Os recentes episódios de violência nos estádios do futebol brasileiro colocaram em xeque a importância das torcidas organizadas no Brasil. Na contramão da tentativa de elitizar o futebol brasileiro, as facções organizadas já fazem parte da cultura e do contexto do país do futebol. No cenário atual do Brasil, enquanto alguns clubes preferem manter distância dos grupos, a maioria prefere se aliar e fornecer benefícios para as suas principais organizadas, deixando de lado os riscos e aumentando a sua popularidade entre os torcedores em geral.
O historiador da Unicamp, Vitor Canale, que desenvolveu um estudo sobre torcidas organizadas, condena a aliança de diretorias de clubes com torcidas organizadas. “Esse clientelismo da diretoria de clube com torcida é nefasto. Isso só faz mal para a torcida, mas podemos entender porque é feito. Oferecendo mais benefícios, o presidente consegue fazer uma média com os torcedores, ao mesmo que a torcida, que deveria ser um órgão independente, deixará de cobrar o clube e fazer reivindicações”, explicou.
Canale citou como exemplo a independência criada com a Gaviões da Fiel e o Corinthians desde a sua existência, quando a facção recusou receber benefícios do time paulista. “É um exemplo muito interessante. No início da Gaviões, a diretoria do Corinthians queria que eles fossem uma torcida institucional do clube, com sala no clube, dando ingressos e outros benefícios. Essa possibilidade foi negada, pois a torcida acreditou que tinha que ser um órgão independente para buscar cobrar e fazer melhorias no clube”, detalhou.
O historiador da Unicamp acredita que a violência nos estádios e que trazem grandes prejuízos aos clubes está ligada diretamente a este relacionamento de cumplicidade entre as diretorias e as torcidas organizadas. “Atualmente, a violência que é um lado negativo para os clubes, acabam sem apuração por causa dessa relação entre as torcidas e as diretorias. É preciso mudar um pouco isso”, acrescentou Canale.
Defesa
Apesar de ser crítico ao relacionamento estreito de alguns clubes com as suas torcidas organizadas, Vitor Canale é totalmente favorável à existência das facções, que para ele preserva o futebol como espaço de cultura popular no Brasil. “A existência só não é saudável como é fundamental, principalmente pela perspectiva que o futebol defende com a sua cultura popular. A torcida organizada é a única representante nesta luta pela manutenção dessa cultura contra a elitização do futebol brasileiro”, cravou o historiador.
Canale reforçou que as torcidas organizadas podem ser uma tentativa de uma atuação política dentro dos clubes e que o projeto de modernização do futebol brasileiro está fazendo com que o futebol brasileiro deixe de ser popular. “Hoje em dia não existe mais ingressos que custem menos de R$ 40 na Primeira Divisão. Aos poucos, o futebol está deixando de ser popular”, concluiu.
Bom Senso F.C.
O Bom Senso FC, formado por jogadores e que desde o ano passado luta por melhorias no futebol brasileiro, se posicionou de maneira genérica quanto à atuação das torcidas organizadas no Brasil. Neste ano, o grupo tentou, junto ao Ministério Público, impedir que os quatro grandes clubes de São Paulo financiem e distribuam ingressos para as suas principais facções.