“Nossos ídolos ainda são os mesmos
E as aparências não enganam, não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém…”
(Como Nossos Pais, Belchior)
O futebol prega peças, mas a vida apronta com a gente. Dois dias depois de participar normalmente do programa “Troca de Passes”, do SporTV, o coração de Carlos Alberto Torres parou de bater. Um infarto matou nesta terça-feira, aos 72 anos, o capitão do Tri, o maior dos laterais-direitos que o mundo conheceu, um desbravador e um campeão. Um personagem imortal com a bola nos pés e imortalizado com a taça Jules Rimet.
Carlos Alberto foi um prodígio. Surgiu no início da década de 1960, jogando fácil no Fluminense de Castilho, Pinheiro e Altair e depois no histórico Santos de… Bem, você sabe quem era aquele Santos. Também foi craque no Botafogo, ao lado de Gerson, Roberto Miranda e Manga. Isso tudo antes de se tornar titular absoluto da seleção brasileira.
Acompanhe a repercussão da morte de Carlos Alberto Torres
Ainda era o tempo de outro mito, Djalma Santos. Carlos Alberto era diferente – mais alto, mais rápido e com vocação para o ataque. Hoje chamam de “lateral moderno”. Ele era moderno desde 1965. Naturalmente virou o camisa 4 da seleção, a partir da preparação para a Copa do Mundo de 1970. Com Aimoré Moreira, Vicente Feola e João Saldanha, não perdeu mais o lugar e virou líder do time de “feras” que estraçalhou os adversários nas Eliminatórias, em 1969.
Naquele time cheio de personalidade, com Brito e Piazza na defesa, Gerson no meio-campo e Jairzinho, Tostão, Pelé e Rivelino na frente, era Carlos Alberto – quer dizer, o Capita – que era a voz dos treinadores e a voz que se fazia ouvir pelos boleiros. Natural a escalação dele como capitão no México, em 1970.
Com ele em campo, o Brasil tinha uma força ofensiva extra, que permitia a Jairzinho ser o verdadeiro centroavante da seleção e fazia com que Tostão se juntasse a Pelé e confundisse a marcação. Chamavam isso de “futebol moderno”. Na verdade, era futebol bonito, com os melhores em campo, talento puro do time mais espetacular de todos os tempos.
Na final contra a Itália, a apoteose. De Gerson para Clodoaldo. Corró chamou três para dançar e mandou para Rivelino, que deu um passe paralelo à linha lateral até Jairzinho. O Furacão avançou pelo meio e encontrou Pelé. O gênio do Rei apenas amansou a bola e rolou para um Carlos Alberto desembestado pela direita. A passada foi perfeita, o pulo da bola ideal, veio o chute seco, indefensável para Albertosi. Poderia ser a cena mais marcante da vida do Capitão do Tri.
Mas ainda faltava a imagem para sempre. A taça nas mãos, a festa dos companheiros, o delírio dos mexicanos no estádio Azteca. A Jules Rimet era nossa, o melhor futebol do mundo era nosso.
Carlos Alberto ainda voltou para o Fluminense na Máquina Tricolor, passou pelo Flamengo de Zico e foi fazer a América atuando longo tempo pelo Cosmos e virando o símbolo daquele time de estrelas. Voltou, foi campeão brasileiro como técnico em 1983 no Flamengo, campeão carioca em 1984 pelo Fluminense e comandou o Corinthians em 1985. Parou de treinar em 2005, e retomou a carreira de comentarista iniciada em 1986, na TV Globo. Tinha cadeira cativa no SporTV. Até domingo, quando falou sobre os jogos de Atlético e Coriitba. Nesta terça, o coração deu um drible no Capita. E de repente do riso fez-se pranto.