É Série A!

Paraná Clube e uma temporada inesquecível

A festa paranista tomou conta de Curitiba no domingo. Foto: Albari Rosa

SELO TAMO JUNTO PARANÁ CLUBEQuando Renatinho marcou o primeiro gol da vitória sobre o Avaí pela Primeira Liga, lá no dia 25 de janeiro, muitos poderiam sonhar, mas nem tantos acreditavam que aquele time recheado de garotos e construído à base de muita busca por jogadores baratos e de potencial estaria ontem tomando conta de Curitiba com uma festa pela volta à primeira divisão. O Paraná Clube construiu em 2017 uma das páginas mais emocionantes de sua história. Uma trajetória com sustos, vitórias, derrotas, crises e com um choro incontido de felicidade após a vitória do sábado sobre o CRB.

Nada foi conquistado com facilidade. Até parecia que seria tudo bonito. Vitória com golaços no primeiro jogo do ano, goleada com direito a lambreta de Ítalo na estreia do Paranaense… Mas havia uma longa caminhada. Caminhada que começou com Wagner Lopes. Junto com Rodrigo Pastana, o diretor de futebol do Tricolor, o treinador moldou esse time. Muito do que se viu na incrível arrancada do segundo turno da Série B estava lá, nas primeiras partidas do ano. Um vencedor sem faixa e distante, Wagner foi muito citado nos últimos dias. E com justiça.

A melhor campanha da primeira fase do Campeonato Paranaense veio junto com a classificação para as quartas de final da Primeira Liga e as primeiras vitórias na Copa do Brasil. Corria tudo bem, time e comissão técnica se entendendo, resultados vindo. Mas aí uma falha nas quartas de final do Paranaense fizeram com que a equipe fosse eliminada pelo Atlético. A jovem equipe paranista era derrotada pelos experientes do Furacão. O que fazer? Seguir na luta.

Pés no chão

Não havia muitas opções ao Tricolor em 2017. As finanças estavam no limite, fruto de anos de administrações temerárias. Oficiais de Justiça batiam constantemente à porta, eram ações a perder de vista. Por isso a decisão em montar um time barato. “Metade do salário do Fred paga a nossa folha”, resumia o presidente Leonardo Oliveira em maio, quando o Paraná encarou o Atlético-MG na Copa do Brasil. Então, mesmo com a decepção, o trem não sairia dos trilhos.

Wagner Lopes jogou todo o favoritismo do jogo para o ASA. Foto: Giuliano Gomes
Wagner Lopes, um personagem fundamental. Foto: Giuliano Gomes

Até porque começaram a vir os grandes momentos. Uma série de partidas incríveis pela Copa do Brasil fizeram o torcedor se apaixonar pelo time de meninos. A classificação nos pênaltis sobre o ASA, a emocionante vitória sobre o Vitória em Salvador, o triunfo contundente sobre o Bahia, a virada sobre o Atlético-MG no Couto Pereira… Nesses jogos, surgia outro grande personagem: Guilherme Biteco, que fez muita gente chorar ao dedicar seus gols ao irmão Matheus, que morreu há quase um ano no acidente do voo da Chapecoense.

Além dele, havia Renatinho, Eduardo Brock, Gabriel Dias. E Léo e Alex Santana. E Wagner Lopes. Mas o técnico não teve como ficar, recebeu uma proposta salarial irrecusável do Japão e se foi. Alex Santana foi recrutado pelo Internacional, pediu para voltar ao Tricolor, mas não foi atendido. E Léo, o destaque principal da equipe no primeiro semestre junto com Renatinho, deixou o clube após a eliminação na Copa do Brasil, indo para o Atlético.

E agora? No banco já estava Cristian de Souza, treinador que não se adaptou na primeira grande chance que teve na carreira e foi demitido no meio da Série B. No gol, surgiu Richard, que se agigantou e virou um dos heróis do acesso. No meio, a afirmação de Leandro Vilela, hoje a principal revelação do time. E ainda vieram Cristovam, Iago Maidana, Alemão, os três fundamentais na campanha da Segundona.

“Doido”

Mas o time demorou a engrenar. Faltava alguma coisa para a arrancada. E havia naquele momento, final do primeiro turno, a certeza de que o Paraná tinha time para subir. Veio então uma figura ímpar desta história. Luiz Carlos de Lorenzi, Lisca. Lisca Doido para os íntimos. Chegou e incendiou o vestiário. E o time incendiou a torcida. E mesmo as lesões (Vitor Feijão no início do ano, depois Biteco, mais tarde Minho) não impediram a arrancada.

As vitórias levaram o Tricolor para a parte de cima da tabela e para a semifinal da Primeira Liga, após a noite histórica de Richard na decisão por pênaltis contra o Flamengo. Só que aí quase que o caldo entornou. Numa história até hoje não explicada direito, Lisca quis sair no tapa com membros da comissão técnica e foi demitido a nove horas da partida contra o Atlético-MG, que valia vaga na final da Liga.

A derrota não abalou o time, já sob comando de Matheus Costa. Aos 30 anos, estudioso, com passagens por Internacional, Coritiba e Atlético, Matheus é paranista. De ir na Curva Norte. Sob seus ombros recaiu a responsabilidade de manter o time em alta. Ele e os jogadores, que fecharam com o técnico, partiram para os grandes momentos da Série B. Veio a apoteose, a vitória sobre o Internacional com mais de 40 mil pessoas, batendo o recorde de público da Arena da Baixada.

Torcida do Paraná Clube deixou a Arena azul, vermelha e branca. Foto: Albari Rosa
Vitória sobre o Inter e recorde de público na Arena. Foto: Albari Rosa

Parecia de novo tudo encaminhado. O acesso estava logo ali. Mas não seria fácil. No primeiro “jogo do acesso”, derrota em casa (a segunda apenas no ano) para o Oeste. Um balde de água gelada que não foi assimilado rapidamente. No segundo “jogo do acesso”, um empate assustador com o rebaixado Santa Cruz, que quase não entrou em campo. O Londrina encostava, a pressão aumentava.

Conquista

Veio o terceiro “jogo do acesso”. Em Maceió, contra o CRB. A partida estava nas mãos do Paraná, mas a sensação de que algum susto poderia acontecer era constante. Os sinais externos eram positivos – o Oeste perdia, o Londrina bombardeava o América-MG mas não marcava. Faltava a explosão. E ela veio numa arrancada de Alemão e no gol contra de Audálio. Um a zero. Resultado suficiente para o acesso.

Por minutos que demoraram 10 anos para passar, o Paraná Clube segurou o resultado. E venceu um jogo que valeu pelo passado, pelo presente e pelo futuro. O Tricolor está de volta à primeira divisão. Símbolos? Há vários: Renatinho, o craque; Richard, o iluminado; Gabriel Dias, o raçudo; Iago Maidana, a explosão; Eduardo Brock, o líder; Biteco, a emoção; Cristovam, o dedicado; Marcos, o maior de todos; Matheus Costa, que segurou a bronca; Rodrigo Pastana, que montou o elenco; o presidente Leonardo Oliveira, tão torcedor quanto qualquer outro, mas que teve o mérito de enfim colocar o clube com os pés no chão.

Mas não há símbolo maior do que o torcedor do Paraná. Aquele que encarou tardes de frio no Pinheirão. O que foi nas sextas danadas de inverno às 21h30. O que aguentou até chuva naquelas partidas que não valiam nada. As crianças que estão conhecendo o orgulho de ser tricolor. Quem dá um bico na tristeza, na doença e no medo para ir ao estádio seja como for. Para estes e todos os paranistas, a nossa saudação.

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