Em uma das últimas entrevistas como técnico da seleção brasileira – a última em solo alemão -, Carlos Alberto Parreira admitiu ontem que quase tudo deu errado na Alemanha. O esquema tático não funcionou, os jogadores mais talentosos não brilharam e, no jogo mais difícil, o placar foi negativo. Por isso, pediu aos brasileiros que não iniciem "caça às bruxas". Não houve apenas um ou dois culpados, justificou. "O futebol é trabalho em equipe."
Acompanhado do supervisor Américo Faria e do coordenador Mário Jorge Lobo Zagallo, o treinador era a imagem da desolação, da decepção, da tristeza, durante a entrevista no hotel em que a delegação estava hospedada. Não imaginava cair tão cedo. "Minha noite foi frustrante.?
E disse em alto e bom som que quer descanso do futebol. Vai assistir às partidas finais do Mundial, pela televisão, no Rio, onde vive com a família, e depois pretende sumir do mapa esportivo.
"Vou desacelerar, esquecer futebol e ficar com a minha família."
O "esquecer futebol" significa, também, distância da seleção. Embora diga que só vai decidir no Brasil seu futuro, ao lado do presidente da CBF, Ricardo Teixeira, é certo que deixará o comando do time. Está cansado e ficou desgastado junto à direção da entidade após fraca participação na Copa. Teixeira, que costuma ouvir a opinião pública para decidir técnicos da seleção, já optou pela saída de Parreira, bastante xingado pelos torcedores no Waldstadion, anteontem, em Frankfurt.
Os nomes mais cotados para substituí-lo são os de Paulo Autuori, Vanderlei Luxemburgo e Luiz Felipe Scolari.
O técnico brasileiro embarcou no fim da noite de ontem, no aeroporto de Frankfurt, para o Rio, acompanhado de alguns jogadores. À tarde, abatido, conversou com a imprensa e respondeu a todas as perguntas de forma paciente e educada. Confira trechos da entrevista.
A decepção
"É hora de lamber as feridas. A história do futebol brasileiro é muito rica. Poderíamos ter jogado mais do que jogamos, mas não foi um desastre. Nesta Copa, jogamos cinco partidas e perdemos apenas uma.
Mas perdemos uma que não podíamos perder. Foi 1 a 0, o suficiente para sairmos da competição. Ficamos muito tristes, tanto quanto qualquer torcedor. Fui dormir muito frustrado. Estava em estado de choque no sábado. Mas não vamos iniciar caça às bruxas.
O Brasil vai voltar a brilhar."
Arrependimentos?
"Não podemos terminar a Copa com arrependimentos. Fizemos tudo o que achamos que deveríamos fazer. Mas, infelizmente, tivemos pouco tempo para nos prepararmos. Fizemos poucos amistosos. Desde outubro (até o início da preparação para o Mundial), houve apenas um, em Moscou. Na preparação, preferimos dar prioridade ao treinamento. Alguns jogadores não chegaram bem fisicamente. Nós tínhamos de escolher: treinar ou jogar."
Futuro
"O Ricardo (Teixeira, presidente da CBF), como membro da Fifa, ficará na Alemanha para ver o fim da Copa. Depois, quando voltar ao Brasil, vamos sentar, conversar e definir o futuro. Assim que tivermos uma decisão, vocês (jornalistas) ficarão sabendo."
O mau futebol dos astros e do time.
"É difícil explicar por que eles (atletas) não jogaram. Nós ficamos devendo. Mas não é hora de fazer caça às bruxas.
A expectativa em relação ao time era muito grande. E, depois, as pessoas cobraram pela expectativa criada, não pela realidade."
O fracasso de Ronaldinho
"O Ronaldinho chegou cercado de grande expectativa. É difícil falar de algo que não é concreto, não dá para dizer se ele sentiu a pressão ou não. Não podemos estigmatizar o jogador. Lembrem-se do que aconteceu com o Dunga em 1990. Tivemos que recuperá-lo em 1994. Ronaldinho não é o melhor do mundo por acaso. Não é porque não rendeu o esperado que deixou de ser excelente. Vamos precisar muito dele no futuro."
Por que não tirar Ronaldinho?
"Eu poderia ter tirado o Ronaldinho do time. Mas será que quem entrasse iria resolver? Não é fácil entrar num jogo de Copa do Mundo.
O Cicinho entrou no lugar do Cafu, mas, coitado… Pensávamos que o time poderia melhorar, mas ficou a mesma coisa "Da vitória de 94 para a derrota de 2006 .
"Não me preocupo (em ter arriscado a reputação e voltado a dirigir a seleção depois da vitória de 94). Não ia falar isso, mas, como você (repórter) me perguntou, vou dizer.
Na minha carreira, foram quase 120 jogos pela seleção brasileira. Sou o técnico que mais vezes dirigiu a seleção. Ganhei um título mundial, e isso ninguém me tira. Sou o que mais participou de Copas do Mundo. E sou o segundo,
só atrás do (alemão) Helmut Schön que mais vezes trabalhou como técnico em partidas de Copa (20 vezes)."
