José Neto faz nesta sexta-feira a sua primeira convocação como técnico da seleção feminina. A lista para os Jogos Pan-Americanos de Lima terá jogadoras experientes, como Érika, e promessas, como Stephanie Soares. O foco está no futuro, mas sem abrir mão do presente. Em entrevista ao Estado, o treinador, multicampeão no masculino pelo Flamengo, revela os planos para os próximos anos. Confira a conversa com o treinador:
O que você já fez neste primeiro mês de trabalho?
Fui anunciado em maio, mas desde fevereiro, estou conversando com pessoas envolvidas com o basquete feminino para entender o terreno em que vou agir. Depois, passei a ver mais jogos, ir aos ginásios, conversei com jogadoras e também com técnicos. Temos de alinhar tudo para facilitar para o trabalho na seleção. Procurei mapear jogadoras, não só para os torneios que vamos disputar no curto prazo, mas jovens que serão utilizadas no longo prazo. Temos de fazer isso para ter o resultado lá na frente.
Como vai funcionar sua metodologia, a base estará inserida?
Não tem como ter um trabalho de excelência sem pensar na base. É como colher o fruto de uma árvore que não tenha raiz. Estamos pensando em toda uma estrutura, mas existem coisas mais emergenciais. A seleção adulta é onde podemos agir imediatamente. Depois vamos procurar, juntamente com uma equipe, visitar todos os clubes, para entender o que eles estão fazendo e implementar uma nova metodologia. E não é uma metodologia do Neto. É uma metodologia para o basquete brasileiro. Não adianta chegar com uma metodologia que vi na Europa, EUA ou Austrália. Aqui é uma outra realidade. Não tenho nenhum título no feminino, tenho de respeitar quem já fez algo pela modalidade. Preciso conhecer mais o feminino antes de implementar a metodologia de uma maneira completa.
A implementação vai além da quadra?
Prioritariamente é dentro de quadra, no jeito de jogar. Mas para que isso aconteça temos de mexer na estrutura. Não adianta apenas ter uma liga melhor. Os clubes precisam melhorar, os técnicos precisam melhorar, temos de buscar um investimento maior. O foco agora está em quadra, mas, aos poucos, temos de criar esta cultura fora dela, para conseguir ter um trabalho de excelência.
Você acredita que terá de se adaptar ao feminino?
Vou colocar o meu jeito de trabalhar, mas o desafio é como eu vou fazer isso. Existe uma diferença na própria cultura do basquete feminino. Qualquer área é assim. Você precisa estar lá para saber como será. Mas estou confiante, até porque estarei cercado de pessoas que vão me ajudar em como fazer. O que temos de fazer nós já sabemos.
Quem são estas pessoas?
A Adriana (Santos) já está trabalhando (como coordenadora). Ela tem uma raiz muito forte no basquete, é vencedora (campeã do mundo e duas vezes medalhista olímpica). É isso é fundamental. Temos de ter esta fome de vitória. Ganhar e perder não é a mesma coisa. Chamei o Cristiano Cedra, que é um técnico que conhece o basquete de base. O Virgil Lopez, que já dirigiu o time sub-16 recentemente (na Copa América) atendendo pedido que fiz. É um treinador que trabalhou em Americana, no Sampaio Corrêa, na França, ou seja, ele tem o conhecimento deste basquete internacional. Temos o João Camargo, que já estava na seleção (como auxiliar) e é um técnico da liga, que pode agregar muito. Também trouxe o Diego Falcão, que será o preparador físico, porque atualmente este aspecto é fundamental.
O que pensa para o Pan de Lima, sua primeira competição?
Se quero colocar uma mentalidade vencedora, que ganhar e perder não é a mesma coisa, não posso responder que vou ao Pan para participar. Tenho de pensar no melhor resultado possível. Se vamos ganhar uma medalha, é uma outra situação. Temos de ver o tempo de treinamento, a adaptação das jogadoras, a minha adaptação. É uma competição de tiro curto. Temos de ir com o pensamento de ganhar uma medalha. Apenas participar não serve mais para a seleção. Não adianta sonhar com uma medalha olímpica em Paris, em 2024, e não fazer nada agora.
Paris? E Tóquio, em 2020?
Falei 2024, mas não sei se vou estar lá. Quero estar, mas o que mais conta é alguém colher no futuro o trabalho que vamos realizar agora. É difícil uma vaga para Tóquio? Muito difícil. Mas não foi por isso que não citei. Só acho que é uma competição injusta porque vamos enfrentar seleções que estão trabalhando há quatro anos e estamos no começo.
Qual análise faz do nível do basquete praticado no Brasil?
Está longe do cenário internacional. Temos de olhar para Espanha, França, WNBA. Temos de buscar se aproximar no aspecto técnico, tático e físico. Todos precisam trabalhar em prol desta mudança, treinadores, clubes, dirigentes, federações… Não podemos depender de um talento que possa surgir. O trabalho te permite ser competitivo, te permite potencializar um talento. Você precisa criar ferramentas, como uma escola de técnicos, massificar o esporte nas escolas, é uma questão ampla. Se eu acredito? Acredito, sou um eterno otimista.
O convite te surpreendeu?
Eles (da CBB) me ligaram e marcaram uma reunião, sem adiantar o assunto. Pensei mil coisas. E eles me falaram a milésima primeira. Nunca imaginei. Pedi até um tempo para pensar. Foi uma decisão difícil. Recebi ofertas do Brasil e do exterior para treinar no masculino, mas por que aceitei? Primeiro porque o desafio me move. Além disso, vi uma possibilidade de fazer uma nova história. O trabalho pode mudar qualquer situação difícil. O impossível significa apenas que tenho de trabalhar mais.