A judoca Jhulia Bernardino Soares acorda às seis da manhã, sai de Parelheiros, pega dois ônibus e só duas horas depois entra no tatame para treinar. No caminho, ela cochila bastante e sonha com uma das vagas nos Jogos de Tóquio. A atleta de 17 anos da categoria até 70 quilos treina no Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa (COTP), um dos poucos espaços públicos – leia-se gratuitos – voltados para o esporte de alto rendimento no País.

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Gerido pela Secretaria de Esportes e Lazer da Prefeitura de São Paulo, o centro investe entre R$ 800 a R$ 1.000 por mês na formação de atletas como Jhulia. Dá auxílio transporte, lanche elaborado por nutricionista, atendimento médico e fisioterápico e o treinamento com especialistas em dez modalidades (boxe, futebol, ginástica artística, handebol, judô, luta olímpica, natação, atletismo, basquete e vôlei). Hoje, o centro atende 1.023 atletas e não cobra nada deles. “Se fosse tirar do meu bolso, não teria condições de me manter lá por tantos anos”, diz a lutadora que treina lá desde os 12 anos.

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Para o coordenador Ismar Cardoso, os R$ 800 são suficientes para oferecer tudo o que um atleta precisa. “Esse também é um espaço de formação de cidadãos”, ressalta.

Quinze competidores formados no COTP disputaram os Jogos Olímpicos do Rio, entre eles, o oposto Wallace, medalha de ouro no vôlei masculino. No futebol feminino, que terminou em quarto lugar, praticamente meio time treinou naqueles campos.

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O centro também participou dos Jogos no atletismo com Leticia Cherpe; no boxe, com Joedison Teixeira de Jesus, Juan Nogueira e Andreia Bandeira; no judô, com Maria Portela e até na luta olímpica com Aline Silva e Eduard Soghomonyan. Além disso, os supervisores técnicos Victor Fernandes (atletismo) e Lucimar Medeiros (luta olímpica) integraram as comissões técnicas de suas modalidades.

RARIDADE – As atividades do Centro Olímpico são relevantes porque a formação de atletas de alto rendimento em locais públicos é uma raridade no Brasil. Pesquisa conduzida pela Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP), realizada entre 2014 e 2015, apontou um cenário considerado insatisfatório em relação às políticas públicas para o esporte. Os pesquisadores percorreram dez estados para cruzar informações sobre a participação de atletas na Olimpíada de 2012 (Londres) e o orçamento dos governos locais destinados ao esporte. “Em termos municipais, só a cidade de São Paulo tem programas sistematizados de formação de atletas. Existem poucas exceções no País”, diz Maria Tereza Silveira Böhme, professora e coordenadora da pesquisa.

O Centro Olímpico é o território onde nascem atletas. Por volta dos 13, 14 anos, eles ainda gaguejam nas respostas e travam diante das câmeras. São obrigados a fazer caber nos corpos mirrados, ainda rascunhos de campeões, a exigência e a disciplina dos treinamentos diários juntamente com as futilidades naturais que fazem parte da adolescência.

A corredora Aylana Ferreira Cézar ficou tensa ao contar sua história para o Estado. Volta e meia olhava para a mãe, Adriana, em busca de socorro na hora da entrevista. No ano passado, ela saiu de Maresias, litoral norte de São Paulo, para morar com a avó na capital e ficar mais perto do local de treinamento. Aluna do oitavo ano do colégio Madre Cabrini, na Vila Mariana, é uma das velocistas mais promissoras de sua geração nos 800m e 1.000m. “Primeiramente, quero disputar o Brasileiro sub-16. Depois, começar a pensar maior e a conquistar os índices. Quero disputar uma Olimpíada”, diz a fã do tricampeão olímpico Usain Bolt.

Graziela, mãe de Gustavo Rua, explica orgulhosa que o filho já vive do boxe. Com patrocinadores de peso, entre eles, a Everlast Brasil, além do acompanhamento de nutricionista e psicólogo, o lutador de 14 anos já fala como atleta. Campeão paulista por duas federações diferentes na categoria até 57 quilos, ele vai disputar seu primeiro torneio nacional neste ano. Já tem até um nome de boxeador: Guga Rua.

“Eu estarei na Olimpíada de 2020. Eu sei que preciso dormir cedo, treinar duas vezes por dia, deixar de lado a vida de adolescente, mas vai valer a pena.”

Com as frases bem feitas, com começo, meio e fim, Daniela Gonçalves quer jogar basquete, no Brasil ou no exterior. Nos dias de folga dos treinos, ela adianta as lições do nono ano da escola Projeto Vida, na Casa Verde. “A gente tem de organizar o tempo para poder sonhar.”

OUTROS CENTROS – O Centro de Treinamento de São Paulo não é o único no País. Com previsão de inauguração em 2013, o Centro de Formação Olímpica do Nordeste, em Fortaleza, ainda não foi entregue. Está na fase de acabamento das obras. A missão de formar atletas de alto rendimento e receber competições está sendo cumprida parcialmente.

Há duas semanas, foi palco do UFC Fortaleza com a luta entre Vitor Belfort e Kelvin Gastelum. Semana passada, o local de 45.117,87 m² recebeu o Cearense Juvenil e o Festival Cearense de Atletismo. “O espaço ainda não é utilizado de maneira maciça”, diz Jerry Welton, presidente da Federação de Atletismo.

Em Manaus, a Escola de Iniciação Esportiva é um dos principais projetos da secretaria de Esportes do Governo. Hoje, o local recebe delegações de vários países para competições e intercâmbios, como a equipe de luta olímpica da Venezuela e Argentina, além dos cursos de formação.

O secretário Fabricio Lima não sabe precisar quantos atletas fazem os treinos divididos em dez modalidades. “O número varia muito”, justifica. A piscina, no entanto, está fechada e o centro de fisioterapia passa por reformas.