Mais de oito meses após o incêndio no CT Ninho do Urubu que matou dez jovens jogadores do Flamengo, há quatro projetos que buscam evitar novas tragédias em centros de treinamentos em tramitação no Congresso Nacional. As propostas sugerem alterações na Lei 9.615, de 1998, conhecida como Lei Pelé.
O mais avançado é o Projeto de Lei (PL) 1153/2019, de autoria do senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB/PB). O projeto foi aprovado na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados em junho, mas ainda não tem data para ser analisado.
Algumas das mudanças na Lei Pelé que o projeto sugere são: instalações físicas certificadas pelos órgãos e autoridades competentes com relação à habitabilidade, à higiene, à salubridade e às medidas de prevenção e combate a incêndio e a desastres; assistência de monitor responsável durante todo o dia; e garantia de transporte adequado para ida e vinda de sua residência.
Em sua justificativa, o senador diz que “apesar de várias alterações sofridas pela Lei Pelé (Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998), nada impediu a tragédia com os atletas de base do Flamengo (…). Isso porque as mudanças por quais a Lei passou são, na maioria, sob a visão apenas mercantil do esporte. Raramente se pensa nos direitos dos atletas. Quanto aos atletas de base, a preocupação da Lei é, da mesma forma, a de garantir os direitos dos clubes formadores sobre seus atletas”.
Há outros três projetos que ainda aguardam inclusão na ordem do dia de requerimento em suas respectivas comissões do Senado. O PL 680/2019, do senador Romário (Podemos-RJ), determina que a CBF só poderá emitir o certificado de clube formador de atletas às equipes que apresentarem licença da prefeitura ou do Corpo de Bombeiros.
“A CBF é a principal entidade gestora do futebol, responsável por expedir o Certificado de Clube Formador, compete a ela zelar pela qualidade das instalações que recebem jovens jogadores. Por isso, o projeto prevê que a CBF só poderá expedir a tal certidão mediante o aval da prefeitura e do Corpo de Bombeiros Militar, que possuem técnicos gabaritados para avaliar as instalações que estão sendo disponibilizadas para os atletas em formação”, justifica Romário.
Outro PL que aguarda análise é o 718/2019, da senadora Leila Barros (PSB-DF), que propõe que as instalações dos clubes também sejam vistoriadas pelo Conselho Tutelar e pelo Ministério Público do Trabalho. Um trecho da justificativa diz: “a legislação é omissa com relação a qual órgão vai fiscalizar se o clube está cumprindo todas as exigências”.
Já PL 1.350/2019, da senadora Rose de Freitas (Podemos/ES), sugere que a CBF suspenda a certificação do clube formador quando for constatada a ausência de alvarás e laudos de vistoria ou condições de insalubridade, falta de segurança ou higiene nesses espaços. “Este projeto de lei pretende dar maiores garantias aos atletas de base, tornando mais rigoroso o requisito sobre manutenção dos alojamentos e instalações das entidades formadoras de atletas”, diz trecho da justificação.
Os três projetos ainda aguardam análise. Leila Barros, que é relatora na Comissão de Direitos Humanos (CDH), apresentou requerimento para que os projetos fossem analisados em conjunto, já que tratam sobre o mesmo tema.
INDENIZAÇÕES – O Flamengo firmou acordo com familiares de quatro das dez vítimas do incêndio. Os valores das indenizações não foram divulgados por causa de uma cláusula de confidencialidade.
Os acordos foram assinados com parentes de Vitor Isaías, Athila Paixão e Gedson Santos. No caso de Rykelmo Souza, o Flamengo fechou acordo com o pai do garoto, mas não com a mãe, que já entrou com um processo judicial.
Como o Estado mostrou em agosto, as famílias dos garotos reclamam de omissão do Flamengo. Elas divergem quanto à possibilidade de um acordo. Algumas estão otimistas em resolver a situação sem ir à Justiça, outros não enxergam dessa forma.
Em fevereiro, Defensoria Pública do Rio, Ministério Público Estadual e Ministério Público do Trabalho chamaram o Flamengo para costurar um acordo. No entanto, o clube, que paga ajuda mensal de R$ 5 mil às famílias, não concordou com a proposta apresentada pelos órgãos na ação coletiva e passou a negociar individualmente, de modo que, estabelecendo um parâmetro de indenização com uma das famílias, se fortaleceu para não negociar valores superiores com as demais.
Há uma ação que pede o bloqueio de R$ 57 milhões das contas do Flamengo, mas a Justiça ainda não deu resposta. Um dos motivos para que as negociações não avancem é a espera pela resolução do inquérito da Polícia Civil que investiga os responsáveis pelo incêndio no CT do Flamengo.