para trabalhar nas divisões de base do Palmeiras. Como dava para conciliar com o emprego, aceitei. A coisa começou a ganhar corpo e veio o convite para treinar o profissional do América (SP). Pedi transferência para os Correios de São José do Rio Preto e segui com as duas carreiras.”
Ascensão
“Subi com o América para a 1.ª divisão paulista (em 1963) e fiquei mais três anos por lá. Então fui campeão pernambucano pelo Sport (em 1966) e depois campeão do interior paulista com o Guarani. Em 1969 veio a proposta do Palmeiras. Ganhamos o Robertão, que era o Campeonato Brasileiro da época. A partir daí, só treinei time grande.”
Humildade
“Numa excursão do Palmeiras pela Espanha, vencemos o torneio Ramon de Carranza e depois ganhamos por 2 x 0 do Barcelona, com dois gols do Ademir da Guia e um futebol maravilhoso. Um empresário me convidou para treinar o Barcelona. Mas fiquei intimidado com toda aquela estrutura. Falei que não estava preparado, que era meu primeiro ano num time grande.”
Seleção
“Dizer que não há uma ponta de mágoa (por nunca ter treinado a seleção) seria mentira. É o maior salto na carreira de um técnico. Talvez por ter outra ocupação e sempre manter postura independente, não era bem visto pelos dirigentes da CBF. Sabiam que eu não seria submisso e talvez a situação pudesse fugir ao controle deles.”
“O Paraná Clube foi marcante para mim. Primeiro porque foi fundado no dia do meu aniversário (19 de dezembro). E fui o primeiro técnico da história do clube. Era um grande desafio montar um elenco a partir de 63 atletas que eu não conhecia. Então montei uma estratégia: como quem não queria nada, perguntei aos jogadores do Colorado quem eram os bons do Pinheiros e vice-versa. Eles se revelaram bons informantes, pois ficaram realmente os melhores.”
Boca grande
“Em 1997, meu contrato com o Paraná acabou e ninguém me procurou. Achei que não teriam interesse em renovar e aceitei convite do Coritiba. Pedi sigilo, mas o Coxa não respeitou justamente para desestabilizar o adversário. Um dirigente paranista quis me demitir na reta final do campeonato. Os jogadores é que não deixaram. Fomos campeões e no dia seguinte me apresentei ao Coritiba.”
Febrafu
“Ganhamos aquele torneio com os times eliminados do Brasileirão (Festival Brasileiro de Futebol, em 1997), vencendo o Botafogo na final. Não era um campeonato relevante, mas o Coritiba vinha mal há alguns anos e o título elevou a auto-estima do torcedor. Mas no ano seguinte começou um entra-e-sai de jogadores e começou o desgaste. Só esperaram a oportunidade de me mandarem embora e saí depois de uma derrota para o Iraty num sábado de Carnaval.”
SOS Paraná
“Não posso falar do time atual porque não vi nenhum jogo da Série B. Ainda dá para recuperar, pois tem um turno inteiro pela frente. Mas sinceramente não vejo como o Paraná resgatar a hegemonia que tinha aos anos 90s. Na época havia vida própria por causa da parte social, era uma estrutura imensa. Mas hoje em dia as parcerias valem muito mais.”
Rusgas no Atlético
“O senhor Mário Celso Petraglia foi à minha casa e assinei contrato de três anos como superintendente de futebol, em 1998. Era algo diferente, que sempre sonhei fazer. Mas a prática não ocorreu conforme o combinado. Não tive o respaldo prometido e muitas rusgas entre diretores atrapalharam. O projeto durou só 100 dias.”
Sem espetáculo
“O futebol brasileiro está voltando àquela fase de poucos gols. Os jogadores se preocupam mais em cavar faltas do que em atacar. E os árbitros não ajudam, permitem o uso do cotovelo e aquele agarra-agarra em todos os momentos.”