Com o discurso de eternizar sua própria história, em 1996 a Federação Paranaense de Futebol (FPF) recolheu diversas doações de camisas, flâmulas e jornais feitas por torcedores e clubes do Estado.
Tratava-se do projeto de surgimento do Museu do Futebol Paranaense, uma oportunidade para o povo admirar e conhecer sobre os feitos da bola na própria terra. Hoje, no entanto, todo saudosismo foi encaixotado e está abandonado em uma sala do Estádio Pinheirão.
Se há alguns anos diversos uniformes antigos davam ao público a oportunidade de reviver momentos clássicos do futebol dos pinheirais, algumas dessas camisas dificilmente voltarão a ser de domínio público: depois de abandonadas, foram roubadas.
De acordo com o diretor de vistorias da Federação, Reginaldo Cordeiro, depois que ladrões furtaram camisas, entre outros, a sala onde ficava o museu passou por reformas. “Há vigias cuidando da área. É difícil contornar todos os pontos do estádio. Mas as aberturas feitas nos furtos foram fechadas com alvenaria”.
Sem revitalização
Um dos discursos da FPF para manter o acervo do Museu Evangelino da Costa Neves abandonado é o fato de, no Pinheirão, sala e caixas terem sido lacradas pela justiça.
No entanto, o Ministério Público do Paraná (MP-PR), entidade responsável pela interdição do local, garante que a FPF pode retirar o que quiser do estádio.
“O que não se pode é realizar atividades públicas no estádio. Mas se quiserem fazer algo com esses documentos históricos, basta realizar um pedido no auto e damos ok”, disse o promotor do MP-PR Maximiliano Ribeiro.
A FPF, porém, não prevê uma solução para que o acervo histórico saia das caixas e ganhe os olhos do povo.
Questionado sobre a possibilidade, o vice-presidente da federação, Amilton Stival, limitou-se a dizer: “Está tudo lacrado lá. Não sei te dizer quando algo será feito”.
O presidente Hélio Cury seguiu a mesma linha para falar do abandono. Disse que ao assumir a FPF o ‘problema’ já existia e retirou sua responsabilidade sobre os materiais.
“Tem que ver o problema do Pinheirão na Justiça. Não pensamos nisso ainda. Não verifico museu, não acompanho museu. Existem outras pessoas cuidando disso”, ressaltou.
Fracasso
Para o advogado Domingos Moro, presente na inauguração em nome do ex-presidente do Coritiba e homenageado de Onaireves Moura, Evangelino da Costa Neves, o espaço teve o mesmo destino dos outros projetos da FPF para o centenário.
“Existia também a ideia de se fazer um álbum, além da publicação de um livro. Nada disso saiu do papel. Houve só a Copa dos 100 anos, que acabou não conquistando prestígio, assim como o museu”, disse.
Filha de Evangelino quer material de volta
Anderson Tozato |
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Moro representou Neves em 2006. |
Evangelino da Costa Neves foi o principal homenageado do museu do futebol paranaense. Além de dar nome ao espaço, o maior presidente do Coritiba também doou uma série de documentos, troféus e demais materiais relacionados ao Coxa para a Federação Paranaense de Futebol.
Hoje, com todo o material jogado às traças, a filha do cartola alviverde quer as recordações de Evangelino ,de volta. “Me entristece muito saber que o legado de meu pai está simplesmente guardado, sem nenhum tipo de uso.
Gostaria que esse patrimônio do futebol saísse das caixas. Provavelmente para doar ao Coritiba, que apesar de ficar devendo uma melhor homenagem ao meu pai em vida, poderá utilizar melhor esse material. Espero que nada tenha sido roubado”, lamenta Evangelina Neves.
Quem também pretende recuperar o material emprestado na época é o Atlético. De acordo com o historiador Heriberto Ivan Machado, a diretoria está preparando um ofício a ser entregue na FPF.
Entre os antigos doadores localizados, o único que preferiu não se posicionar sobre o assunto foi o fotógrafo Irineu Horbatiuk. Ele doou diversas fotos da suburbana de Curitiba feitas entre os anos 1956 e 1996. “Isso aí é um problema. Mas vou esperar que seja definido todo o caso do Pinheirão. Afinal, pra mim o patrimônio passou a ser da Federação”.
Historiador critica falta de memória
“Falta interesse público na cultura esportiva do Paraná”. A frase é do professor Heriberto Ivan Machado, que dos seus 60 anos de vida, passou 42 realizando pesquisas sobre o futebol paranaense.
Junto do jornalista Levi Mulford, é autor do livro que conta a história de 100 anos desse esporte no Estado, além de serem donos de um dos mais respeitáveis arquivos futebolísticos do Brasil.
Na trajetória de quem publicou mais de 20 livros, Heriberto lamenta também o descaso do município, do poder estadual e federal. “Jamais tive patrocínio do poder público. Pra eles o futebol não é cultura. A cultura é pra nós”.
Na condição de historiador do Atlético, aguardando do clube a possibilidade de um museu próprio, o professor também diz não acreditar em um centro cultural para os clubes paranaenses. “Não vejo nenhuma luz no fim do túnel”.
Heriberto também se diz entristecido com a ausência deste espaço em Curitiba e cita o Museu do Futebol em São Paulo. “Lá tem todos os times do Rio de Janeiro e de São Paulo. Eles construíram um museu para mostrar os times e as conquistas deles. Por aqui prevalece a autofagia. Quem faz algo é menosprezado”, protesta.