Quanto custa uma medalha olímpica? No caso do polo aquático, ao menos R$ 2,6 milhões. É este valor que a Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA) vai pagar, até a Olimpíada, para três atletas que aceitaram se naturalizar para defender a seleção. Documentos obtidos pela reportagem mostram que, desde março do ano passado, 14 meses antes de se tornar cidadão brasileiro, o goleiro sérvio Slobodan Soro recebe R$ 18.746 mensais líquidos em uma conta do Banco do Brasil. Ele nunca jogou uma partida oficial pelo Brasil.

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Questionado, o presidente da CBDA, Coaracy Nunes, confirmou que Soro recebe “por volta de R$ 20 mil” por um contrato que o “obriga” a jogar pelo Brasil até a Olimpíada. Seu salário bruto é de cerca de R$ 25 mil. Em janeiro de 2014, quando o contrato foi assinado, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) recomendava, em sua tabela normativa, que as confederações associadas pagassem salários de no máximo R$ 11 mil a atletas.

Mandatário dos esportes aquáticos desde 1988, Coaracy afirma que o central croata Josip Vrlic e o atacante espanhol Felipe Perrone têm o mesmo salário, e que os valores são pagos pelos Correios. Somados, os três atletas consumiriam R$ 975 mil dos R$ 2,5 milhões anuais que o patrocinador estatal repassa à CBDA pelo Programa de Patrocínio Individual de cinco modalidades, que juntas vão levar 80 atletas ao Pan. Questionados, os Correios alegam que a CBDA tem total autonomia para definir como será a distribuição dos recursos.

Soro, Vrlic e Perrone, assim, seriam os atletas mais bem pagos com recursos públicos para defenderem o Brasil. No atletismo e na maioria das demais modalidades, quem tem direito ao teto da Bolsa Pódio (R$ 15 mil) não recebe do patrocinador estatal da confederação. No judô, os subsídios são somados, mas não chegam a R$ 25 mil para ninguém.

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ATLETAS – Perrone nasceu no Rio, chegou a defender a seleção brasileira nos Jogos Pan-Americanos de 2003, mas optou pela cidadania espanhola, obtida por intermédio de uma avó. Com a touca da Espanha, tornou-se um dos melhores do mundo. Em 2013, foi procurado pela CBDA para voltar a defender o Brasil. Dono da casa, o País tem vaga garantida nos Jogos Olímpicos do Rio, retornando ao torneio após 32 anos.

O atacante, que atualmente defende o Barceloneta, da Espanha, colocou duas condições para o seu retorno. Uma, financeira. Outra, técnica. Queria uma equipe com condições de disputar medalha. Para tanto, sugeriu que a naturalização de dois amigos: Vrlic, que nunca jogou pela Croácia, e o duas vezes medalhista olímpico Soro, aposentado da seleção sérvia. O COB ajudou contratando o melhor técnico de todos os tempos, o croata Rakto Rudic.

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Após mais de quatro meses de negociações, os contratos entre a CBDA e os três atletas foram assinados em janeiro de 2014, quando eles faziam parte do elenco do Fluminense. À época, a equipe do Rio contava com o patrocínio do BNY Mellon, acertado por intermédio de Kiko Perrone, irmão de Felipe e também ex-jogador da seleção espanhola. Em meados do ano, o banco retirou o investimento e o time foi desmontado. Os três voltaram para a Europa, passando a não se apresentar em convocações para treinos da seleção no País.

A permanência definitiva no Brasil só foi autorizada em julho, seis meses após a assinatura do contrato. No pedido enviado por Coaracy ao Conselho Nacional de Imigração, ele argumentou que “o polo aquático sempre sofreu com a carência de atletas e de tradição (no Brasil)”. “A CBDA necessita da permanência definitiva dos atletas, com vistas a um futuro processo de naturalização e participação na Olimpíada.”

A Lei do Imigrante exige que um naturalizando comprove residência no País há quatro anos, mas o prazo pode cair para um ano se o ministro da Justiça entender que o candidato pode prestar “serviços relevantes ao Brasil”. Com apoio formal do COB perante o Ministério da Justiça, a CBDA conseguiu as naturalizações em 16 de abril.

Com o certificado de naturalização em mãos, Vrlic foi liberado para defender a seleção brasileira na Superfinal da Liga Mundial, na Itália, e nos Jogos Pan-Americanos, em Toronto. A Federação Internacional de Natação (Fina), entretanto, barrou a naturalização esportiva de Soro, pois não se convenceu de que ele mora há um ano no Brasil. Afinal, o goleiro defende o Partizan Belgrado, da Sérvia.

Coaracy alega que a naturalização é “normal” e argumenta que os críticos da ação torcem contra o Brasil. “É absolutamente natural, todos os países que realizaram Olimpíada fizeram isso. Tivemos que trazer até o Felipe (Perrone). Não vejo nenhum pecado nisso. Qual é o problema nisso?”.

O pagamento aos três atletas, entretanto, não é a única ação para tentar fazer o Brasil medalhista no polo aquático no Rio. O COB se disponibilizou a pagar moradia, alimentação e transporte para a seleção brasileira disputar, como clube, a próxima edição da Liga Adriática, torneio interclubes mais forte do mundo. O projeto, entretanto, deve naufragar porque a CBDA tem encontrado dificuldades para pagar a inscrição na Liga, estimada em R$ 100 mil. A entidade não confirma a informação apurada pela reportagem.

A participação na Liga Adriática não faz parte do convênio de cerca de R$ 5,3 milhões, ofertados pelo Ministério do Esporte, para bancar estágios de treinamento e participação das seleções masculina e feminina em competições em 2015 e 2016.

A reportagem não conseguiu falar com Perrone e Vrlic, que estão disputando a Superfinal da Liga Mundial, na Itália. A reportagem tenta contato com Soro há pelo menos um mês, sem sucesso.